Retrato de um massacre

O mundo ficou chocado essa semana com mais um massacre em uma instituição de ensino norte-americana. Após o fatídico episódio da escola Columbine em 1999, ninguém esperaria que algo ainda pior pudesse acontecer, e dessa vez em uma universidade de grande porte. Virgina Tech, universidade vinculada ao governo do estado da Virginia, goza de grande reconhecimento e respeito no país inteiro e boa parte de seus alunos advém dos outros 49 estados americanos e de dezenas de países de todos os continentes.

A cidade de Blacksburg, onde fica situado o campus da Virginia Tech, fica a somente uma hora e meia de carro da cidade onde moro; talvez por isso a tragédia tenha me abalado tanto. Tivemos diversos cultos e momentos de oração em memória das vítimas e dos familiares e toda as universidades da Virginia se sentiram atingidas de alguma forma.

A cidade de Blacksburg sempre foi referência em termos de segurança e tranqüilidade, como inclusive é a maioria das cidades de pequeno e médio porte nos Estados Unidos. Por isso mesmo fica difícil imaginar como algo tão terrível pudesse acontecer em uma cidadezinha adorável como Blacksburg. De forma geral as universidades americanas prezam muito pela segurança e chegam até mesmo a exageros, ocasionalmente.

Me lembro de um certo dia em que recebemos um telefonema da policia do campus pedindo a todos para permanecerem dentro dos prédios e trancarem as portas por conta de uma denúncia sobre um suposto homem armado circulando pelo campus. Ficamos um pouco assustados, mas depois soubemos que o tal suspeito, não passava de um estudante carregando um daqueles guarda-chuvas que fica pendurado nas costas, como uma mochila, ou um rifle. Isso só pra mostrar o grau de preocupação que toda equipe de segurança tem em relação a qualquer evento que desperte suspeita.

Mas, independente de todas as medidas possíveis que se possa tomar para garantir a segurança de alunos e transeuntes, o grande mistério mesmo continua sendo o que se passa na cabeça desses maníacos que saem pelo mundo afora matando pessoas inocentes à rodo. Psicólogos e cientistas se esforçam para elaborar teorias e teses, mas de fato ninguém consegue entender na inteireza a mente de um psicopata.

Só mesmo através de uma leitura baseada na dimensão espiritual é que podemos ter algumas respostas mais satisfatórias. E isso a ciência jamais vai aceitar. O cinema também tem tentado ao longo dos anos, investigar e teorizar sobre as motivações e meandros psicológicos de criminosos através de diversos filmes, alguns baseados em eventos reais e outros puramente fictícios. Apos o massacre da Virginia tech, logo me lembrei de um filme que talvez lhe ajude a tentar entender um pouco mais sobre massacres como o que ocorreu semana passada nos EUA.

“Elefante”, foi produzido em 2003 pelo diretor Gus van Sant, o mesmo de “Gênio Indomável”, baseado nos eventos de Columbine. Contudo, o diretor tentou se afastar de uma mera reconstituição dos fatos e optou por uma recriação livre, em forma de ficção, ou se preferir “semi-ficção”. Dessa forma o filme se dá o direito de elaborar mais sobre as motivações dos assassinos e as circunstâncias que levaram ao massacre. Usando atores em sua maioria desconhecidos, o filme tem um tom quase documental e com cara de “reality show”, o que lhe confere boa credibilidade, inclusive foi o vencedor da palma de ouro do festival de Cannes de 2003.

Algo que salta aos olhos é a facilidade com que se pode comprar armas nos Estados Unidos; os garotos do filme recebem fuzis automáticos pelo correio, entregues por caminhões da UPS! E isso não está muito longe da realidade. Outro fator que o filme levanta como sendo motivador do crime, a superficialidade dos padrões de beleza e de popularidade entre os adolescentes americanos. As escolas americanas, na verdade refletem a própria hipocrisia da sociedade como um todo, onde impera o materialismo e a ganância, onde a competição e o capitalismo selvagem determinam quem serão os vencedores e os derrotados de uma sociedade cada vez mais estratificada.

Ser diferente, muitas vezes significa ser rejeitado e estereotipado para sempre. Os jovens retratados no filme, não aparentam muita diferença dos adolescentes que vemos em todas as escolas no Brasil; sabe aqueles que gostam de usar roupa rasgada, se vestir de preto, colocar piercing e coisas do gênero? Pois é; nada diferente disso. Mas, parece que alguns aqui nos EUA gostam de sair por aí atirando nos outros…

Um filme como “Elefante” é bastante apropriado para um momento como esse, especialmente para que possamos refletir sobre o que podemos fazer para que nunca nada parecido venha a acontecer no Brasil.

Um abraço,

Leon Neto

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