As igrejas devem somar sua voz, junto às da sociedade civil, no processo de fortalecimento da bioética e enfatizar que a dignidade da vida humana não é propriedade nem conquista, mas dádiva de Deus.

A admoestação consta no pronunciamento “O cuidado pela vida”, emitido no final de abril pela Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil (IECLB). O documento foi proposto pelo grupo assessor de Teologia e Confessionalidade, submetido aos pastores sinodais e aprovado pela presidência da igreja.

A vida é um bem sagrado, que tem uma profundidade insondável. Bem por isso, ela não pode ser transformada em coisa ou objeto que possa ser manipulado, vendido ou comprado. Uma certa “lógica comercial transformou os seres vivos e o próprio ser humano em objeto, cujo valor é regulado pela oferta e pela procura do mercado”, apontam os luteranos.

O documento afirma que o prazer de viver é “o imperativo categórico” da sociedade de consumo e o sofrimento é considerado uma condição inaceitável. “É precisamente esta idéia de que podemos comprar felicidade ao comprar bens de consumo que é profundamente predatória, destruidora do meio ambiente”, alerta.

Ao trazer fatos para pensar, os luteranos destacam que existe hoje a possibilidade de reprodução da vida em laboratório, sendo possível, agora, fecundar o óvulo sem a presença do homem. Pais lançam mão da reprodução assistida. “A noção de procriação é substituída pela prática da re-produção, como sendo um processo industrial”, arrola o posicionamento.

Empresas transformam-se em proprietárias de linhagens genéticas de pessoas, animais e plantas, através da biopirataria, e cientistas alertam que novas doenças estão sendo definidas ou exageradas por especialistas, muitas vezes financiadas pelos próprios laboratórios. “A ganância é uma força poderosa que move a indústria farmacológica”, avaliam os luteranos.

Embora reconhecendo que a ciência promoveu avanços para a humanidade, e que muitas conquistas científicas devem-se aos conhecimentos acumulados pela biologia e pela medicina, o documento chama a atenção e adverte que a possibilidade de manipulação genética, vinculada à exploração comercial de seres vivos, sinaliza para uma relação perversa entre ciência, comércio e criação.

“É necessário, portanto, despertar a consciência de que aquilo que funciona tecnologicamente e é útil para o mercado não é necessariamente justificável sob a perspectiva da ética cristã”, assinalam os luteranos. Eles destacam que os avanços científicos não se constituem em um problema meramente técnico, mas antes de tudo ético.

Sob a ótica evangélica, a vida não é propriedade, como quer o mercado, nem objeto, como pode a ciência supor, mas é dádiva de Deus. E esse deve ser o ponto de partida para o agir responsável. Assim, a igreja tem uma responsabilidade pastoral de acompanhar pessoas que tiveram sua dignidade violada.

As igrejas precisam, pois, informar-se constantemente acerca dos avanços científicos, para que possam promover reflexão teológica a esse respeito e se posicionar, na esfera pública, quanto a propostas de ordenamento legal da pesquisa e dos avanços científicos.

O alcance das ações das igrejas pode ser limitado, mas ainda assim significativo, admite o documento da IECLB, que aponta a bioética como um instrumento em prol da vida.

A bioética, diz o texto, não se preocupa somente com as questões médicas, mas com a sobrevivência do planeta e com o futuro da humanidade. Aborda, bem por isso, temas como a fome, a discriminação racial, o combate à violência e o combate à destruição do planeta.

Bioética é o estudo transdisciplinar entre biologia, medicina e filosofia – dessa última, especialmente as disciplina da ética, da moral e da metafísica. O termo foi construído a partir das palavras gregas bios (vida) e ethos (relativo à ética). Suas diretrizes filosóficas surgiram após a tragédia do holocausto, na II Guerra Mundial, quando o mundo ocidental, chocado com as práticas abusivas de médicos nazistas em nome da ciência, criaram um código para limitar os estudos relacionados.

Fonte: ALC

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