Comissão de Juristas responsável pela revisão e atualização do Código Civil. (Foto: Pedro França/Agência Senado)
Comissão de Juristas responsável pela revisão e atualização do Código Civil. (Foto: Pedro França/Agência Senado)

Uma comissão de juristas, ao longo dos meses, elaborou um projeto que propõe mudanças no Código Civil brasileiro, que é o responsável por regular a vida de um indivíduo desde o nascimento até depois da morte. Agora, o texto deve entrar em discussão no Congresso Nacional.

Dentre as alterações, os juristas responsáveis pela revisão e pela atualização do Código Civil sugeriram a substituição dos termos “homem e mulher” e “marido e mulher” do conjunto de leis relacionadas ao casamento e à união estável. Como alternativa, os especialistas desejam a adoção da expressão “duas pessoas”, o que reconheceria novos conceitos de relacionamentos afetivos. Tal sugestão está baseada em julgamentos já consagrados no Supremo Tribunal Federal (STF) e no Superior Tribunal de Justiça (STJ), bem como em uma resolução do Conselho Nacional de Justiça.

“É um tema que suscita debates e reflexões importantes nos âmbitos jurídico e social. Essa mudança, se implementada, representaria uma significativa transformação no conceito tradicional de casamento presente na nossa legislação”, avalia o advogado Rafael Durand, que é professor de Direito da Universidade Estadual da Paraíba (UEPB).

Segundo o especialista, é relevante destacar que a Constituição Federal, no artigo 226, artigo 3º, estabelece que a família é formada pela união entre homem e mulher, conferindo proteção especial a essa forma de entidade. “Além disso, a legislação brasileira não previa, até a decisão do Supremo Tribunal Federal, em 2011, o reconhecimento do casamento e da união estável entre pessoas do mesmo sexo”.

Rafael pontua, também, que a definição de família como a união entre marido, mulher e a prole é um conceito historicamente arraigado na sociedade e no ordenamento jurídico brasileiros. “A dualidade, fecundidade e complementariedade entre os sexos opostos têm sido pilares fundamentais na concepção de família, refletindo valores e tradições culturais”.

De acordo com o advogado, a proposta de alteração para substituir a definição de casal como homem e mulher por “duas pessoas” no novo Código Civil é um tema complexo que envolve não apenas questões jurídicas, mas também sociais, culturais e religiosas, demandando uma análise cuidadosa e ponderada dos impactos e das consequências que essa mudança poderia acarretar na sociedade e no sistema jurídico como um todo.

Nesse contexto, Rafael diz que a proposta pode gerar insegurança jurídica. Isso porque confronta diretamente o texto constitucional que estabelece a união entre homem e mulher como base da família. “Essa mudança poderia impactar a liberdade religiosa, especialmente no que se refere às cerimônias de casamento realizadas por instituições religiosas”.

O advogado lembra, ainda, que muitos casamentos são celebrados em cerimônias religiosas que possuem efeitos civis, e as religiões têm suas próprias concepções e preceitos sobre o casamento baseados em seus livros sagrados e tradições. “Obrigar líderes religiosos a realizarem casamentos que vão de encontro a eles poderia configurar uma violação à liberdade religiosa e de consciência, garantidas pela Constituição”, expõe Rafael.

Família disfuncional

O pastor e teólogo Lourenço Stelio Rega afirma que, ao longo da história, ocorreram inúmeras alterações no modelo de família considerado tradicional. Agora, o objetivo é contemplar todo e qualquer casal, seja heterossexual ou não.

Por isso, a proposta, segundo ele, “visa, em grande parte, atender às demandas presentes no espírito da atual época cimentada na Pós-modernidade (Hipermodernidade), em que a pessoa como indivíduo é sua própria legisladora e juíza, estabelecendo para si o que é o certo e o que é errado e a si mesma julga se está certa, sem depender de outros e do mundo. O indivíduo conquistou o triunfo, o trono de ser o centro da sua própria vida”, diz.

Rega observa que, na narrativa da criação (Gênesis 1-2), tudo foi considerado bom pelo Criador, mas não era bom que o ser humano vivesse sozinho, nem que fosse apenas de uma só natureza. Assim, “temos o primeiro casal apontando para a dupla percepção da vida – masculina e feminina, como partícipes na ambientação da primeira célula social matriz, o lar”, cita.

Segundo o pastor, essa associação, com os dois sendo uma só célula, vivendo colegiadamente (Gênesis 2.18-26), foi modelada para dar condições funcionais equilibradas ao prosseguimento da vida. “Com a rebelião (Gênesis 3), o ser humano se distanciou do plano matriz da criação e passou a desenhar a vida por seu próprio modo, como resultado da dureza de seu coração (Mateus 19.3-12)”, prega Lourenço.

Como consequência, diz ele, o matrimônio, a família e a dinâmica social ficaram disfuncionais. Cada pessoa, em sua individualidade, deixa de lado a alteridade, para impor os próprios desejos e paixões.

“Isso significa que o indivíduo não segue quaisquer padrões ou referenciais, não existe mais estabilidade no que seja certo e errado”, analisa e acrescenta: ”A verdade passou a ser individual e, ao mesmo tempo, plural, para que todos possam fazer o que bem quiserem, o que seus sentimentos, intuições e paixões desejam. Vive-se uma liberdade ampla, total e irrestrita, sem reservas, sem limites”, conclui Lourenço Stelio Rega.

Fonte: Comunhão

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