Fernando Lugo anunciou que abandona a batina para tentar ser presidente do Paraguai; para Vaticano, ele ainda é bispo. Favorito para as eleições de 2008, Lugo era conhecido como “bispo vermelho”; ele ameaça hegemonia de 60 anos do Partido Colorado.
A Igreja Católica pode excomungar o bispo Fernando Lugo, 55, que anunciou sua disposição para concorrer à Presidência do Paraguai.
“Ele não esperou a resposta do Vaticano, então ele está oficialmente em rebeldia, pode até ser excomungado. Ele ainda é bispo”, disse o presidente da Conferência Episcopal Paraguaia (CEP), monsenhor Ignacio Gogorza.
Lugo é o nome mais conhecido da esquerda da igreja no país. Desde março, quando liderou uma passeata de 40 mil pessoas contra o projeto de reeleição do presidente Nicanor Duarte, Lugo se tornou uma estrela da oposição. Pesquisas divulgadas apontam favoritismo do bispo para as eleições presidenciais de 2008.
Na segunda, ele anunciou que abandonava a batina para se dedicar à política -a lei paraguaia exige o desvinculação.
Lugo, 55, foi nomeado bispo da diocese de San Pedro, uma das regiões mais pobres do Paraguai, pelo papa João Paulo 2º em 1994. Em 2004, sem divulgar as razões, a igreja o aposentou do cargo -hoje seu título é o de “bispo emérito”.
Muitos no Paraguai pensam que isso ocorreu pela militância política do bispo.
Na terça-feira da semana passada, Lugo apresentou seu pedido de renúncia à vida religiosa. Na quinta-feira, o Vaticano lhe enviou uma carta, em que sugeria que ele “refletisse melhor” e abandonasse a pretensão de entrar na política.
Bispo em campanha
Alheio às críticas ou às possíveis sanções da igreja, Lugo participou ontem do lançamento do Movimiento Paraguai Possível (MPP), uma nova organização que impulsiona sua candidatura para 2008. O coordenador do MPP é Pompeyo Lugo, irmão do monsenhor e dissidente do Partido Colorado, do governo.
O MPP reúne líderes sindicais, militantes de esquerda e ativistas de direitos humanos. Para analistas políticos, o MPP servirá para conquistar força dentro da oposição.
“Lugo ainda terá muitos problemas na oposição, afinal, seus líderes não estão muito dispostos a ceder a liderança para um outsider”, disse à Folha a socióloga Milda Rivarola, analista política do jornal “Última Hora” e autora de vários livros sobre a história do país.
“Ele era chamado de bispo vermelho nos anos setenta e hoje é considerado por muitos o messias enviado do céu para salvar o Paraguai do infortúnio, uma figura muito forte no imaginário do país”, disse.
Disputa incomum
O presidente do Partido Colorado, José Alberto Alderete, atacou duramente o ex-bispo. “Lugo estava dando um golpe contra os fiéis da Igreja católica, não lhes falava com sinceridade. Distribuía hóstias enquanto fazia política.”
Na mesma linha, tanto o presidente da União Industrial Paraguaia, Gustavo Volpe, como o da Associação Rural do Paraguai, Alberto Soljancic, disseram que Lugo “já fazia política debaixo da batina” e que agora “tirou a máscara”.
“Ele estimulou invasões de terras, e isso é uma violação à Constituição. Não pode ser um bom candidato se estimula isso”, disse o industrial Volpe.
Em contraste com a modorrenta política paraguaia, onde o Partido Colorado governa hegemonicamente desde 1947, as eleições de 2008 prometem ser bem disputadas.
Além do presidente Duarte, que tenta mudar a Constituição, a fim de permitir sua reeleição, e do bispo Lugo, há dois nomes colorados em evidência. O do atual vice-presidente Luis Castiglioni e o neto do ex-ditador Alfredo Stroessner, Goli Stroessner, que lidera uma facção de oposição ao presidente.
Fonte: Folha de São Paulo