O papa Bento XVI quer entrar no centro das discussões sobre a ciência e a fé e reafirmar a confiabilidade do Evangelho, como indicam os primeiros trechos do livro que o pontífice lançará em abril sobre a vida de Jesus Cristo.

“Com o progresso da pesquisa histórica, a figura de Jesus, sobre a qual se baseia a fé, foi se tornando cada vez mais incerta, se distanciando de nós. Tudo isso deixou a impressão que sabemos pouco de certo sobre Jesus”, escreve Bento XVI em seu prefácio de Jesus de Nazaré, do batismo no Jordão à Transfiguração, divulgado pelo Vaticano. “Isto é dramático para a fé, porque torna incerto seu autêntico ponto de referência.” “Eu acredito que justamente este Jesus, aquele do Evangelho, seja uma figura historicamente sensata e convincente”, diz o prefácio.

“Cristo da fé”

livro, segundo analistas, deve abrir uma nova frente de debates envolvendo história, religião e fé em torno da figura de Jesus. “O livro do papa quer demonstrar que Jesus histórico não está em contraposição ao Jesus da fé”, disse em entrevista à BBC Brasil o professor de história do cristianismo da Universidade de Roma Gian Maria Vian.

Ele diz que pesquisas de nomes respeitados como o teólogo Rudolf Bultmann, um dos mais influentes do século XX, ajudaram a aumentar a distância que separa o “Cristo da fé” do “Jesus da história”. Essa distância tem sido tema de várias polêmicas no mundo cristão e na mídia graças principalmente ao sucesso de publicações recentes como os livros Código da Vinci e Inquérito sobre Jesus, que questionaram ou reinterpretaram vários apectos da vida de Cristo – pelo menos a vida como tem sido apresentada pela igreja.

Segundo o vaticanista Sandro Magister, esses livros destacam ora o aspecto judeu de Jesus, ora o lado político, e até o seu perfil de mago e milagreiro. Magister diz que eles retratam Jesus Cristo “reduzido a simples homem do seu tempo, contradizendo a verdade central do cristianismo”. Para Magister, os dois livros são os mais representativos de um “ataque ao Jesus da fé”, que estaria em curso.

Revisão do revisionismo

Jesus de Nazaré, do batismo no Jordão à Transfiguração, que chega às livrarias em abril, é o primeiro livro de Joseph Ratzinger depois que foi eleito papa. Nele, segundo Magister, o papa deve destacar que “as pesquisas enriqueceram o conhecimento de Cristo. Graças a estes estudos a tese de Bultman deve ser revista, porque a distância entre o Cristo da religião e o da história não é tão grande”.

Segundo o professor Gian Maria Vian, Bento 16 reforçará, no livro, que os Evangelhos são, além de fonte de fé, fonte confiável de pesquisa histórica. “A igreja teme que a fé em Cristo seja considerada desligada da história e da razão, uma preocupação típica de Bento 16, que deseja afirmar mais uma vez que razao e fé devem caminhar juntas”, diz ele. No prefácio, Joseph Ratzinger diz que ao escrever o livro não renunciou à seriedade histórica, mas aplicou “critérios metodológicos que requerem a fé”.

Para Sandro Magister, não há contradição nesta afirmativa, “porque uma razão que se fecha em si mesma e não se abre à transcendência, se autolimita”. Na opinião do vaticanista, o grande sucesso de livros que apresentam aspectos pouco conhecidos da vida de Jesus demonstra que existe grande interesse em torno da figura do messias.

“O livro do papa é uma resposta a este interesse, e um desafio à razão, porque ele quer demonstrar que o Cristo dos evangelhos tem credibilidade histórica”, diz o especialista.

Fonte: Em Sergipe.com

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