Segundo dados nacionais do ministério masculino Homens de Valor, grupo de atuação interdenominacional, os homens são apenas 32% da membresia de uma típica igreja brasileira.

Quando realizou seu ministério neste mundo, Jesus escolheu doze homens como seus discípulos. Os primeiros líderes da Igreja – Pedro, Paulo, Tiago – eram todos do sexo masculino. O cristianismo cresceu e consolidou-se nos primeiros séculos de nossa Era através da vida e do trabalho de homens notáveis, como Inácio, Clemente, Agostinho. Na Reforma Protestante, lá estavam homens como Calvino e Lutero apontando novos rumos para a Igreja. Mais tarde, foi a vez de John Wesley, D.L. Moody e Jonathan Edwards – homens, sempre homens – firmarem as bases da cristandade no mundo moderno. No último século, homens de Deus como Martyn Lloyd-Jones e Billy Graham ganharam projeção, alcançando multidões para o Evangelho. Sim, desde seus primórdios, a fé cristã teve uma decisiva presença masculina em sua implantação e disseminação pelo mundo. No entanto, quase dois mil anos depois de sua fundação, na Igreja Cristã de hoje as mulheres predominam. Segundo dados nacionais do ministério masculino Homens de Valor, grupo de atuação interdenominacional, os homens são apenas 32% da membresia de uma típica igreja brasileira. A mensuração foi feita a partir do mapeamento de dezenas de grupos eclesiásticos e revela uma verdade: eles são mesmo mais duros em relação às coisas de Deus.

Motivos para isso são vários, e não apenas espirituais. O homem, por sua natureza, tende a ser menos sensível e mais reservado em relação aos aspectos interiores de sua alma. No mundo latino, o perfil do machão que não se dobra a nada e jamais verte uma lágrima cria estereótipos. Além disso, a impulsividade típica do chamado DNA masculino impede, muitas vezes, o homem de aproximar-se de Deus. “Há uma série de fatores que justificam esse comportamento”, explica o pastor Nélio da Silva, coordenador nacional de Homens de Valor. “O homem é mais competitivo e encontra mais dificuldade de abrir o jogo, para não se mostrar mais fraco”. Além disso, a tendência de aumentar a carga horária de trabalho ou de acumular vários empregos e serviços para conseguir uma renda maior é um fator que contribui diretamente para a ausência masculina nos cultos, especialmente nos dias de semana. “Eles têm mais dificuldade de se relacionar. Acham que um culto no domingo já está muito bom.”

Uma pesquisa realizada pelo Bureau de Pesquisa e Estatística Cristã (Bepec) em parceria com a Editora Hagnos com cerca de 700 homens evangélicos – todos com ligação institucional com alguma igreja – comprova o fato. Mais de 55% deles admitem que “algumas vezes”, “raramente” ou “nunca” comparecem a atividades exclusivas para homens em suas congregações. A frieza dos homens em relação à sua fé é um fator que tem desafiado a liderança cristã. Suprir a lacuna masculina nas igrejas e, ao mesmo tempo, firmar os homens na sua fé – já que, quando um homem se converte a Cristo, o resultado em sua família e círculo de influência é imediato – é uma preocupação dos pastores. “Os homens não querem se envolver e os ministérios que se voltam para alcançá-los. Não raramente, esses trabalhos têm uma alta rotatividade de integrantes”, faz coro Newton Rodrigues, líder do ministério Homens da Promessa. O grupo, surgido na Igreja Batista da Lagoinha, em Belo Horizonte (MG), alcança hoje várias outras comunidades cristãs.

Uma constatação feita pelo ministério Homens de Valor é que o discurso e os rituais eclesiásticos trazem uma ênfase maior à segurança, em detrimento de proporcionar um ambiente mais desafiador. Essa opção justificaria a maior procura feminina pelas congregações. “Em um mundo perigoso como este em que vivemos, a Igreja tem se tornado um santuário de segurança e proteção”, continua Nélio. “Isso é tudo o que uma mulher deseja, mas não é a primeira opção de um homem. Eis aqui a distinção básica e fundamental entre os dois gêneros humanos. Estudiosos do comportamento têm afirmado que a mulher é orientada pela segurança, enquanto os homens o são pelo desafio.”

[b]”FRIOS E APÁTICOS”
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Além da nítida inferioridade numérica em relação às mulheres – na base geral de sete mulheres para cada três –, os homens não se envolvem devidamente com a própria fé. Essa é mais uma constatação do pessoal de Homens de Valor. “Muitos deles, mesmo dentro das congregações, são apáticos, frios e espiritualmente desconectados”, avalia o pastor. E o pior é que mesmo aqueles que um dia creram, se batizaram e integram uma igreja enfrentam sérios problemas para manter a fé diante dos problemas da vida. De acordo com amplo estudo do ministério Man in the mirror (“Homens no espelho”), liderado nos Estados Unidos pelo pastor Patrick Morley, a cada 10 homens crentes, cerca de nove terão filhos que um dia abandonarão o rebanho e oito não estão satisfeitos profissionalmente, o que se reflete diretamente na fé. A integridade pessoal é outro desafio. Quando o assunto é casamento e vida sexual, os indicadores mostram que 50% dos homens terão problemas com pornografia e 40% – isso mesmo, quarenta por cento – terão sérias crises no casamento ou vão se divorciar.

Diante disso, igrejas e grupos de trabalho têm tentado implementar maneiras para conquistar o coração do homem para Cristo. Mesmo sem uma fórmula mágica, os líderes apontam caminhos que têm se mostrado viáveis. Um deles é estreitar os laços de companheirismo e ajuda mútua entre homens evangélicos, através de grupos pequenos e atividades como corais masculinos, equipes de ação social ou mesmo turmas de futebol que, entre um rachão e outro, reúnem-se para orar, estudar a Bíblia e compartilhar experiências de vida. Segundo a pesquisa do Bepec, quase a metade dos pastores pesquisados dizem que futebol, churrascos e confraternizações sociais são mesmo as atividades preferidas pelos homens crentes nas comunidades evangélicas – e só 10% das igrejas promovem aconselhamento especificamente voltado para eles. Por isso, a ênfase das lideranças é no sentido de promover amizades espirituais. De acordo com o levantamento, 70% dos homens evangélicos demonstram grande interesse em relacionar-se com irmãos na fé. Com foco na comunhão, o ministério Homens de Promessa realiza estudos e debates acerca de fatos do cotidiano e da vida cristã, sem deixar de lado os momentos de comunhão e confraternização m estudos. As reuniões são semanais, com duração média de duas horas, e há um encontro bimestral, envolvendo vários grupos, promovido por coordenadores de cada região.

De acordo com Newton, o efeito desses encontros têm sido reconhecido até pelas esposas, que cobram dos maridos que não abandonem as reuniões. “Uma mulher ficou chateada com o marido porque ele não foi à reunião. Ela diz que a vida dele mudou desde que passou a ter amigos na igreja”. A visão ministerial simples e eficaz surgida na igreja mineira tem se espalhado no Brasil, através de congressos e seminários de capacitação. Outro tipo de trabalho que tem conseguido frutos na seara masculina é aquele que envolve casais e famílias. De acordo com o líder do Ministério de Edificação de Famílias da Igreja Batista do Avivamento em Coqueiral, no Recife (PE), Stefield Máximo, a resistência dos homens é quebrada a partir de eventos que conscientizam o casal de que é possível ter um matrimônio feliz. “Fazemos contatos telefônicos com os maridos, mostrando que a participação deles é importante”, conta o dirigente. “A partir de uma conversa sutil, criamos uma aproximação e muitos se abrem para ser ajudados”. Segundo Máximo, cada ação da igreja reúne em média 50 casais.

Mas ele sabe que fechar a equação familiar é difícil. “Os homens são bastante resistentes. Acham que podem resolver seus problemas sem ajuda. A maioria dos problemas familiares têm origem no marido”, aponta. E um dos focos disso está no descuido com a vida espiritual. Autor do livro Homens de oração (Editora Hagnos), o pastor presbiteriano Hernandes Dias Lopes diz que as famílias cristãs não precisam apenas de homens que sejam provedores materiais, mas, também, intercessores. “Precisamos fazer um movimento para despertar homens de oração. Eles devem dedicar o melhor de seu tempo para orar”, comenta na obra.

A necessidade de levar o homem cristão a um compromisso de oração por si mesmo, por sua família e por seus filhos foi a motivação para o surgimento do ministério Homens de Coragem, surgido em outubro [img align=right width=300]http://cristianismohoje.com.br/media/k2/items/cache/26c195007944b894aae7335fae091351_S.jpg[/img]passado, numa parceria com Mocidade para Cristo (MPC). Inspirado no filme Corajosos, produção de uma igreja americana que fez sucesso mostrando a difícil relação entre pais e filhos, Onir Prado, um empresário do Rio de Janeiro, se prontificou a começar um trabalho de homens que oram – em moldes parecidos com o Desperta Débora, grande movimento feminino de intercessão. O objetivo, entre outros, é fazer com que eles sejam referência de integridade no trabalho e na igreja, além de assumir a liderança espiritual dentro de casa.

Os integrantes assinam juntos um termo de compromisso como forma de oficializar essa tomada de posição. “O compromisso é individual, estabelecido com Deus, e de foro íntimo”, explica o pastor presbiteriano Marcelo Gualberto, da MPC. Satisfeito com os resultados até agora, ele diz que nada foi muito planejado, e que o trbalho surgiu a partir da simples constatação de uma carência espiritual, à qual os participantes têm respondido muito bem: ” O vento sopra onde quer. O movimento apenas aconteceu, e está acontecendo, simples assim.”

[b]DISCUPULADO[/b]

Encontrar a liderança certa também é de importância crucial para o sucesso dos ministérios masculinos na Igreja evangélica, segundo o pastor Nilton Souza. “O líder precisa ser discípulo para depois fazer outros discípulos. Ninguém pode levar uma pessoa por um caminho no qual nunca passou”, observa o ministro, que ocupa o cargo de gerente executivo de Evangelismo e Discipulado da Junta de Missões Nacionais da Convenção Batista Brasileira. Conquistar o interesse dos homens é também essencial, assim como o envolvimento pastoral nesse processo, diz ele.

Outro aspecto que não pode ser negligenciado quando o assunto é levar o homem aos pés de Cristo é o discipulado, sobretudo de novos convertidos. A Igreja do Nazareno em Boa Viagem, também na capital pernambucana, promove o projeto Cursilhos da Cristandade. Através de eventos como retiros exclusivos para homens, os responsáveis pelo trabalho têm visto a transformação acontecer das maneiras mais inusitadas. “Os homens costumam chegar emburrados e de cara feia”, brinca um dos organizadores, Marcelo Oliveira. Ele diz que o foco principal é a evangelização, mas há também uma série de atividades para quebrar o gelo. No fim, até empedernidos marmanjos caem nas brincadeiras e saem edificados em sua fé. A participação de cada acampante parte da indicação de algum amigo ou da própria mulher. “No evento, há uma quebra dos preconceitos que muitos homens têm em relação à igreja. E essa cura acontece por palavras, não é algo emocional”, frisa Oliveira.

Encerrado o retiro, são promovidos reencontros e os integrantes são incentivados a ficar na igreja ou a retornarem a sua congregações de origem. A coisa dá tão certo que o pessoal sai de lá com vontade de anunciar o Evangelho e alcançar outros homens. Como fruto dos Cursilhos da Cristandade, já foram fundadas congregações no interior de Pernambuco, em cidades do sertão como Santa Cruz do Capibaribe e Timbaúba. “Para abençoar os homens, a igreja precisa ir muito além de churrasco e futebol. Os homens anseiam por relacionamentos; porém, essas amizades precisam ser fundamentadas em algo genuíno. Os homens precisam sentir que eles estão pisando em terreno seguro e devem ver exemplos consistentes de vida com Deus”, encerra o pastor Nélio da Silva.

[b]Fonte: [url=http://cristianismohoje.com.br/assinatura?view=plans&category_id=1]Site da revista Cristianismo Hoje[/url][/b]

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