No sábado, como em todos os sábados das últimas semanas, centenas de judeus ultra-ortodoxos se reuniram antes do crepúsculo nos terraços sobre o estacionamento Carta, pouco além das paredes da Cidade Antiga. Em robes de seda preta específicos para o Sabbath e chapéus de pele, eles se enfileiraram e esperaram.

De repente seus soldados rasos chegaram pela rua, manifestantes que surgiram detrás do recém-inaugurado luxuoso Hotel Mamilla. Policiais montados sobre cavalos foram a seu encontro diante do olhar confuso dos hóspedes posicionados nas janelas.

Neste verão, elementos radicais da comunidade ultra-ortodoxa judaica têm se manifestado e revoltado contra autoridades municipais, de bem-estar social e a polícia de Israel. Para o prefeito de Jerusalém, Nir Barkat, um milionário secular do ramo da alta tecnologia que tenta atrair mais negócios, turismo e profissionais para a cidade, o momento é inoportuno.

As tensões nesta concorrida cidade geralmente acontecem na fronteira oriente-ocidente, entre Israel e Palestina. Mas dentro do lado ocidental e predominantemente judeu da cidade, problemas culturais existem entre religiosos e judeus seculares. Qualquer mudança no delicado status quo parece capaz de provocar uma revolta, conforme os judeus mais zelosos e liberais disputam pelo caráter e alma da capital.

“Tudo isso é parte do mosaico humano especial que compõe Jerusalém”, disse Israel Kimhi, diretor do Instituto Jerusalém de Estudos Israelenses, uma organização local de pesquisa independente. Mas o tumulto recente não “favorece a imagem da cidade”, ele acrescentou, enquanto argumentava que uma pequena porém estridente parcela da população ultra-ortodoxa tem se tornado cada vez mais extremista.

Judeus ultra-ortodoxos, conhecidos como haredim, ou aqueles que temem a Deus, partiram para a luta há muitos anos para garantir a observação do sagrado Sabbath judeu e tentam forçar o fechamento de cinemas e estradas.

Do pôr-do-sol de sexta-feira ao pôr-do-sol de sábado, os judeus observantes não trabalham, não usam dispositivos elétricos, gastam dinheiro ou passeiam. Não há nenhum serviço municipal durante o Sabbath em Jerusalém e, no lado judeu, a maioria dos negócios fecha.

Mas depois de uma calmaria de 13 anos no que os moradores locais chamam de a “guerra do Sabbath”, outro rodada teve início em um sábado de junho, quando a Prefeitura decidiu abrir um lote de estacionamento. Com o sistema de segurança em Jerusalém relativamente calmo, turistas e excursionistas têm voltado a visitar a Cidade Antiga nos fins de semana, aumentando a necessidade da abertura de algum lugar para estacionamento.

No começo, o prefeito abriu um lote de estacionamento municipal da Prefeitura. Quando aquilo levou a protestos, ele abriu o particular Carta, sob administração árabe, e gratuito. Os protestos apenas se intensificaram.

Yoelish Kraus, chefe de operações da Eda Haredit, a organização militante ortodoxa por trás dos protestos, disse que o engano do prefeito foi anunciar a abertura do estacionamento em uma coletiva de imprensa. Assim que há sanção pública para a violação do Sabbath, ele disse, “nós temos que lutar.”

Os ultra-ortodoxos compõem cerca de um terço da população judia de Jerusalém e os partidários da Eda Haredit representam apenas uma fração disso. Mas com uma média de 10 crianças por família, segundo Kraus, a comunidade está crescendo rapidamente.

As seitas rabínicas da Eda Haredit são descendentes dos judeus Ortodoxos que estavam na Palestina antes da fundação de Israel em 1948. Na ausência do Messias, eles rejeitam o Sionismo e a legitimidade do Estado judeu fervorosamente.

Os manifestantes chamaram os policiais de “nazistas” e cuspiram neles. Forças especiais jogaram-nos sobre arbustos de lavanda e alecrim ao longo da calçada. Aqueles que tentaram bloquear a estrada foram atingidos com gás de pimenta e levados em um camburão para a prisão.

Um circulo de seculares se manifestava contra os protestos cantando em um ponto de ônibus enquanto os ultra-ortodoxos lançavam garrafas plásticas d’água e pedras contra eles. “O estacionamento continuará aberto porque nós não deixaremos que seja fechado”, disse Nir Pereg, 29, um residente secular da cidade, conforme seus colegas entoavam uma música que dizia “Jerusalém não cairá”.

A Eda Haredit também tem se manifestado a favor de uma mãe que foi presa sob suspeita de fazer seu filho de 3 anos morrer de fome. Seus partidários se revoltaram em bairros ultra-ortodoxos e incendiaram uma agência de bem-estar social onde ela se reuniu com assistentes sociais antes de ser presa.

Protestos violentos tiveram início na noite de domingo depois que a polícia entrou em um bairro ultra-ortodoxo para remover o corpo de uma vítima de assassinato de um albergue. A revolta parecia ter mais relação com um ódio geral pela polícia do que com o assassinato, que não envolveu membros da comunidade ultra-ortodoxa. Pela primeira vez, a polícia usou gás lacrimogêneo e granadas de efeito moral e disparou contra o ar para dispersar as multidões.

A Eda Haredit chamou os policiais de “assassinos”, dizendo depois em um pôster que um jovem estudante de yeshiva havia sido atropelado e estava gravemente ferido por conta da força da “Gestapo sionista”.

A violência foi retomada na terça-feira, quando uma multidão atacou um táxi dirigido por um motorista árabe em um bairro ultra-ortodoxo. O motorista escapou, mas o carro foi danificado.

Fonte: The New York Times

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