O pastor Ricardo Gondim, presidente da Igreja Betesda, atribuiu o conservadorismo político-social atual à obsessão dogmática religiosa.
A religião, hoje, é pautada essencialmente por um discurso moralista, cenário que tem como símbolo a Bancada Evangélica no Congresso Nacional. A conclusão é do téologo Ricardo Gondim, presidente da Igreja Betesda, e da professora da PUC-SP Maria José Rosado, diretora da ONG Católicas Direito de Decidir. Na noite de segunda-feira 17, ambos estiveram no auditório da Livraria Cultura, no Conjunto Nacional, em São Paulo, para o debate “A religião é reacionária?” da série Diálogos Capitais nas Livrarias, promovido por CartaCapital.
Gondim atribuiu o conservadorismo político-social atual à obsessão dogmática religiosa, centrada principalmente na literalidade dos textos. Para o teólogo, um agravante deste cenário é a disputa por público entre as igrejas evangélicas. Não há mais hierarquia entre as igrejas ou filiações institucionais e as relações entre elas, afirma, se dão com base em uma relação mercadológica.
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“O movimento protestante se dá, muito, em um contexto neoliberal, e assim as igrejas estão por conta, o pastor está por conta e isso impõe sobre ele uma necessidade muito grande de ser inovador, carismático, porque ele precisa sobreviver, pagar suas contas”, afirma. “Ao mesmo tempo [o pastor] precisa preservar um nicho que o mantenha dento do contexto dos evangélicos”, disse.
Para Rosado, as maiores vítimas dessa onda conservadora são as mulheres. Segundo ela, há um grande descompasso entre a Igreja Católica e as evangélicas e a sociedade civil ao discutir a questão feminina. “A sociedade avançou a ponto de retirar sexo e capacidade reprodutiva do registro de julgamento moral”, diz. “Há 20 anos, passamos a falar em direitos sexuais. Já é algo de senso comum”, afirmou.
“As religiões, no entanto, reagem a isso pois precisam do controle da sexualidade, das mulheres. E elas são seu maior público, é sobre elas que a igreja trás esse discurso forte do singular, da família.” completou.
Gondim ressaltou a maneira com que a religião se apodera, de maneira oportuna, do ideal de família para sustentar seu conservadorismo. “Observo que nós temos uma grande flexibilização ética, dogmática, mas um conservadorismo cada vez mais acirrado, pois é a única âncora que sobra em defesa da família, dos bons costumes”, diz. “Tudo é uma hipocrisia, mas é um discurso que vale no púlpito”, afirma.
Para Rosado, apesar da onda conservadora, alguns avanços ocorridos na sociedade não vão retroceder. “Há conquistas sobre as quais, de fato, não se volta a trás”, diz. “Você ter duas mulheres se beijando dentro do Congresso, duas mulheres que se assumiram casadas, e com a repercussão que tem uma Daniela Mercury no Brasil, isso pra mim é um indicador de uma permeabilidade da sociedade a essas questões”, disse. “Há condições de possibilidades, de propostas, de discursos, de legislações, que a gente não tinha há 20 ou 30 anos e que hoje são uma realidade”, diz.
[b]Fonte: Carta Capital[/b]