Eles depositaram fé e recursos em quem lhes prometeu dias melhores. Até que, cansados de esperar a providência divina, resolveram pedir o seu dinheiro de volta. São ex-fiéis desapontados que cobram na Justiça indenizações por danos morais e materiais.
Nas estantes de fóruns e do Tribunal de Justiça de São Paulo, casos de pessoas que investiram dinheiro em promessas (desde a celebração de um casamento até o enriquecimento imediato) esperam agora da lei dos homens uma sentença.
As histórias de Maria e de Carlos, ex-freqüentadores da Igreja Universal do Reino de Deus, ilustram essa situação. Eles reclamam na Justiça terem vendido bens, como apartamentos e carros, em troca de prosperidade financeira que não foi alcançada.
Já um católico cobra a devolução de R$ 1.500 pagos para o casamento. Ele pediu o cancelamento dizendo que o padre interferia nos preparativos. O pároco se negou a devolver o dinheiro, e o caso foi à Justiça.
“Quis dias melhores e tudo que me deram foi porrada”, conta o padeiro desempregado José Leite. Ele diz ter participado de sessão de descarrego na Universal, na qual o auxiliar do pastor, ao tentar exorcizá-lo, bateu sua cabeça no banco.
Ele quer R$ 5.000 por danos. O pedido foi considerado procedente, mas a igreja apelou. Já Nelson ouviu do pastor que, se tivesse fé, não cairia do telhado que consertaria no templo da Universal. Caiu, teve politraumatismo e requereu R$ 356.200 de indenização. O pedido foi julgado procedente.
“É muito difícil provar que o fiel é ingênuo e foi induzido. Fé não pode ser mensurada”, diz Adriano Ferriani, professor da PUC-SP e especialista em responsabilidade civil.
Advogada nega fatos e acusa fiel de traição
A advogada da Igreja Universal do Reino de Deus Adriana Guimarães afirma que todos os argumentos levantados nos tribunais por antigos fiéis são mentirosos. Segundo ela, os pedidos de indenizações possuem valores altos porque muitos vêem a Universal como uma entidade rica e tentam obter vantagens financeiras.
“Essa Maria freqüentou a igreja durante quase dez anos. Como alguém pode ter sido enganada tanto tempo?”, diz a advogada. “É meio que uma traição.”
Quanto a José Bezerra, ela diz que se trata de “um oportunista”. “Nós provamos na Justiça que a lesão dele era antiga. O juiz julgou com preconceito, como a maioria das pessoas faz com a Universal.”
Evangélica, Adriana faz parte de um corpo jurídico formado por 14 advogados da Universal em São Paulo. Ela acredita que os ex-fiéis “têm problemas espirituais”.
A Folha de São Paulo relatou o caso do casamento não realizado à assessoria da Cúria de São Paulo, que não telefonou de volta até a conclusão desta edição.
A reportagem enviou e-mails à CNBB, pedindo esclarecimento sobre uma ação por uso indevido de imagem, mas também não obteve resposta.
Para o advogado da Congregação Cristã no Brasil Paulo Sanches Campoi, a liberdade de organização e doutrina das igrejas não pode ser analisada por uma lei humana.
Fonte: Folha de São Paulo