Pancadaria do ringue contrasta com trabalho social da igreja. Fundador da igreja oferece MMA, há oito anos, para tirar pessoas problemáticas da rua.
Em Rochester, estado de Nova York, nos Estados Unidos, uma igreja encontrou uma maneira surpreendente de conquistar novos seguidores. Por lá, não há nenhuma contradição entre amar o próximo e bater no próximo.
Quase na fronteira com o Canadá, Rochester é uma cidade de contrastes. Apesar de ter uma das melhores qualidades de vida dos Estados Unidos, morar nela é barato para os padrões locais.
De longe, uma igreja do subúrbio parece outra qualquer: música gospel, sermão, batismos. Mas quatro vezes por semana, a fé dá lugar à pancadaria.
No ginásio ao lado da igreja, um dos esportes oferecidos de graça para os fiéis é o MMA. Frases da Bíblia dividem as paredes com pôsteres dos ídolos.
Com um terço e a palavra fé tatuada no braço, Brandon Smith é um dos alunos. No culto, ele nem parece o Brandon que tenta dominar o adversário no chão. “Me sinto em casa aqui. Para mim, o MMA é como qualquer esporte. Com uma vantagem: do começo do ano para cá, perdi 27 quilos lutando”, conta.
São seis fiéis de Rochester contra adversários de outros estados americanos e do Canadá. A primeira instrução? Não falar palavrões.
Na sala de aquecimento, faltando poucos minutos para a luta, os atletas da igreja ficam concentrados e fazem uma oração. E a luta começa, com direito à torcida e crianças na plateia.
Pode até não parecer, mas o lema da igreja é: ‘Ame a Deus, ame às pessoas’. A luta foi uma forma de se aproximar, de atrair os fiéis. E eles vieram: mais de 400 seguidores começaram pelo octógono.
Dan é um deles. Era viciado em drogas, vivia arrumando encrenca. Cinco anos atrás, passou a frequentar a igreja.
“Não teria vindo para cá se não fosse o MMA. Treinei um mês e meio antes de pisar no santuário. Eu não vejo problema em misturar luta e religião. Cristo foi o maior guerreiro que já existiu”, conta o lutador Dan Davis.
À frente da luta e da fé está um pastor nada convencional. Paul Burress é filho do fundador da igreja que se chama Vitória. É uma igreja autônoma que segue a fé cristã. Ele administra tudo de uma sala decorada de Homem-Aranha. “Gosto dele porque ele sabe equilibrar força e responsabilidade”, diz.
Mas o ídolo máximo é Jesus. Paul aprendeu a lutar com um primo que praticava jiu-jitsu brasileiro. Ele trouxe o MMA para a igreja há oito anos para tirar pessoas problemáticas da rua.
Ao ser perguntado se não é estranho um esporte violento na casa de Deus, Paul responde: “Muita gente acha que é violento, mas eu fico mais assustado com futebol americano e rugby. Para mim, são apenas dois garotos testando suas habilidades em um esporte”.
Nessa hora, o pastor deixa as palavras da Bíblia de lado. Ele vai gritando os nomes dos golpes que o aluno deve aplicar para derrotar o adversário. “Dê um soco, bata com vontade”, ele diz.
No intervalo, palavras de incentivo. Lembro que Jesus dizia: ‘Ofereça a outra face’ e que não foi isso que vimos. “Jesus disse para darmos às pessoas mais do que elas pedem. Mas isso era em um outro contexto. Não é sobre esportes”, diz.
Mas o risco de se ferir existe. Anthony não sabia que ia protagonizar o momento mais dramático da noite. “O MMA é a minha vida, os meus sonhos”.
E lá vai ele. Vence a luta, mas sai machucado depois de levar golpes na cabeça.
Agora um momento de tensão. Anthony está passando mal. O pessoal tenta ajudar, reanimá-lo. O irmão chegou para ajudar também. Ele está fazendo alguns testes físicos para saber se ele está realmente bem.
Anthony vai embora de maca, deixando o público assustado e dividido. Um homem diz que não vê problema na luta: “Religião e guerra andam juntas”.
Outro discorda: “O MMA é muito bruto. E religião significa paz. Não deveria brutalizar ninguém”.
A polêmica virou filme. “Igreja da luta”, dirigido por um dos vencedores do Oscar de Documentário de Curta-Metragem, foi lançado este ano nos Estados Unidos.
A pancadaria do ringue contrasta com o trabalho social da igreja, que tem uma escola para crianças carentes e ajuda desamparados nas Filipinas e no Haiti.
Para o pastor Paul, não há contradição: “Se alguém acha que sou um pecador por causa da luta, tudo bem. Todos nós somos pecadores de alguma forma. Aqui é um lindo lugar para encontrar Deus”.
[b]Fonte: G1 – Site do Fantástico[/b]