Os primeiros povoados cristãos dos arredores de Mossul foram libertados, mas isso não quer dizer que os que fugiram da facção terrorista Estado Islâmico estejam dispostos a voltar.
A grande destruição e o medo do futuro ainda estão muito presentes.
“Eu vim para trazer uma mensagem de esperança: sim, existe um futuro para os cristãos do Iraque e somos nós que temos que construí-lo juntos”, afirma o patriarca Louis Raphaël Sako, na saída de uma celebração pela unidade do Iraque.
O patriarca da Igreja Católica Caldeia compartilha sua esperança com centenas de fiéis reunidos na terça-feira (25) na Igreja da Mão da Misericórdia de Erbil, no Curdistão iraquiano, onde se refugiaram milhares de cristãos.
Eles seguem atentamente pela televisão a evolução dos combates desde que, em 17 de outubro, começou a ofensiva para retomar Mossul e sua região das mãos do Estado Islâmico.
Em várias ocasiões, os cristãos saíram às ruas para celebrar a libertação, como no caso da cidade de Bartella, e expressar sua alegria por voltar mais cedo para casa após mais de dois anos de espera.
A próxima festa poderia ser pela libertação de Qaraqosh, que era a maior cidade cristã do país em 2014, com quase 50 mil habitantes.
“Aconteça o que acontecer, quero voltar a viver em minha casa em Qaraqosh, ainda que só reste o cimento”, insiste, impaciente, Shamo Boles Bahi, 70.
Em um terreno dos arredores de Erbil que pertence à igreja caldeia, o engenheiro Munthir Rufain Yusef supervisiona a construção de 400 novas casas para os deslocados cristãos.
“Ainda que se recupere o controle das aldeias, vai demorar seis meses, talvez um ano, antes que possamos regressar”, diz. “As casas estão danificadas, não há água corrente, eletricidade, há minas por todo lado.”
Munthir é um deslocado de Bartella: “Olhe, recebi hoje uma fotografia da minha casa. A fachada não parece muito destruída, mas me preocupa a parte de trás. A casa dos meus vizinhos foi derrubada pelos combates”.
[b]’COMPASSO DE ESPERA’
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“O futuro dos cristãos do Iraque continua incerto. Se não nos sentirmos seguros, não voltaremos para casa. Também vai depender do que façam os outros habitantes do meu povoado. Se voltarem, voltarei. Mas não voltarei sozinho”, adverte Munthir.
Além da reconstrução, o que preocupa são exatamente as condições de segurança.
Yvette Hannah, 19, lembra as circunstâncias em que fugiu de sua aldeia, na periferia de Mossul: “Ser acordada à noite, ter que abandonar tudo e fugir rezando para sair sã e salva… Quero voltar, mas quem garante que estarei segura, que não se repetirá?”.
O retorno é vital para o futuro dos cristãos no Iraque, uma comunidade enraizada há 2.000 anos no país, mas que atualmente tem apenas 350 mil pessoas.
“Desde o verão de 2014, a sociedade cristã está em ‘compasso de espera’. Os casamentos e as gravidezes são adiadas na espera da volta dos deslocados a seus povoados”, afirma Jean, voluntário francês que colabora com a igreja iraquiana.
Alguns temem que a grande ajuda dos cristãos por parte da comunidade internacional tenha criado uma “cultura da dependência”, da qual será difícil sair.
O peso econômico dessa comunidade desapareceu com o êxodo da elite.
“Rezamos pela unidade e pela reconciliação, porque sem elas nosso país vai sumir em meio à guerra civil e nós, os cristãos, sairemos maltratados”, adverte o seminarista Wael Ablahad.
[b]Fonte: Folha de São Paulo[/b]