O rabino Henry Isaac Sobel, de 63 anos, garante: estará no encontro de líderes religiosos que encontrarão no próximo mês em São Paulo o papa Bento XVI. E pretende aproveitar a oportunidade para “pedir perdão ao Deus de Abraão, Isaac e Jacó”.
Preso no dia 23 em Palm Beach, na Flórida, Estados Unidos, acusado de furtar quatro gravatas de grife, Sobel permanece internado no Hospital Israelita Albert Einstein, no Morumbi, zona sul da capital. Na tarde de quinta-feira, 5, o presidente afastado da Congregação Israelita Paulista (CIP) recebeu a reportagem do Estado para sua primeira entrevista exclusiva desde o episódio.
Há seis dias se recuperando do que os médicos diagnosticaram como “episódio de transtorno de humor, representado por descontrole emocional e alterações de comportamento”, Sobel ocupa a suíte 1.074 do bloco A do hospital. Na porta, a administração colou um aviso onde se lê, em letras vermelhas: “Visita proibida. Acesso somente com autorização da enfermagem.” Para evitar que alguém descumpra a determinação, seguranças se revezam 24 horas por dia em frente da porta.
Um deles pediu, educadamente, que a reportagem do Estado se retirasse. “Não permitimos entrevistas aqui. O paciente ainda está se recuperando”, advertiu. Mesmo diante da alegação de que a entrada havia sido autorizada pelo próprio Sobel, continuou irredutível. “Estou esperando o senhor aqui fora, pode ser?”
Rotina
Em cerca de 20 minutos de entrevista, foi possível, no entanto, ouvir do rabino sua versão dos fatos e contar como está sendo sua rotina nos últimos dias. Rotina que inclui telefonemas de amigos, companhia da família e visitas freqüentes de enfermeiros para avisar sobre a hora dos remédios e colocar medidores de pressão em seu dedo esquerdo. Até quinta-feira, não havia previsão de quando ele terá alta.
Demonstrando muita tranqüilidade, Sobel atribuiu o furto das gravatas a um ato falho. “Não fui eu que cometi aquele ato, foi um fato, foi algo que não sei explicar, foi um ato… qual é a expressão? Foi um ato falho, como se diz? Jamais tive a intenção de cometer aquilo. Aconteceu sem controle e sem uma memória precisa dos fatos.”
Para o rabino, que mantém seu quipá púrpura, marca registrada, sobre o parapeito da janela ao lado da cama do hospital, a mistura de medicamentos provocou um “lapso em sua cabeça”. “Eu não estou explicando porque não compreendo. E certamente não posso justificar. Acredito que houve algo que dominava a minha pessoa naquele momento. E aquele algo, infelizmente, não fui eu mesmo. Em poucas palavras, perdi o controle da dimensão da crise – hoje, plenamente consciente. E hoje, muito disposto a praticar um ato de tshuva, em hebraico – ‘T’, de Teresinha, ‘S’, de Salvador, H, de Henry, U, V, de Vitória, A. Tshuva significa arrependimento. Reconhecer o erro, dar uma volta para trás e um pulinho para cima.”
Sempre amável e com uma latinha de balas de café guardada no criado-mudo para oferecer aos visitantes, o rabino passou a Pessach (Páscoa judaica) com a esposa Amanda, a filha Alicia e saudades “imensas, intensas” da congregação.
“Fizemos aqui, neste quarto do hospital, o nosso seder (jantar festivo), a nossa refeição”, conta. “Nós fizemos as preces, comemos as comidas simbólicas, foi realmente um Pessach íntimo. Assim como nós celebramos a liberdade do Egito na semana da Páscoa judaica, assim também pedi a Deus, ao lado da minha mulher, que eu viva um êxodo também da situação na qual me encontro. Obviamente, algo estava preso dentro de mim quando aconteceu aquilo. E pedi a Deus para que eu possa viver um êxodo daquele triste episódio.”
Sem camisa e com calça de pijama com listras azuis, o rabino conta também que está com uma “vontade imensa e energia boa para recomeçar” seus trabalhos na CIP. “Tenho tantos planos para concretizar ainda, com a juventude, com os casais jovens, com as pessoas de idade. Eu quero voltar logo, logo, para fortalecer a congregação ideologicamente, humanamente e politicamente. E garantir a consolidação do meu trabalho, ou seja, integrar a comunidade judaica na sociedade brasileira maior.”
Papa
Entre seus projetos para quando deixar o hospital, também está o de encontrar-se com o papa Bento XVI. “O convite foi reconfirmado. E pretendo, se tiver oportunidade, pedir perdão. Não ao papa, porque não sou católico. Eu peço perdão a mim mesmo e a Deus, o Deus dos judeus.” Logo depois, acrescenta: “Eu pretendo, na presença do papa, sentir a humildade dele e fazer com que um pouco dessa humildade entre na minha alma. Quem sabe com uma pequena dose de humildade a mais, eu tenha condições de transformar esse incidente em algo positivo. Tenho muito carinho e respeito por este papa. Se eu tiver oportunidade de contar minha história a ele, tenho certeza absoluta que ele vai me perdoar. Ao pedir perdão ao papa, simultaneamente, vou pedir perdão ao Deus de Abraão, Isaac e Jacó, o Deus dos profetas, o Deus do povo de Israel. E, por extensão, a meus amigos que sofreram e estão sofrendo comigo.”
O rabino diz que, na presença do papa, vai rezar pelos pecados cometidos por todos os homens. “Pretendo me apresentar ao papa não como santo e sim como um ser humano, profundamente arrependido daquilo que aconteceu na Flórida.”
Fonte: Estadão