Após semanas mantendo silêncio sobre o assunto, a chanceler alemã Angela Merkel falou nesta quarta-feira sobre as crescentes alegações de abusos sexuais dentro da Igreja Católica alemã. Também na quarta-feira, um representante da Igreja reconheceu que alguns casos de abuso foram acobertados.

As queixas continuam surgindo. No final da semana passada, cerca de 200 pessoas alegando serem vítimas na Alemanha contataram um promotor de Berlim encarregado pelos jesuítas de investigar os casos de abuso sexual por membros do clero alemão. Outras 150 foram a público com histórias de maus-tratos na escola religiosa em Ettal. E 15 ex-coristas se apresentaram com queixas relacionadas ao seu tempo como membros do famoso coro de Regensburg, chamado Domspatzen.

Nesta quarta-feira, a chanceler alemã Angela Merkel comentou pela primeira vez sobre o escândalo de abuso. Falando ao Parlamento alemão, o Bundestag, durante um debate sobre o orçamento de 2010 do país, Merkel disse que “o abuso sexual de crianças… é um crime abominável”. Ela prosseguiu dizendo que “há apenas uma possibilidade para nossa sociedade lidar com esses casos: verdade e clareza sobre tudo o que aconteceu”.

Antes dos comentários de quarta-feira, Merkel foi criticada por não ter se manifestado sobre os casos, que ocupam as manchetes na Alemanha desde as primeiras revelações sobre os abusos em uma escola jesuíta em Berlim, que foram revelados no final de janeiro. De lá para cá, ex-estudantes de internatos predominantemente católicos – mas também de instituições protestantes e sem denominação – têm se apresentado com queixas de terem sido vítimas de abuso físico e sexual.

Muitos dos casos ocorreram décadas atrás, o que significa que o estatuto de limitações impede que os responsáveis sejam processados. Há pedidos para que a Alemanha reveja as leis do estatuto de limitações, um apelo que Merkel apoiou na quarta-feira. “Nós precisamos conversar sobre o estatuto de limitações, indenizações também podem ser discutidas”, disse Merkel.

Acobertamento pela Igreja

Os comentários da chanceler foram feitos no mesmo dia em que o bispo Stephan Ackermann, nomeado pela Igreja Católica para investigar as alegações de abuso, reconheceu que a Igreja tinha conhecimento sobre alguns casos de abuso, mas que os encobriu.

“Segundo o que sabemos agora, ocorreram casos de acobertamento. Isso é algo que reconhecemos dolorosamente”, disse Ackermann ao “Rhein Zeitung”, em uma entrevista publicada na quarta-feira. “Eu soube nos últimos dias que estivemos concentrados demais em proteger os perpetradores (…) Nós exibimos uma deferência imprópria para com a reputação da Igreja…”

O Ministério da Justiça da Alemanha está promovendo uma mesa redonda para analisar os casos de abuso, uma medida apoiada por Merkel na quarta-feira.

O papa Bento 16 até o momento tem se mantido em silêncio sobre a série de alegações de abuso na Alemanha. Ele se encontrou na última sexta-feira com o presidente da Conferência dos Bispos da Alemanha, Robert Zollitsch, e os líderes católicos alemães esperam que o papa faça comentários nesta semana. O irmão do papa, Georg Ratzinger, foi implicado por alguns ex-coristas de Domspatzen, que acusaram o irmão mais velho do papa de atirar cadeiras contra os meninos em acessos de raiva. Certa vez, disse o ex-corista Thomas Mayer à “Spiegel”, ele ficou tão furioso “que até mesmo seu dente postiço pulou fora”.

O papa sabia?

Há especulação de que o próprio papa teve conhecimento dos casos de abuso sexual durante seu período como arcebispo de Munique, de 1977 a 1982. Um padre chamado Peter H. foi transferido de Munique para Essen após ter forçado um menino de 11 anos a realizar sexo oral. Em 1980, como membro do Conselho da Diocese, Joseph Ratzinger esteve envolvido na decisão de conceder acomodações para Peter H. em um presbitério.

Pouco depois, o homem estava novamente envolvido em atividades pastorais, sem quaisquer restrições. Em 1986, um tribunal em Ebersberg deu a H. uma sentença de prisão de 18 meses, mas com liberdade condicional, por ter novamente abusado sexualmente de um menor, desta vez na cidade de Grafing, na Baviera. Representantes da Igreja alegam que o papa não tinha nenhum conhecimento do caso.

Fonte: Der Spiegel

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