Quase todos os 500 metros da rua são ocupados por comércio relacionado à religião. Há uma só igreja, mas quatro galerias, entre elas o Shopping Lojas Evangélicas. Só a chamada Conde de Sarzedas tem 44 lojas de produtos religiosos.
Camisetas, broches, adesivos, CDs e DVDs, brincos, peças para cama, mesa e banho, livros, chaveiros, enfeites de casa, calças, bonés, bolsas, cintos, pastas, ursos de pelúcia, equipamentos de som. Vendas no varejo e no atacado, tudo em uma mesma rua do centro da capital. 25 de Março? Não exatamente. No papel, é Conde de Sarzedas. Mas pode chamar de 25 dos evangélicos, já que as roupas têm mensagens religiosas, a música é gospel, os vídeos registram cultos, os filmes mostram histórias bíblicas.
Além dos produtos comuns, vitrines exibem itens especializados, como púlpitos, óleo de unção, becas, ternos, gravatas e salvas – sacos de pano usados para coletar doações nas igrejas. Na Livraria Evangélica Gentil, há versão bilíngüe da Bíblia (inglês/português).
Quase todos os 500 metros da rua são ocupados por comércio relacionado à religião. Há uma só igreja, mas quatro galerias, entre elas o Shopping Lojas Evangélicas. Só a chamada Conde de Sarzedas tem 44 lojas de produtos religiosos. “Quando começamos, a rua já era referência. Mas não existe obrigatoriedade de ser evangélico (para vender no local)”, diz a gerente do imóvel, Maria das Graças. “Aqui passa o Brasil e o mundo. Quando tem congresso cristão, vem todo mundo à Conde”, diz Brother Simion, dono de loja na galeria que leva o nome da rua. Roqueiro, vende modelitos que em nada destoariam da moda indie de quem circula na boêmia Rua Augusta. Todos, porém, têm inscrição religiosa, para diferenciar.
Convertida, a cantora Mara Maravilha também abriu comércio no local. Vende, sobretudo, roupas infantis. A pastora Fabiana Nardini, de 33 anos, comercializa óleos de unção com essências em vidros decorados. “É a única rua do Brasil só de artigos religiosos”, resume.
A dentista Cristina Ferramenta, de 47 anos, diz visitar a rua uma vez por mês há cerca de três anos. “Venho comprar CD, pasta para o grupo de irmãs, coisas para a igreja”, diz ela. “Aqui é como a Rua da Consolação para as luminárias”, define o estudante de Direito Reginaldo Celestino, de 39 anos.
Assim como na 25 original, as datas comemorativas são um impulso às compras. “Em Dia das Mães vende muita Bíblia. No final do ano, triplica. É um consumo tremendo”, diz Cristina Bergaro, gerente de uma das duas lojas da Gentil, que comercializa, segundo ela, cerca de 2 mil Bíblias por mês.
Lá também é possível encontrar comércio irregular. “Só vendo produto evangélico”, diz um camelô que oferece DVDs.
Quem não é da religião se adapta. Glória Almeida abriu um restaurante ali há cerca de nove anos. Batizou-o de Irmã Glória. “Não sou evangélica. Eles que deram o nome. Todo mundo aqui se chama de irmão, irmã. Aí começaram com irmã, irmã, irmã, e ficou.”
Comércio religioso surgiu na rua na década de 50
Quem conta da melhor maneira a história da Conde de Sarzedas é Araci Miranda, de 77 anos, há 54 vendendo discos e outros artigos religiosos na rua. Ela afirma que sua loja, a gravadora Deus é Amor, foi a primeira evangélica a abrir no local. “A igreja foi construída na mesma época, por coincidência. Aí o povo começou a se aglomerar na igreja e começaram (a abrir mais lojas religiosas). Isso foi dois ou três anos depois”, diz Araci. De lá para cá, a rua se tornou referência gospel da cidade. Uma transformação que não agradou à pioneira. “Para mim não foi bom, porque a concorrência aumentou muito e são desleais. Muitos não são evangélicos, mas têm loja aqui só para vender.”
De início, a gravadora de Araci estava instalada em uma casa no começo da rua. A Conde foi um acaso. “Conseguimos uma casa velha para alugar.” Mais tarde, mudou-se para o final dela, em um imóvel próprio, onde está até hoje. “Ficou sendo uma das últimas e, quando o povo chega aqui, já não tem mais dinheiro, não tem mais cheque, não tem mais cartão”, reclama. “Tá difícil de se manter. Tem perigo até de fecharmos.”
A Conde de Sarzedas existe com esse nome pelo menos desde 1894. Segundo o Dicionário de Ruas da Prefeitura, foi chamada assim em homenagem a Bernardo José de Lorena, conde de Sarzedas, fidalgo português e capitão-general de São Paulo entre 1788 e 1797.
Fonte: Estadão