A fé e a Bíblia vão entrar em campo junto com a seleção brasileira na Copa do Mundo. Além de exibir talento e garra, o craque Kaká, o capitão Lúcio e o artilheiro Luís Fabiano formam o trio que guia o incensado espírito de corpo dos pentacampeões rumo ao hexa na África do Sul. Evangélicos, os três titulares se unem ao auxiliar-técnico Jorginho para liderar as orações em meio à rotina de treinos.
Se a devoção a Dunga é a chance de alcançar o Paraíso na Terra, o louvor a Deus, que se estende por gramados de todo o Brasil, garante a vida eterna.
Extremamente fechada por ordem do técnico, a concentração da Seleção no Hotel Fairway, em Joanesburgo, ganha ares de retiro espiritual. O núcleo evangélico da Seleção promove cultos e faz a leitura de passagens bíblicas. Jorginho e Lúcio são fervorosos. O zagueiro aconselha os companheiros menos experientes.
“Sei que Deus ama a todos da mesma maneira. A convivência é muito boa, com respeito e amor. Até hoje tem funcionado muito bem”, afi rma o jogador. Gilberto Silva, Daniel Alves e Luisão às vezes se juntam ao rebanho e participam de alguns encontros. Kaká é um dos pregadores mais atuantes. Tem o hábito de fazer manifestações explícitas — como a camisa com a inscrição “I belong to Jesus (Eu pertenço a Jesus)”, usada por baixo do uniforme e exibida após as conquistas —, que acabaram proibidas pela Fifa. O pecado havia sido o excesso de mensagens religiosas depois do título da Copa das Confederações, ano passado.
Mas o apoiador descobriu uma forma discreta de driblar a entidade todo-poderosa do futebol: gravou nas chuteiras, em inglês, os dizeres “Jesus em primeiro lugar”. Na África, a seleção evangélica tem um reforço que não sai do banco de reservas, mas do altar dos templos: o pastor Anselmo Alves, 51 anos, da Primeira Igreja Batista de Curitiba.
A convite de Lúcio, ele fez escala em Madri, onde deu sua bênção e viu a Inter de Milão conquistar a Liga dos Campeões da Europa. O religioso, que nos anos 80 foi lateral-direito do Atlético-PR, não teve sucesso no futebol e trocou a bola pela Bíblia.
Em Joanesburgo, suas despesas são pagas por alguns dos jogadores e amigos de fé. Anselmo será um conselheiro dos evangélicos durante os dias de reclusão. A corrente católica da Seleção nem de longe tem o mesmo peso dos evangélicos. Jogadores como Julio César assumem o catolicismo mais por convenção do que por devoção. A união entre os credos acontece na oração antes dos jogos, quando de mãos dadas todos rezam o Pai-Nosso. Em busca da glória, todos querem ser campeões e, no fim, dizer: amém.
Religião ajuda Kaká na luta contra lesão
A batalha que Kaká trava com o corpo, para superar lesão na coxa, é disputada também na cabeça. Seu livro de cabeceira é um manual de autoajuda baseado em passagens bíblicas: ‘Campo de Batalha da Mente’, best-seller de Joyce Meyer que já vendeu mais de dois milhões de exemplares e exalta Deus na guerra contra o Diabo.
Kaká vem usando o Twitter, rede de microblogs na Internet, para enviar mensagens e ensinamentos retirados do livro para seus mais de 600 mil amigos, fãs e fi éis. “É muito bom”, elogiou o craque, referindo-se à publicação. A autora é uma das líderes do ensino prático da Bíblia e já escreveu mais de 80 livros, com 12 milhões de cópias vendidas.
O astro da Seleção é muito amigo do apóstolo Estevam Hernandes, fundador da Igreja Apostólica Renascer em Cristo, preso nos Estados Unidos em 2007 ao tentar entrar no país com milhares de dólares não declarados. Ano passado, o apoiador foi ungido presbítero em culto na Flórida, na companhia da mulher, Caroline, que já é pastora e sonha em abrir uma igreja em Madri.
Em meio a tantas demonstrações de fé, a declaração de Andres Sanchez, presidente do Corinthians e chefe da delegação brasileira na África, soa como blasfêmia: “Não só os baladeiros exageram, mas também os da igreja. O cara quer rezar de manhã, de tarde, de noite. É difícil”
Fonte: O DIA