A obrigatoriedade da disciplina de ensino religioso nas escolas da rede pública vai ser discutida hoje no seminário Ensino Religioso e Direito à Educação no Brasil, em São Paulo. Para a Organização Não Governamental Ação Educativa, a imposição é um equívoco em um país como o Brasil, um Estado laico. A ONG apresenta no seminário um estudo sobre os problemas dessa contradição.

O estudo faz parte do Projeto Direito Humano à Educação, Ensino Religioso e Estado Laico, realizado em 26 estados, e tem como objetivo a promoção de avanços na formulação e discussão sobre o ensino religioso. Segundo Salomão Ximenes, advogado da ONG, a intenção é discutir como deve ser regulamentada a oferta do ensino religioso. De acordo com a Lei de Diretrizes e Bases (LDB) da Educação, de 1996, os municípios e estados são responsáveis por determinar as normas do ensino religioso nas suas redes de ensino.

Ximenes explica que o ideal seria não haver a obrigatoriedade, que é determinada pela Constituição Federal de 1988, mas que diante da realidade o conteúdo das aulas deveria ser trabalhado sobre a perspectiva supraconfessional, que tem abordagem de natureza científica ao invés de se basear em doutrinas de determinadas religiões. “O Paraná é um estado que está indo nesse sentido, tem a preocupação de trabalhar com conhecimentos científicos. A perspectiva supraconfessional é a que se aproxima mais do princípio da laicidade”, afirma.

A Constituição de 88 também garante ao aluno a opção de freqüentar ou não as aulas. De acordo com o coordenador pedagógico da disciplina de Ensino Religioso do departamento de Educação Básica da Secretaria Estadual de Educação, Eloi Correa, não há reclamações sobre a oferta da disciplina por parte dos pais dos alunos e nem mesmo por parte dos próprios alunos: “Essa não é uma disciplina que seja objeto de aprovação, há a freqüência, mas não há uma avaliação que reprove, os alunos fazem atividades e participam independentemente de notas”. Segundo ele, a escola pública tem o dever de ensinar para que os alunos conheçam e aprendam a respeitar as diferenças. “O fenômeno religioso faz parte da formação básica da pessoa e por isso é dever do Estado oferecer. Não dá para entender as culturas em sua totalidade sem abordar a questão do sagrado e o papel das religiões da formação social, política e econômica de cada cultura”, justifica.

Nas 173 escolas municipais de Curitiba, o ensino religioso é oferecido aos alunos do 1º ao 5º ano do ensino fundamental e em três delas a disciplina é ensinada até a 8ª série. De acordo com a pedagoga e gerente de currículo da Secretaria Municipal de Educação, Maria José Giongo, são raros os casos em que os pais deixam de matricular seus filhos na disciplina. “Nós deixamos bem claro que não se trata de proselitismo e sim de trabalhar características de todas as religiões”. Ela conta que os professores são permanentemente capacitados com diversos cursos ao longo do ano, para que estejam aptos a lecionar a disciplina.

De acordo com Cesar Kusma, diretor do curso de Teologia da PUC-PR e doutorando em Teologia, o ensino religioso é bem-vindo nas escola quando “fortalece o diálogo e o respeito, abordando o fenômeno religioso que surge no ser humano e na sociedade e a maneira como são concebidas as dimensões do sagrado”, afirma. Para ele, a disciplina é válida se não for confessional, focada em uma única doutrina religiosa, e se contribuir para a formação do cidadão e para o bem da sociedade.

Nas particulares, aulas mudaram

Apesar de não serem obrigadas a ofertar a disciplina aos seus alunos, são muitas as escolas particulares que têm aulas de Ensino Religioso. Segundo Ademar Batista Pereira, diretor do Sindicato das Escolas Particulares do Paraná (Sinepe-PR), a oferta da disciplina depende da proposta pedagógica de cada uma. “Tem escolas confessionais, que seguem uma religião e tem outras que trabalham valores e alguns aspectos religiosos gerais dentro da filosofia”, conta.

O colégio franciscano Bom Jesus, que é administrado por princípios cristãos, passou por uma reformulação no ensino religioso no ano de 2000. “Antes a matéria era catequese, que agora é ofertada no contraturno aos interessados”, conta a coordenadora de Ensino Religioso, Rita de Cássia Marques Kleinke. “Trabalhamos com a coleção Redescobrindo o Universo Religioso, que foi premiada pela Unesco e é utilizada em diversas escolas de todo o Brasil. Nós buscamos o diálogo inter-religioso e não pretendemos doutrinar ninguém”, afirma. Segundo ela, o colégio, apesar de ser franciscano, tem alunos das mais diferentes religiões. “Todos aprendem a conviver com as diferenças e a respeitar uns aos outros”, conta.

Regras

A deliberação do Conselho Estadual de Educação nº 01/06, de 10 de fevereiro de 2006, determina que os conteúdos do Ensino Religioso devem atender:

A concepção interdisciplinar do conhecimento.

A contextualização, considerando a relação entre informação e realidade.

A convivência solidária, o respeito às diferenças e o compromisso moral e ético.

O reconhecimento de que o fenômeno religioso é um dado da cultura e da identidade de um grupo social, cujo conhecimento deve promover o sentido da tolerância e do convívio respeitoso com o diferente.

O ensino religioso deve ser articulado com os demais aspectos da cidadania.

Fonte: Gazeta do Povo

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