Ao digitar 21 vezes os botões da urna eletrônica, no dia 1º, o eleitor brasileiro estará sob intensa pressão. Operações da Polícia Federal, CPIs e denúncias sobrepostas numa velocidade inédita na história do País revelaram a importância de uma escolha consciente.
Para se certificar de que os cinco candidatos selecionados não estarão no próximo escândalo, o brasileiro tem, na internet, um grande aliado.
Para ajudar indecisos ou reforçar convicções, pelo menos seis portais especializados trazem o raio X detalhado daqueles que brigam pelo voto dos 125,9 milhões de eleitores.
Organizações não-governamentais como Voto Consciente, Contas Abertas e Transparência Brasil criaram páginas e ferramentas na internet que permitem conhecer o candidato, saber se ele está envolvido em denúncias ou se responde a processos criminais. Dá ainda para acompanhar a prestação de contas e a evolução do patrimônio. O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e os Tribunais Regionais Eleitorais listam as candidaturas sob suspeita.
Desde o escândalo do mensalão, em junho de 2005, o Legislativo tem sido alvo constante. E isso se converteu em indecisão e desconfiança do eleitor. Habituada a acompanhar o noticiário político pela internet e se aprofundar pelos jornais, a engenheira química Andrea Fernanda, de 33 anos, é um exemplo. ‘Não sei em quem votar para o Legislativo, porque todas as propostas são iguais. E, quando chegam ao poder, não fazem nada’, protesta, indignada com os recentes casos de corrupção.
O portal Excelências, da Transparência Brasil, filtrou dados da Câmara, de diversos tribunais e da própria ONG para criar perfis detalhados dos candidatos a deputado federal e ajudar indecisos como Andréa. Após selecionar Estado, partido e nome do candidato, o internauta terá uma ficha completa. Se o político estiver tentando a reeleição, será possível destrinchar carreira política, ocorrências na Justiça, notícias, bens, receitas e despesas da campanha, lista de doadores da eleição de 2002 e ver o balanço da sua atuação parlamentar.
Ranking
Em 2005, 88,7 milhões de brasileiros se conectaram à internet, revelou no último dia 15 a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad), o mais completo estudo socioeconômico do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). São 21% dos brasileiros, a maioria jovens que, com simples cliques de mouse, podem vasculhar o passado dos candidatos.
Quem aponta o interesse crescente dos jovens por política é o movimento Voto Consciente, ONG formada por voluntários que fiscaliza vereadores e deputados estaduais de vários Estados e faz regularmente um ranking dos parlamentares paulistas. O site do movimento traz, adicionalmente, informações básicas sobre as funções de cada Poder e indica cursos de política. Só em agosto, recebeu 123 mil acessos na sua página na internet. Em um único dia, foram 7,5 mil visitas.
Contas Abertas é uma entidade da sociedade civil, sem fins lucrativos, que reúne ‘interessados em conhecer e contribuir para o aprimoramento do dispêndio público’. Com base em dados e balanços oficiais, prepara análises ligadas ao Orçamento e à sua execução. Costuma denunciar o uso eleitoreiro de verbas públicas ou a abertura dos cofres de maneira incomum em ano de eleição. Também está tudo na internet.
Por região
Para permitir o acompanhamento do panorama nacional, o Portal do Estadão (www.estadao.com.br) traz a lista de todos os candidatos aos governos estaduais, além de resultados de pesquisas e notícias diárias, divididas por região.
Definidos os candidatos a deputado estadual e federal, senador, governador e presidente, os eleitores mais exigentes podem ainda vasculhar a página do próprio candidato, verificando as suas propostas, idéias e coligação partidária.
A partir de 2007, de seu micro, o internauta poderá cobrar o cumprimento das promessas. Aí, porém, o e-mail pode ficar sem resposta, avisa a vice-coordenadora-geral do movimento Voto Consciente, Rosângela Torrezan Giembinsky, que conhece bem as dificuldades de cobrar o Legislativo, pois acompanha há 19 anos o trabalho da Assembléia paulista e dos vereadores de São Paulo. ‘A gente sabe que não é assim tão simples.’
‘Eleitor consciente é aquele que busca informação’
Se abalam o País e geram descrença, por outro lado os escândalos e a crise política tiram o eleitor da “zona de conforto” e da inação. “As pessoas começam a pensar em fazer alguma coisa”, diz a vice-coordenadora-geral do movimento Voto Consciente, Rosângela Torrezan Giembinsky, responsável por um projeto de acompanhamento dos deputados estaduais paulistas. O site da ONG recebeu 122 mil visitas em agosto e, neste mês, os acessos dispararam.
Rosângela avalia que, embalado pelos escândalos, o interesse por votar cresceu neste ano, assim como as informações disponíveis. Mas adverte que a mudança será fruto de um esforço pessoal: “O eleitor consciente é aquele que não deixa para a última hora para votar. Mesmo sendo difícil, ele busca informação, assiste ao horário político, lê sobre política e discute sobre política.”
A dirigente da ONG acompanha há 19 anos o trabalho da Câmara Municipal e da Assembléia paulista. Trabalho que cresceu e hoje se estende a mais de 40 Legislativos municipais e Assembléias, em todas as regiões do País. Neste ano, estão sendo criados 20 grupos. Na internet, os sinais de que algo está mudando. E a tendência é o interesse do eleitor crescer ainda mais, prevê Rosângela, em entrevista ao Estado.
Como começou o trabalho do Voto Consciente?
Era 1987 e havia pressão por uma nova Constituição. Queríamos apontar o que as pessoas eleitas para resolver os nossos problemas pensavam dos nosso problemas. Não existia nenhuma organização que fizesse esse trabalho e os políticos achavam que não precisam prestar contas.
Vocês têm vinculação com algum partido ou políticos?
Somos um grupo suprapartidário. Não tem ninguém por trás de nós. Somos nós e nós mesmos. A senhora acha que nesta eleição há uma procura maior dos eleitores por informações pela internet? Acho que sim. Em razão de estarmos numa crise política, em meio a escândalos, sempre provoca um pouco as pessoas. Elas saem dessa zona de conforto e começam a pensar em fazer alguma coisa. Nosso interesse é que as pessoas passem da indignação para uma ação efetiva. Nós somos, por exemplo, contra o voto nulo. Achamos que é uma indignação que não vai levar a lugar nenhum.
Como o eleitor vota hoje?
O eleitor tem uma grande queixa, que é o acesso à informação. Ele acha difícil acessar os dados. Quando o Voto Consciente diz que é preciso buscar o perfil do candidato, o que ele já fez, a história dele, o programa de governo, o eleitor diz: “Mas onde tem isso?” Como segunda queixa, ele diz que, após as eleições, o político não responde, o acesso é difícil. E a gente sabe que realmente não é assim tão simples.
Quais as características de um eleitor consciente?
O eleitor consciente é aquele que não deixa para votar na última hora. Mesmo sendo difícil, ele busca informação, assiste ao horário político, ele lê sobre política e discute sobre política. Por que eu digo isso? Existe uma questão no marketing que diz que tudo está aí, mas você só apreende e aprende aquilo por que tem um certo interesse. Por exemplo, se você está procurando casa para comprar ou alugar, vai começar a ver casa na rua. Se não está alugando nem comprando, não vê. Na política acontece a mesma coisa. Tem informação, os meios de comunicação falam sobre política, mas o cidadão que diz “eu não gosto de política”, “eu não quero saber” ou “isso não tem nada a ver comigo” não vai captar essa informação.
Mas o eleitor, em decorrência de tantos escândalos, está realmente mais interessado neste ano?
Há um movimento bem grande das pessoas, dos jovens, de buscar informação e de participar. A gente sente que existe um movimento maior, e é crescente. Nós até fizemos uma pesquisa, o Voto Consciente junto com oito países, dentro de um projeto da Rede Interamericana pela Democracia. No ano passado, em julho, no auge dos escândalos, medimos o índice de participação no Brasil. E ele foi muito maior do que no ano anterior, 2004. Então é crescente. Em 2004, éramos o índice mais baixo desses países e em 2005 foi o índice mais alto. A gente atribui aos escândalos da época.
Fonte: Estadão