Um carro alegórico da Porto da Pedra voltou a acirrar os ânimos entre o Carnaval carioca e a Igreja. O Tigre de São Gonçalo trará a fogueira da Inquisição cercada por estátuas que representam um Papa, seis cardeais, oito bispos e quatro hereges.

A alegoria, que faz parte do enredo “Não me proíbam criar, pois preciso curiar! Sou o país do futuro e tenho muito a inventar!” — de Max Lopes —, lembrará cientistas condenados à morte pelo tribunal da Igreja no Renascimento, por contrariar as leis vistas sob a ótica católica. “Não vejo problema. É História e não estou preocupado porque o assunto está carnavalizado. Não é para ofender ninguém”, defende-se Max.

Para a Arquidiocese, o carro mereceria a fogueira. “É um assunto delicado para ser usado no contexto do Carnaval. É um abuso, uma agressão à fé. O departamento jurídico já está acostumado a lidar com isso e tomará as medidas cabíveis”, ameaça o bispo-auxiliar do Rio, Dom Edney Mattoso.

D. Edney lamenta que o uso da imagem da Igreja tenha se tornado comum para criar “polêmica”: “Já está ficando batido procurar fervescência com temas religiosos. Fico perplexo com esse comportamento reprovável”.

Religiosos condenam abordagem

Religiosos não aprovam a abordagem da Inquisição no Carnaval. “O assunto é muito complexo e fora de propósito. Não se pode resumir a Igreja naquela época à imagem dos papas e bispos. A Inquisição foi um tribunal político, qualquer interpretação simples não será bem recebida pelas pessoas”, avalia o padre Jesus Hortal, reitor da PUC.

Além do contexto histórico, o padre lembrou as vítimas do antigo tribunal. “Não é um tema digno de espetáculo. Tem que se lembrar que a memória de muitas vidas está envolvida e tratar como Carnaval é desumano”, lamenta o reitor.

O bispo Dom Roberto Guimarães, responsável pela Diocese de Campos, também condenou a alegoria idealizada por Max Lopes. “Acho totalmente inoportuno. A Igreja cometeu atos reprováveis. Não entendo por que o assunto tem que ser tratado de forma tão leviana”, condenou.

A utilização de imagens que representam bispos, cardeais e até mesmo o Papa também foi alvo de críticas. “Como bispo, me sinto ultrajado, agredido e ridicularizado. Não é uma forma honesta de se tratar a História”, concluiu Dom Roberto.

Católicos: chance de ação judicial

A caracterização na alegoria da Porto da Pedra também não foi bem recebida pela Diocese de Niterói. O caso já está sendo estudado pelo Departamento Jurídico da Mitra e o monsenhor Valdir Mesquita, vigário-geral da cidade, só se pronunciará após parecer de seus advogados.

No Rio, o Departamento Jurídico da Arquidiocese estuda o que fazer. “Normalmente o diálogo é suficiente. Ainda é preciso analisar o caso com cuidado para aí começar a tomar as medidas, mas qualquer católico que se sinta agredido pode entrar com ação contra a escola”, afirma Clodine Dutra, advogada responsável.

No Carnaval do ano passado, a Viradouro precisou modificar, poucos dias antes do desfile, o carro que mostraria o Holocausto nazista. O carnavalesco Paulo Barros havia idealizado a alegoria com um destaque vestido de Hitler sobre esculturas de corpos de judeus mortos. Proibida pela Justiça, a alegoria foi alterada para o desfile.

Fonte: O Dia

Comentários