O tribunal religioso recém-criado da radical Mesquita Vermelha de Islamabad exigiu que o Governo paquistanês destitua a ministra do Turismo, Nilofar Bakhtiar, por abraçar seu treinador francês de parapente.
A corte islâmica considerou “obscena” a atitude da ministra. No sábado, uma foto de Bakhtiar abraçando seu treinador foi publicada nos jornais paquistaneses.
No dia seguinte, a corte do país emitiu uma “fatwa” (decreto religioso) pedindo que Bakhtiar fosse punida, segundo a edição de hoje do jornal paquistanês “Daily Times”.
Segundo o responsável da Mesquita Vermelha, Abdul Aziz, a intervenção do tribunal foi requisitada por um morador de Islamabad, que queria conhecer a “visão islâmica” sobre o assunto depois de ver as fotos da ministra, tiradas após Bakhtiar ter participado de um espetáculo de parapente em Paris.
Em sua decisão, o tribunal citou versículos do Corão e máximas do profeta Maomé sobre o papel da mulher na sociedade e a importância de usar o véu. A corte concluiu que o Islã “impõe às muçulmanas que evitem deixar suas casas sem necessidade”.
O decreto do tribunal recomenda ainda que as mulheres não “realizem atividades reprováveis”.
Por rejeitarem a política do Governo do Paquistão de moderação religiosa, os líderes da mesquita radical criaram o tribunal com o objetivo de “islamizar” a sociedade do país e ameaçaram cometer ataques suicidas caso o Governo tome medidas contra a corte.
“Nossos jovens farão ataques suicidas em todo o Paquistão se o regime do presidente (Pervez) Musharraf impedir o cumprimento das leis islâmicas”, alertou o responsável da Mesquita Vermelha em seu sermão de sexta-feira.
O sistema judiciário paralelo anunciado na sexta-feira por Aziz é formado por uma corte de dez muftis (intérpretes da “sharia”, a lei islâmica) que se pronunciam sobre as disputas seguindo “os mandamentos islâmicos”.
Não é a primeira vez que os radicais formam seu próprio tribunal independente dos oficiais, já que este sistema existe em locais como Malakand, na região tribal próxima à fronteira com o Afeganistão, onde a corte foi criada pelo líder pró-talibã Mufti Mohammed.
No entanto, é a primeira vez que um tribunal é estabelecido na capital federal do Paquistão, em um claro desafio à autoridade de Musharraf, defensor do Islã moderado.
Nos últimos anos, a Mesquita Vermelha foi palco de vários protestos e reuniões de extremistas, como na campanha pró-talibã lançada pelos radicais que teve como estopim a invasão dos Estados Unidos ao Afeganistão, realizada após os atentados de 11 de setembro de 2001.
Este ano, os líderes da mesquita desafiaram o Governo em mais de uma ocasião. Em março, por exemplo, estudantes de um madraçal, encorajados pelos clérigos, seqüestraram por vários dias três mulheres que administravam um bordel em Islamabad para pôr fim às suas “atividades imorais”.
Em nome do Governo, a vice-ministra de Saúde do Paquistão, Shahnaz Sheikh, disse ao jornal paquistanês “Dawn” que o tribunal criado pelos radicais não tem autoridade para emitir decretos contra ninguém, pois “estas pessoas fazem uma interpretação errada do Islã”.
“Condenamos energicamente estes acontecimentos”, acrescentou.
A oposição paquistanesa também criticou a atividade do tribunal, que, nas palavras do secretário do Partido do Povo do Paquistão, Sherry Rehman, só faz “chantagem”.
A líder do partido, Benazir Bhutto, que está no exílio, já teve a oportunidade de ver como os clérigos atuam, já que declararam “antiislâmica” sua ascensão ao poder, interpretando que o Islã não concede às mulheres qualquer papel que não seja o lar.
Fonte: EFE