Para o cineasta e diretor de óperas Franco Zeffirelli, que não tem cargo oficial no Vaticano mas serve como assessor áulico, uma espécie de conselheiro do pontífice em sua relação com o mundo da imagem, os trajes papais são pomposos e suntuosos demais.

“A imagem do Papa não é afortunada. Ser o sucessor de um pontífice de ótima atuação na mídia, como João Paulo 2°, é uma tarefa difícil, mas desde o jubileu de seu antecessor parecia claro que o cardeal Ratzinger seria eleito. No entanto, como Bento 16, ele tem uma comunicação fria, pouco adaptada ao que acontece em torno dele. Trata-se de um problema que já discuti com líderes que desempenham funções importantes no Vaticano. Até mesmo o seu guarda-roupa é antiquado: a elegância exagerada das vestes eclesiásticas é coisa do passado. Ele precisa adotar o ascetismo e a sobriedade que outros níveis da Igreja têm exibido. Os trajes papais são pomposos e suntuosos demais”, disse o cineasta e diretor de óperas Franco Zeffirelli.

Em entrevista ao diário La Stampa, Zeffirelli afirma que “o Santo Padre me honra com sua estima e sabe que hoje a comunicação cinematográfica da Igreja é uma ruína. Ratzinger restaurou a ordem da doutrina e da liturgia; não tolerará a anarquia deplorável na representação do sagrado”.

Imagem, uma palavra polissêmica, também pode se aplicar à projeção pública do Papa, e sobre isso Zeffirelli afirma, quanto a Bento 16, que ¿ele é um Papa que não sorri muito, mas é um intelectual. Tem uma rígida estrutura bávara¿. Perguntado sobre sua participação na montagem do presépio que o Vaticano montou na Praça de São Pedro, segundo o qual Jesus nasceu não em Belém, mas na casa de seu pai, José, em Nazaré, Zeffirelli respondeu que “não sou assim tão importante, mas é certo que este ano a idéia é destacar os fundamentos do Natal, removendo a fantasia e a lenda. Não temos cenários, mas pura substância teológica. Com Ratzinger, as coisas funcionam assim. Tenho contato contínuo com os mais estreitos colaboradores do Papa, como o cardeal Camillo Ruini ou o bispo auxiliar de Roma, Rino Fisichella, meus grandes e fiéis amigos. Tratamos dessa questão freqüentemente. Mas não estamos em fase de planejamento das intervenções necessárias, e sim debatendo propostas. De certo, no momento, temos a criação de uma diretoria vaticana para a defesa da fé e da imagem do sagrado no cinema. A Santa Sé pretende se ocupar disso com muito mais atenção”.

“Estou à disposição do Papa. Devo receber total autoridade (que o Papa não me negaria) para fulminar as constantes blasfêmias que são proferidas com a intenção de popularizar a mensagem cristã”, diz Zeffirelli.

“Ouço repetidamente no Vaticano que os filmes atuais sobre santos são um horror que a Santa Sé não sabe como deter. Caso eu receba oficialmente a tarefa de fiscalizá-los, me dedicarei a ela em tempo integral. Conheço Ratzinger pessoalmente; ele é muito consciente da importância da questão de formação do sagrado”.

Zeffirelli, católico fervoroso e defensor da missa em latim, ainda que não figure do Anuário Vaticano – o guia que menciona todas as autoridades com responsabilidade na Santa Sé – , ajudou o Vaticano dirigindo diversas transmissões televisivas.

Os filmes de temática religiosa que realizou no passado o ajudaram a estabelecer seu relacionamento com diversos Papas, como por exemplo Paulo 6°, que depois de assistir seu Jesus de Nazaré perguntou ao cineasta como a Igreja poderia ajudá-lo. A resposta de Zeffirelli foi afirmar que gostaria que seu trabalho chegasse à Rússia, ao que o pontífice aconselhou que ele tivesse fé.

Em 2000, ele recebeu uma benção de João Paulo 2° no interior da basílica de São Pedro, e o Papa o felicitou pessoalmente por “Jesus de Nazaré” e “Irmão Sol, Irmã Lua”.

Sobre a cultura cinematográfica de Bento 16, ele afirma que “o pontífice conhece a importância da imagem, pelo menos tanto quanto o cardeal Montini (Paulo 6°)”.

Neutralidade para santificar

O Papa Bento 16 recebeu na segunda-feira os postulantes em processos de beatificação e canonização em curso no Vaticano, e os instruiu a recolher “as provas favoráveis mas também as provas em contrário”, solicitando que se coloquem “exclusivamente a serviço da verdade”. Bento 16 acrescentou que esse trabalho deve ser “irrepreensível, inspirado pela retidão e encaminhado com honradez absoluta”.

Cinema e ópera

Gianfranco Corsi (nascido em Florença em 1923 e conhecido no mundo da arte pelo pseudônimo Franco Zeffirelli), graças ao seu trabalho como diretor de cinema e de ópera, se tornou um italiano conhecido mundialmente. Sua mais nova produção, uma versão da Tosca, de Giacomo Puccini estreará em 14 de janeiro em Roma. Trata-se do primeiro italiano a ser sagrado cavaleiro do império britânico pela rainha Elizabeth 2ª.

Por mais que isso pareça contraditório, Zeffirelli é um homossexual homófobo. Concorda com a igreja católica em sua oposição radical ao casamento gay e, com isso, também rejeita a possibilidade de adoção por casais homossexuais. Solteiro, adotou muitos anos atrás dois meninos que hoje já passaram dos 40 anos. Afirma em sua autobiografia que “sou homossexual mas não gay, palavra que odeio e considero como ofensiva e obscena”.

Sobre seu relacionamento com o cineasta Luchino Visconti, afirma que foi “um amor atormentado, dilacerado, mas nunca extinto”. Também fala de seu amor por Maria Callas, a única mulher que desejou. Zeffirelli também conta que sua mãe, casada, engravidou de outro homem. Em meio ao escândalo, o marido dela morreu. Quando o menino nasceu, ela o registrou com um sobrenome tomado de empréstimo a “Idomeneo”, uma ópera de Mozart, mas o funcionário do cartório grafou o sobrenome como “Zeffirelli” e não Zeffiretti. Mais tarde, o garoto seria reconhecido por seu pai biológico – Ottorino Corsi – , mas preferiu fazer carreira com o nome de batismo.

Fonte: La Vanguardia

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