A Justiça concedeu liminar, nesta terça-feira, 24, para autorizar a Santa Casa de Rio Preto a realizar transfusão de sangue em um recém-nascido, filho de Testemunhas de Jeová. A religião proíbe o procedimento.
Mas diante do quadro de distúrbio de coagulação, hemorragia grave e anemia, o hospital recorreu à Justiça e ganhou o direito de realizar a transfusão um dia depois do pedido ser protocolado na 1ª Vara Cível da Cidade. O procedimento foi realizado nesta terça-feira e o bebê passa bem, segundo o hospital.
A criança, um bebê do sexo masculino, nasceu na Santa Casa no último dia 17, e foi internado um dia depois com quadro de desidratação e hipoatividade. No dia 19, a criança foi encaminhada para UTI Neonatal por conta da piora. Depois de intubado, o recém-nascido apresentou distúrbio de coagulação, sangramento digestivo alto e, como consequência, anemia.
“Entramos com a medicação necessária, mas chega uma hora que não tem jeito”, disse o provedor da Santa Casa, José Nadim Cury. O relatório médico foi juntado no pedido, “concluiu que é indispensável a realização, em caráter de extrema urgência, de transfusão de sangue no recém-nascido da requerida, pois todos os tratamentos alternativos não apresentaram condições de reverter a piora de seu quadro clínico.”
Apesar da constatação, a mãe da criança negou a transfusão e assinou um termo de responsabilidade em que assumiu o risco do bebê morrer pela falta do procedimento. Baseado no Código Civil, no Estatuto da Criança e Adolescente (ECA), em determinações internacionais e nos artigos 31 e 32 do Código de Ética Médica, o hospital acionou a Justiça. “Estamos cumprindo com a nossa função de salvar vidas”, reafirmou Nadim.
Para o juiz Lavínio Donizetti Paschoalão, o direito à vida vem em primeiro lugar. “Preservada a garantia constitucional do direito a crença e culto religioso, o direito à vida é de ser tutelado em primeiro lugar pelo Estado, dada ordem de grandeza que envolve um e outro direito, evidenciando a presença do fumus bonijuris (perigo da demora).”
Paschoalão também ressaltou a necessidade da transfusão sanguínea. “A documentação que veio acompanhando o pedido inicial revela o estado grave em que se encontra a criança, de molde a não prescindir da transfusão sanguínea, o que, como alega a autora na inicial (Santa Casa), se mostra provável, revelando, pois, a presença do periculum in mora”, diz trecho da sentença.
Notificados no mesmo dia da concessão da liminar, a decisão já garantiu o procedimento. “Já está sendo feito”, afirmou Nadim. Segundo ele, a decisão de procurar a Justiça foi baseada no princípio do hospital de salvar vidas em primeiro lugar. “Não tivemos outra alternativa, falamos com os pais, mas eles não nos autorizaram. Temos que respeitar a crença, mas o direito a vida vem em primeiro plano”, ressaltou o médico.
De acordo como Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos de Nova York, toda pessoa deve ter o direito de liberdade de pensamento, de consciência e de religião garantida por Lei.
Em um segundo momento o pacto ainda afirma que ninguém poderá ser forçado a se submeter a algo que possa restringir sua liberdade de ter ou de adotar uma religião ou crença de sua escolha.
Já um terceiro ponto do artigo afirma que a liberdade de manifestar a própria religião ou crença estará sujeita apenas “a limitações previstas em lei e que se façam necessárias para proteger a segurança, a ordem, a saúde ou a moral públicas ou os direitos e as liberdades das demais pessoas.”
Afirmação usada pela defesa da Santa Casa para reforçar o direito de realização da transfusão de sangue. “Estando o recém-nascido aos cuidados do hospital requerente, cabe a este o zelo pela sua saúde, integridade física, devendo utilizar de todos os meios disponíveis de diagnóstico e tratamento, cientificamente reconhecidos e a seu alcance, em favor do paciente.”
Fonte: Diário da Região