Papa Bento XVIAs desculpas, esclarecimentos e explicações do Papa Bento XVI por conta de sua declaração sobre o Islã, que desataram a ira do mundo muçulmano, acabaram mostrando esta semana o lado mais frágil do pontífice alemão.

Nunca na história recente da Igreja católica um Papa teve de esclarecer repetidas vezes suas palavras, como ocorreu esta semana com Bento XVI, acusado de ter ofendido a sensibilidade do mundo muçulmano.

“Infelizmente minhas palavras foram mal interpretadas”, afirmou o Papa diante dos milhares de fiéis que se reuniram na quarta-feira na praça São Pedro do Vaticano, em sua segunda tentativa, em três dias, de apaziguar as tensões com os islâmicos. Acostumado a se dirigir a um público especializado e preparado como o que assistiu à sua conferência na Universidade alemã de Ratisbona sobre a relação entre razão, fé e violência, Bento XVI, de 79 anos, excelente teólogo e conhecedor da história das religiões, pronunciou uma conferência cheia de citações, referências históricas e diálogos entre eruditos.

Mas seu estilo professoral, frio e racional chocou-se com as exigências do mundo moderno, onde imperam os princípios da geopolítica e da diplomacia.

“Teve muita coragem de intervir pessoalmente para apaziguar o clima com os islâmicos”, reconheceu à AFP o vaticanista Giancarlo Zizola, autor de vários livros sobre a Igreja.

“Mas cometeu um grande erro, porque não percebeu que agora não é apenas um teólogo, mas o Papa. Se essas duas funções forem confundidas, cria-se um curto-circuito”, estimou o especialista.

“O que um Papa diz vale mais do que uma fala de um professor”, comentou o vaticanista do jornal La Repubblica Marco Politi, que considera que, de alguma maneira, Bento XVI rompeu com o estilo direto e claro de seu predecessor João Paulo II.

Ao contrário do falecido pontífice polonês, que pediu uma centena de vezes perdão pelos erros cometidos pela Igreja em sua milenar história, desde a condenação de Galileu até o extermínio dos índios na América Latina, Bento XVI teve que pedir desculpas por um erro pessoal.

“A desavença com os islamitas não foi acidental e demonstra que existem graves problemas de comunicação no Vaticano. O Papa deve cercar-se de conselheiros mais capazes e não de simples ‘yes, man’. Bento XVI deve sair de sua solidão acadêmica”, acrescentou Zizola.

Apesar de Bento XVI ter “lamentado” publicamente as reações provocadas por suas declarações, o chefe da Igreja católica não chegou a se retratar, o que é importante para alguns teólogos. “O que ele disse como teólogo sobre o Islã também é discutível. Não é verdade que essa religião esteja baseada na irracionalidade. Isso é o mais grave”, comentou Zizola, que além de jornalista é historiador e teólogo.

“Por que o Papa entrou no debate sobre a interpretação do Corão e ignora que o Islã é a base da ciência moderna, que existiu um Iluminismo islâmico antes do europeu?”, perguntou o estudioso.

Apesar das críticas, muitos acreditam que o primeiro Papa alemão da era moderna pode superar a grave crise se abandonar sua atitude intelectual e, com humildade, escutar os demais.

“Só assim alcançará o autêntico diálogo com as outras religiões”, destacou Zizola.

“Diálogo, diálogo, diálogo”, repete em todas as entrevistas o cardeal Tarcisio Bertone, novo secretário de Estado do Vaticano, mostrando a linha prioritária da Igreja.

Esse espírito de diálogo será testado no final de novembro, quando o Papa deve visitar a Turquia, país onde o número de muçulmanos aumenta constantemente.

Fonte: AFP

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