Mesmo entendendo que os homossexuais não devem sofrer discriminação, bispos não reconhecem união entre pessoas do mesmo sexo como equivale à família.
A Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) questiona a competência do Supremo Tribunal Federal (STF) para decidir quanto à união entre pessoas do mesmo sexo, por entender que a atribuição de propor e votar leis é do Congresso Nacional, cabendo ao governo o dever de garanti-las.
“Nos preocupa ver os poderes constituídos ultrapassarem limites de sua competência, como ocorreu com a recente decisão do Supremo Tribunal Federal”, afirma uma nota aprovada ontem pela 49.ª Assembleia-Geral do episcopado, reunida em Aparecida. “Não é a primeira vez que acontecem no Brasil conflitos dessa natureza, que comprometem a ética na política”, acrescenta o texto.
Depois da ressalva de que “as pessoas que sentem atração sexual exclusiva ou predominante pelo mesmo sexo são merecedoras de respeito e consideração”, os bispos advertem que as uniões estáveis entre homossexuais “não podem ser equiparadas à família, que se fundamenta no consentimento matrimonial, na complementaridade e na reciprocidade entre um homem e uma mulher, abertos à procriação e educação dos filhos”.
Um dos redatores da nota, d. Antônio Augusto Dias Duarte, bispo auxiliar do Rio de Janeiro e médico, explicou em entrevista coletiva que, ao se pronunciarem sobre a decisão do Supremo, os bispos cumprem o dever dos pastores de orientar os féis, segundo a doutrina da Igreja.
“Da mesma maneira que respeitamos aqueles que defendem a união homoafetiva, repudiando todo tipo de discriminação e violência contra eles, esperamos que respeitem a nossa posição”, disse o bispo.
De acordo com ele, a Igreja Católica não faria o casamento religioso para selar a união de homossexuais se eles pretendessem isso, mesmo que recorressem à Justiça para garantir um suposto direito.
O arcebispo do Rio, d. Orani João Tempesta, interveio para lembrar que a Igreja não faz também o casamento de pessoas já casadas e divorciadas que pretendam sacramentar uma segunda união.
Os dois representantes da CNBB acreditam que homens e mulheres que optaram pela união estável com parceiros do mesmo sexo não devem insistir em reivindicar o sacramento do matrimônio.
[b]Decisão do STF
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De acordo com o STF, os casais homossexuais têm os mesmos direitos e deveres que a legislação brasileira estabelece para os casais heterossexuais. A decisão, que foi aprovada unanimemente na última quinta-feira, 5, abre caminho para que o casamento civil entre pessoas do mesmo sexo seja permitido e as uniões homoafetivas passem a ser tratadas como um novo tipo de família.
O julgamento do STF torna praticamente automáticos os direitos que hoje são obtidos com dificuldades na Justiça e põe fim à discriminação legal dos homossexuais. Considerada histórica, a decisão do STF é contestada tanto pela Igreja Católica quanto por juristas.
[b]Leia nota da CNBB na íntegra:
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Nós, Bispos do Brasil em Assembleia Geral, nos dias 4 a 13 de maio, reunidos na casa da nossa Mãe, Nossa Senhora Aparecida, dirigimo-nos a todos os fiéis e pessoas de boa vontade para reafirmar o princípio da instituição familiar e esclarecer a respeito da união estável entre pessoas do mesmo sexo. Saudamos todas as famílias do nosso País e as encorajamos a viver fiel e alegremente a sua missão. Tão grande é a importância da família, que toda a sociedade tem nela a sua base vital. Por isso é possível fazer do mundo uma grande família.
A diferença sexual é originária e não mero produto de uma opção cultural. O matrimônio natural entre o homem e a mulher bem como a família monogâmica constituem um princípio fundamental do Direito Natural. As Sagradas Escrituras, por sua vez, revelam que Deus criou o homem e a mulher à sua imagem e semelhança e os destinou a ser uma só carne (cf. Gn 1,27; 2,24). Assim, a família é o âmbito adequado para a plena realização humana, o desenvolvimento das diversas gerações e constitui o maior bem das pessoas.
As pessoas que sentem atração sexual exclusiva ou predominante pelo mesmo sexo são merecedoras de respeito e consideração. Repudiamos todo tipo de discriminação e violência que fere sua dignidade de pessoa humana (cf. Catecismo da Igreja Católica, nn. 2357-2358).
As uniões estáveis entre pessoas do mesmo sexo recebem agora em nosso País reconhecimento do Estado. Tais uniões não podem ser equiparadas à família, que se fundamenta no consentimento matrimonial, na complementaridade e na reciprocidade entre um homem e uma mulher, abertos à procriação e educação dos filhos. Equiparar as uniões entre pessoas do mesmo sexo à família descaracteriza a sua identidade e ameaça a estabilidade da mesma. É um fato real que a família é um recurso humano e social incomparável, além de ser também uma grande benfeitora da humanidade. Ela favorece a integração de todas as gerações, dá amparo aos doentes e idosos, socorre os desempregados e pessoas portadoras de deficiência. Portanto têm o direito de ser valorizada e protegida pelo Estado.
É atribuição do Congresso Nacional propor e votar leis, cabendo ao governo garanti-las. Preocupa-nos ver os poderes constituídos ultrapassarem os limites de sua competência, como aconteceu com a recente decisão do Supremo Tribunal Federal. Não é a primeira vez que no Brasil acontecem conflitos dessa natureza que comprometem a ética na política.
A instituição familiar corresponde ao desígnio de Deus e é tão fundamental para a pessoa que o Senhor elevou o Matrimônio à dignidade de Sacramento. Assim, motivados pelo Documento de Aparecida, propomo-nos a renovar o nosso empenho por uma Pastoral Familiar intensa e vigorosa.
Jesus Cristo Ressuscitado, fonte de Vida e Senhor da história, que nasceu, cresceu e viveu na Sagrada Família de Nazaré, pela intercessão da Virgem Maria e de São José, seu esposo, ilumine o povo brasileiro e seus governantes no compromisso pela promoção e defesa da família.
Aparecida (SP), 11 de maio de 2011
Dom Geraldo Lyrio Rocha
Presidente da CNBB
Arcebispo de Mariana – MG
Dom Luiz Soares Vieira
Vice Presidente da CNBB
Arcebispo de Manaus – AM
Dom Dimas Lara Barbosa
Secretário Geral da CNBB
Arcebispo nomeado para Campo Grande – MS
[b]Fonte: Estadão[/b]