Em encontro com o secretário-geral do Conselho Mundial de Igrejas (CMI), Samuel Kobia, o primeiro ministro da Índia, Manmohan Singh, disse que “o cristianismo é parte de nosso patrimônio nacional”. O encontro ocorreu no sábado, 18, em Nova Delhi.

Em entrevista coletiva após o encontro, Kobia expressou alegria pela declaração do primeiro ministro indiano.

O comentário de Singh refuta o que dizem grupos nacionalistas indianos, que descrevem o cristianismo como uma “religião estrangeira” para justificar a campanha contra a comunidade cristã na Índia. Os cristãos representam 2,32% da população indiana.

O cristianismo é mais antigo na Índia do que em qualquer outro país do Ocidente. Segundo a tradição, o apóstolo Tomás chegou a Kerala, na costa indiana, acompanhado por comerciantes de especiarias do Oriente Médio, no ano 52, plantando as sementes de uma vibrante comunidade cristã “na terra dos coqueiros”.

No encontro de 30 minutos com o secretário-geral do CMI, Singh disse que a Aliança Progressiva Unida, coligação governamental que dirige, comprometeu-se a “restaurar a normalidade” e a diminuir os ataques aos cristãos no estado oriental de Orissa e em outras localidades do país.

Em resposta à “profunda preocupação” manifestada por Kobia em decorrência das atrocidades cometidas contra os cristãos, Singh assinalou que a Constituição indiana “garante a liberdade de praticar e propagar a religião” de todos os cidadãos, assegurando ao secretário do CMI que seu governo tomará medidas para recobrar a confiança da comunidade cristã.

Singh prometeu que o governo federal destinará ajuda financeira para a reconstrução das igrejas destruídas e danificadas, e apoiará as famílias cristãs que perderam suas moradias e outros bens em decorrência dos atos de violência.

A violência contra os cristãos estourou no dia 23 de agosto, quando o líder indiano Swami Lakshmanananda foi assassinado na localidade de Orissa. Embora rebeldes maoístas tenham reivindicado a autoria do atentado, grupos indianos disseram tratar-se de complô da comunidade cristã, tendo em vista que o líder assassinado, residente em Kandhamal, tinha feito uma enérgica campanha contra a conversão ao cristianismo.

Pelo menos 54 cristãos foram assassinados no país. Mais de cinco mil casas de cristãos, 142 igrejas e dezenas de instituições cristãs foram saqueadas e incendiadas por fundamentalistas indianos em Kandhamal, onde os cristãos representam 20% de um total de 500 mil habitantes.

Por causa da ação de grupos extremistas indianos que obrigam os cristãos a se converter ao hinduísmo pela força, mais de dois terços dos 100 mil cristãos de Kandmahal se refugiaram na selva ou em acampamentos de socorro administrados pelo governo, ou fugiram para as cidades e regiões urbanas.

Na coletiva de imprensa, Kobia disse que tinha transmitido “ao primeiro ministro a preocupação da comunidade cristã internacional pela situação em Orissa e em outras regiões”.

“Desejamos que o governo assegure a paz a fim de oferecer a confiança necessária para que os cristãos possam regressar às suas aldeias e viver sem temor”, agregou Kobia.

O líder ecumênico indicou que o governo de Singh “tem o dever de proteger as minorias religiosas” e agradeceu a medida tomada pelo governo indiano na semana passada, ao convocar reunião urgente do Conselho de Integração Nacional para examinar a situação e pressionar o governo de Orissa.

O secretário-geral do CMI informou que o governo federal enviou mais de seis mil soldados ao distrito de Kandhamal, depois de uma petição do governo de Orissa.

No sistema federal da Índia, embora a manutenção da ordem e a lei sejam de responsabilidade estatal, o governo federal tem a faculdade de destituir o governo de um Estado caso este não consiga manter o império da lei.

Especialistas políticos consideram que uma medida tão drástica seria “suicida” para o governo federal, uma vez que os nacionalistas indianos poderiam tirar proveito dessa ação – reforçando a teoria de um complô cristão para converter a Índia – levando em conta a realização das eleições nacionais nos próximos meses.

O Estado de Orissa é governado por uma coligação integrada pelo Partido Nacionalista Indiano (BJP), que foi acusado de tolerar a violência organizada contra os cristãos, que persiste há sete semanas na localidade.

Kobia disse ao primeiro ministro indiano que a imagem “secular” da Índia poderia ficar “ofuscada” pelos constantes relatórios de violência contra cristãos.

O primeiro ministro, por sua vez, afirmou que o governo federal não medirá esforços para garantir a “liberdade de culto” aos cristãos no sul do Estado de Karnataka, onde grupos indianos tratam de impedir a comunidade evangélica de celebrar reuniões de oração em locais alugados.

O secretário-geral revelou que o CMI coopera com organizações cristãs para formular um “código de conduta” sobre conversões e mantém diálogo com representantes de outras religiões para atingir um consenso a esse respeito, porque a fé não deve ser motivo de conflito entre as pessoas.

“Os ataques aos cristãos são realmente cruéis. São simplesmente sacrificados como cordeiros”, disse o presidente do Conselho Nacional de Igrejas da Índia, bispo metodista Tharanath Sagar, durante a coletiva.

Membro do Comitê Central do CMI, Sagar integrou a comitiva que se reuniu com o primeiro ministro.

Dezenas de atentados contra igrejas e salas de oração foram perpetrados por fundamentalistas indianos no estado de Karnataka e em sua capital, Bangalore, onde o bispo Sagar reside.

“O que acontece neste momento é uma campanha sistemática para romper o tecido social da Índia com a intenção de obter benefícios políticos”, disse Sagar na coletiva de imprensa. Ele destacou que “a conversão é um fantasma que justifica o ataque aos cristãos”.

Fonte: ALC

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