Uma notícia sobre um hinário esteve entre as mais comentadas (e criticadas) por sites e blogs evangélicos nos últimos dias. O Comitê de Música da Igreja Presbiteriana dos Estados Unidos (PCUSA) está trabalhando em uma atualização de seu hinário.
A primeira edição foi publicada em 1874, com o nome Presbyterian Hymnal. Ele sofreu várias alterações desde então, sendo a mais recente em 1990.
Mas a adaptação de alguns desses hinos incluem não apenas uma nova linguagem; também refletem uma nova teologia. A primeira disputa é pelo hino “Jesus Walked This Lonesome Valley” [Jesus andou neste vale solitário].
A canção faz parte de outras compilações de canções religiosas de diferentes denominações. O principal argumento contrário é que ela contém declarações “teologicamente questionáveis”. A letra diz que devemos caminhar sozinhos pelo vale, o que contraria a afirmação dos Evangelhos que Jesus estaria sempre com seus seguidores. Foram cerca de três anos e meio de debates entre os membros da comissão, que optou por deixar essa e outras músicas de fora da versão final do hinário que será publicado ainda em 2013.
Os debates teológicos foram mais incisivos quando foi sugerida a inclusão da música “In Christ Alone” [Somente em Cristo]. Composta por Keith Getty e Stuart Townend em 2001, a segunda estrofe diz “Naquela cruz onde Jesus morreu/ A ira de Deus foi satisfeita”. No processo de revisão teológica, a opção foi adotar os termos “Naquela cruz onde Jesus morreu/ O amor de Deus foi magnificado”. Como eles não tinham autorização dos autores para mudar a letra, acabaram deixando-a de fora.
Como um hinário não é a expressão da perspectiva de um grupo, mas uma coleção para ser usado por muitas igrejas da mesma denominação. Eis que se apresenta uma “guerra de argumentos” pela consciência de que a seleção de músicas do culto participa de forma direta na formação da fé dos congregados.
A comissão dos presbiterianos encontrou barreira no uso de termos como “soldados de Cristo” e “Rei dos céus” em vários hinos antigos. Optaram por investir na chamada “neutralidade de gênero”, que vai contra muitas tradições cristãs. Uma das músicas que gerou mais conflito foi “Be Thou My Vision” [Seja minha visão], que diz “Seja meu Grande Pai e eu, Teu verdadeiro filho”.
Isso se traduz em uma dificuldade, pois segundo a comissão da PCUSA, a “linguagem expansiva mostra que o Deus que nos conhece tão graciosa e intimamente, na história da salvação é, ao mesmo tempo, totalmente outro e está além do gênero. Portanto, os textos refletem uma preferência em evitar o uso de pronomes masculinos para Deus… O objetivo é oferecer uma coleção em que os hinos tradicionais e músicas que porventura possam se referir a Deus como “Pai”, “Rei” e “Senhor”, são contrabalançadas por outras mais neutras ou expansivas em sua referência a Deus”. Sem desprezar a questão homem/mulher ao se referir aos fieis.
Longe de ser um dilema apenas da Igreja Presbiteriana, o professor Timothy George, diretor do curso de Teologia da Universidade de Samford, assevera que tal liberalidade teológica pode abrir um perigoso precedente. George acredita que tratar a ira de Deus como um tabu, seja em sermões ou hinos, é a perpetuação de uma antiga heresia do primeiro século. Mostraria um Deus que é apenas amor, que extingue as chamas do inferno pois não há condenação.
Contudo, a justiça de Deus só pôde ser satisfeita pelo sacrifício expiatório de Cristo, que revela ao mesmo tempo a ira e o amor divino.
Já o doutor Denny Burk, professor de estudos bíblicos da Universidade Boyce acrescenta que o liberalismo teológico invadiu as músicas cristãs, tendo consequências teológicas profundas.
Esse tipo de mudança não é novo. O hinário da Igreja Anglicana Episcopal, modificado em 1982, eliminou o uso de termos masculinos para se referir a Deus como Pai, Filho e Espírito Santo. Eles o substituíram por termos mais “inclusivos”, como Criador e Redentor. Termos considerados “militaristas” como soldados, batalha e exército, foram eliminados também. Não por acaso, a Igreja Anglicana vive nas últimas décadas uma grande crise, que atingiu seu ápice com o reconhecimento da ordenação de pastores homossexuais e transgêneros.
[b]Fonte: Gospel Prime[/b]