O padre Vincenzo Federico normalmente reza com os fiéis quando os tempos são difíceis. Com a Itália se enterrando cada vez mais na crise econômica, o padre católico está se tornando um conselheiro financeiro, ao invés de espiritual.
Depois de ter sido fiador de um empréstimos de 10 mil euros (US$ 12,7 mil) para uma família de quatro pessoas este ano, ele passa as manhãs recebendo, sem interrupção, fiéis em busca de ajuda semelhante.”Hoje em dia, estou me sentindo como um banqueiro”, disse Federico, 40, por telefone, de sua aldeia medieval de Padula, no Sul da Itália. “Em 15 anos de sacerdócio, nunca pensei que eu acabaria fazendo isso.”
Em um momento em que a Itália, o país mais endividado da Europa, enfrenta a sua pior recessão desde 1975, a igreja está intervindo para ajudar os italianos com problemas financeiros, que recebem os mais baixos seguros-desemprego entre os 30 integrantes da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE). Os desempregados recebem, no máximo, 40% de seus salários anteriores, até o limite de mil euros por mês, por um período não superior a seis meses. Em comparação, na França, os benefícios duram quase dois anos e são de, no mínimo, 57% do último salário da pessoa.
A menor das 325 dioceses da Itália separou um mínimo de 15 mil euros para fiar empréstimos bancários para os paroquianos. A arquidiocese de Milão, a segunda maior cidade do país, criou um fundo que já tem 3,2 milhões de euros, para o qual as pessoas podem contribuir pela internet.
A Conferência de Bispos Italianos vai se reunir em Roma de 23 a 26 de março para se comprometer a fornecer mais dinheiro, segundo Andrea La Regina, chefe de projetos sociais da Caritas, uma organização de caridade sediada na capital. “Estamos pondo mais dinheiro no cofrinho para atender à demanda das famílias que, até poucos meses atrás, nem sonhariam em pedir ajuda”, disse La Regina. “O Estado não está fazendo o que deveria para proteger (as pessoas) dos efeitos do desemprego.”
A taxa de desemprego da Itália cresceu para 6,9% no quarto trimestre, o nível mais alto em mais de dois anos, informou o Instituto Nacional de Estatística (Istat). A demanda por seguro-desemprego disparou 46% nos primeiros dois meses de 2009 em relação ao mesmo período de 2008, disse esta semana o Instituto Nacional de Previdência Social (INPS) italiano.
A Caritas serve de intermediária entre as paróquias e o Banca Etica, instituição de crédito criada há dez anos em Pádua, cidade a oeste de Veneza, por um grupo de organizações sem fins lucrativos.
Para obter crédito, os católicos precisam primeiro apresentar o seu problema para o padre de sua paróquia, que encaminha a petição para um conselho de três membros da seção local da Caritas. Se a instituição e o Banca Etica decidirem que se justifica um empréstimo, a igreja entra como fiadora. O Banca Etica cobra atualmente juros de 3% ao ano. Em comparação, o segundo maior banco da Itália, o Intesa Sanpaolo, cobra entre 8,9% e 9,3% por um empréstimo pessoal.
A economia italiana, que movimenta US$ 1,8 trilhão, deverá contrair 2,6% este ano, a maior queda em três décadas, depois de encolher 1% em 2008, disse em 4 de março o vice-diretor-geral do Banco da Itália (BC), Ignazio Visco.
Os italianos, então, estão se voltando para Deus. “A nossa porta está sempre aberta”, disse o padre Matteo Zuppi, que organiza a distribuição de sopa e de outros alimentos para os pobres, idosos e desabrigados de Roma, para a Comunidade de Sant’Egidio.
O Papa Bento XVI disse em outubro que a crise econômica mostra que o dinheiro “é nada”, mas o padre Federico admite que a falta de dinheiro é tudo em que os seus paroquianos de Padula pensam. “Eles me ligam o tempo todo, até tarde da noite, no meu celular”, disse ele. “Eles não têm mais ninguém.”
Fonte: Gazeta Mercantil