Previsto inicialmente para durar três dias, o julgamento de Flordelis Santos de Souza e outros quatro réus será retomado nesta quarta-feira, terceiro dia de júri, ainda com 28 testemunhas pendentes de serem ouvidas. A maioria das pessoas que faltam prestar depoimento é testemunha de defesa.
Nas duas sessões desta semana, apenas seis pessoas foram ouvidas pelo tribunal: os dois delegados que investigaram o crime, três filhos afetivos da pastora e a ex-patroa de Lucas Cezar dos Santos de Souza, filho de Flordelis.
Entre as testemunhas que ainda serão ouvidas no julgamento, estão três peritos, contratados pela defesa, e o desembargador Sirio Darlan , que foi o juiz titular da 1ª Vara da Infância e Juventude do Rio durante os anos 1990. Nos primeiros dois dias de depoimentos, os relatos duraram ao menos 3 horas cada. No entanto, para as próximas testemunhas, a expectativa é que sejam mais rápidos.
O segundo dia de julgamento da ex-deputada federal Flordelis, acusada de ser a mandante da morte do próprio marido, o pastor Anderson do Carmo, também teve duração de mais de 11 horas e contou com o depoimento de três testemunhas na terça-feira (8), no Fórum de Niterói, na Região Metropolitana do Rio de Janeiro.
A expectativa para este segundo dia de julgamento era ouvir boa parte das nove testemunhas de acusação, convocadas pelo Ministério Público, mas apenas uma da assistência de acusação e outras duas do MP foram entrevistadas.
Além da ex-parlamentar, outros quatros réus estão sendo julgados: a filha biológica de Flordelis Simone dos Santos, a neta Rayane dos Santos e os filhos adotivos André Luiz e Marzy Teixeira.
O segundo dia de julgamento começou com mais de uma hora de atraso porque André Luiz, um dos réus, não foi listado para a tranferência até o fórum pela Secretaria de Administração Penitenciária, o que fez com que o processo demorasse mais do que o previsto.
Após a chegada o réu, a sessão começou com a oitiva do inspetor Tiago Vaz de Souza, que foi convocado pela assistência de acusação, exercida pelo advogado Angelo Máximo.
Na sequência foi ouvida a primeira testemunha da acusação no dia, e quarta da lista de convocados.
Alexsander Felipe Matos Mendes, filho afetivo de Flordelis, que também era chamado de Luan no núcleo familiar da ex-deputada, pediu para ser ouvido sem a presença dos réus, o que foi feito por videoconferência.
Ele começou seu relato fazendo um panorama da casa da pastora.
“Quando você era contra Flordelis e quem estava com ela, você era o próprio demônio. Era Time A e Time B, time do bem e time do mal”, disse ele sobre as divisões existentes na casa da ex-parlamentar.
Ele também falou de suas impressões assim que o pastor Anderson do Carmo morreu. Alexsander disse que foi até a casa da família em Niterói após o enterro, e contou que, Flordelis disse, abrindo os braços: “Estou livre”.
Romance com menor e rituais
A segunda testemunha da acusação, terceira do dia, foi Wagner Andrade Pimenta, também filho afetivo da ex-deputada. Ele também pediu para ser ouvido por videoconferência.
Como era da primeira geração dos filhos afetivos de Flordelis, Wagner contou como chegou à casa da pastora, de sua convivência com Anderson de Carmo – que inicialmente era filho afetivo da ex-parlamentar -, e como ele foi alçado ao posto de namorado da pastora com 16, 17 anos.
“Era menor de idade, devia ter 16, 17 anos”, disse acrescentando ainda que os dois só se casaram em 1998, quando Anderson já tinha 21 anos.
Depois, Wagner – que também era conhecido como Misael no núcleo familiar da pastora -, falou sobre alguns rituais que presenciou na casa, inclusive da renomeação dos seus membros.
“Ritual com sexo, não, mas teve um em que eu me deitei no chão, fechava o olho e depois ouvi minha mãe dizer: ‘A partir de hoje você não é mais o Wagner. O Wagner morreu, e você agora é o Misael, meu filho espiritual, que vem do céu para me ajudar”, contou.
Flordelis passou mal na sessão
O segundo dia de julgamento também foi marcado por alguns atendimentos médicos. Na parte da manhã, Simone dos Santos, ré e filha biológica de Flordelis, pediu medicação para dor de cabeça.
Na parte da tarde, pouco depois do início do depoimento de Wagner Pimenta, Flordelis deixou o plenário para atendimento médico.
A ex-deputada teve um mal-estar, vomitou, mas conseguiu voltar a para o fim do depoimento.
Ao fim da sessão, o advogado de Flordelis comentou o episódio e disse que mesmo não estando bem, ela fez questão de voltar: “Ela não quis parecer que estava fugindo”, disse Rodrigo Faucz.
Ele também disse estar ansioso para o início dos depoimentos das testemunhas de defesa, o que acredita que deve começar nesta quarta-feira (9).
“Vamos poder ouvir o outro lado também”, disse ele acrescentando que se todos se ativerem às provas técnicas, seus clientes seriam inocentados.
Primeiro dia do julgamento
No primeiro dia de julgamento, na segunda-feira (7), Flordelis chegou ao Fórum de Niterói por volta das 8h. No banco dos réus, a missionária chorava muito — sobretudo quando viu parentes na plateia.
A delegada da Polícia Civil, Bárbara Lomba, foi a primeira testemunha de acusação a ser ouvida na sessão. Lomba conduziu a primeira investigação do caso e negou que a pastora tenha relatado à polícia que fora vítima de abusos sexuais ou violência física cometidos por Anderson.
De acordo com Bárbara, no período em que esteve à frente da Delegacia de Homicídios, a ex-deputada foi ouvida pelos investigadores duas vezes. Ela disse ainda que o casamento de Flordelis e Anderson era aberto.
“Jamais, nem que ele tinha nenhuma atitude reprovável. Pelo contrário, falou muito bem. Que tratava todos com muito respeito, com muito amor. E quando levantamos o telefone dele, ele também tinha esse tratamento com Flordelis”, afirmou, ao ser indagada pelo advogado de acusação Angelo Máximo.
A delegada afirmou que não houve confirmação de que abusos sexuais tenham sido cometidos na casa:
“O que se provou é que as relações eram consentidas”, disse ela.
“[O relacionamento] Era aberto. As coisas eram abertas lá dentro. Havia um casamento e eles, como pastores, se comportavam como num casamento tradicional. Não estou dizendo isso para julgar. Mas é que isso foi importante para a investigação. A gente desmonta algo que era construído de uma outra forma. Era passado como se fosse de outra forma. Não havia um amor de pai e mãe. Pessoas já tinham tido relações com Flordelis, com Anderson.”
A morte de Anderson do Carmo ocorreu na noite de 16 de junho de 2019. O pastor foi morto, com mais de 30 tiros, na garagem da casa onde morava com a família, em Pendotiba, Niterói.
O delegado Allan Duarte Lacerda, que concluiu as investigações como titular da Delegacia de Homicídios de Niterói e São Gonçalo (DHSG), foi o segundo a depor.
Ele narrou algumas supostas tentativas de envenenamento malsucedidas e que teriam sido promovidas por Marzy Teixeira, filha adotiva de Flordelis. Contou também que houve uma tentativa de contratação de pistoleiros para executar o pastor.
A terceira testemunha a ser ouvida foi Regiane Ramos Cupti. Ela é ex-patroa de Lucas César dos Santos, um dos filhos adotivos de Flordelis também envolvido no crime e já julgado.
Regiane contou como conheceu Lucas e acabou criando laços com ele, que tinha pena do jovem porque sempre andava sujo e maltrapilho e, que após contratá-lo para trabalhar em sua oficina, começou a saber o que acontecia na casa da ex-deputada federal.
Uma dessas dinâmicas, segundo a testemunha, era a dos filhos preferidos, os “privilegiados”, que tinham roupas, comida e não trabalhavam na casa da ex-parlamentar, e os dos “escravos”, que trabalhavam, não tinha acesso à comida ou a uma de qualidade inferior e eram maltratados por Flordelis.
Entre os maus-tratos narrados pela testemunha, haveria ainda um taco de beiseball na casa que era usado para ameaçar os filhos que não obedecessem às ordens.
Lucas pertenceria a esse segundo grupo e, segundo relato de Regiane, começou a ser procurado por Flordelis e mais bem tratado para “matar o pastor ou arrumar alguém para matar”.
Regiane também citou que sofreu uma tentativa de atropelamento feita por uma das netas de Flordelis, e que a diretora Mariana Jaspe estava no local presenciado tudo.
As defesas dos réus exigiram a convocação de Mariana, que estava no plenário, o que acabou sendo acatado pela juíza Nearis Arce.
No local, Mariana contou que estava no carro com Rafaela, neta de Flordelis, gravando e que a mesma disse que teria que parar comprar mantimentos para levar para a visita da mãe. Ela concordou, e olhava pela lente da câmera quando viu Rafaela parar e com cara de assustada, sem, no entanto, fazer qualquer movimento brusco com o carro. À frente, na faixa de pedestre estaria Regiane.
Ao final, Mariáh Soares da Paixão, uma das promotoras do caso, dispensou a testemunha.
Jurados
Antes da sessão, houve o sorteio dos jurados. Entre os 30 pré-escolhidos, foram sorteados sete: quatro homens e três mulheres, que vão acompanhar o julgamento e definir o destino dos réus.
O julgamento tem previsão de durar três dias. Neles, serão ouvidos, ao todo, mais de 30 testemunhas – entre acusação e defesa -, e os cinco réus julgados.
Fonte: G1, Fuxico Gospel, Pleno News e Extra