Sobreviventes e parentes das vítimas do desabamento do teto da sede internacional da Igreja Renascer em Cristo,em São Paulo, se preparam para mover ações contra a igreja. Entre os fiéis, no entanto, nem todos questionam a igreja.

A família da aposentada Luíza da Silva, de 62 anos, responsabiliza a direção da igreja pela morte da fiel e reclama da pressa para a reconstrução da nova sede. “Eles (dirigentes) vão reconstruir uma igreja nas costas do povo. Não vou deixar barato”, desabafa a operadora de telemarketing Maria José da Silva, de 54 anos, sobrinha da vítima.

Maria afirma que a tia frequentou os cultos da Renascer por 14 anos, recebia um salário mínimo e mantinha doações mensais superiores a R$ 130. “Ela era fervorosa, praticamente uma beata”, lembra a sobrinha. Segundo Maria, desde que o jogador Kaká fez uma doação de 200 mil euros para a igreja no ano passado, Luíza se viu incentivada a lançar um grande desafio em nome da fé: juntar R$ 10 mil para doar à Igreja (além da contribuição mensal). A fiel chegou a economizar R$ 3 mil.

Embora a igreja tenha arcado com as despesas do funeral da tia, Maria diz que, no velório, pastores especularam sobre os bens deixados pela aposentada e chegaram a perguntar se a vítima havia deixado algo para ser doado à Igreja. “Sabiam que ela era sozinha e não tinha filhos nem marido”, disse. Para Maria, os raros contatos com os representantes da Igreja desde a morte da tia eram tentativas de convencer a família a evitar uma ação civil. “Eles queriam que a gente não entrasse com a ação”, afirma.

A ex-professora Olga Donoso, de 59 anos, sobrevivente do desabamento, está decepcionada com a Renascer. Olga, que era amiga de Luíza, é uma das testemunhas do desabamento parcial do teto da Igreja no dia 14 de janeiro, quatro dias antes da tragédia que matou nove e deixou mais de 100 feridos. Pedaços de gesso da estrutura caíram sobre ela e outro fiel, mas só causaram leves escoriações. Ela diz que o incidente aconteceu durante um culto liderado pelo deputado federal Geraldo Tenuta Filho, conhecido como bispo Gê. Segundo Olga, no dia seguinte um advogado da igreja ligou para saber sobre seu estado de saúde. “Achei estranho o advogado ligar”, comentou.

No domingo (18 de janeiro), ao entrar na sede, Olga percebeu que a parte que cedeu dias antes não havia sido consertada. “Ninguém tinha feito nada, o buraco no teto ainda estava lá. Pensei comigo: será que tem perigo de cair?”, conta. Vítima pela segunda vez, Olga teve traumatismo craniano, luxação no pé direito e o pé esquerdo teve de ser totalmente reconstruído. Ela segue em recuperação, numa cadeira de rodas, sem previsão de voltar a andar.

Empresa

De acordo com a ex-professora, a igreja ofereceu ajuda de uma psicóloga para seu filho (que se revoltou depois que um pastor teria se negado a testemunhar sobre o primeiro acidente) e alguém para auxiliá-la nos afazeres domésticos. A família ainda tentou pedir ajuda financeira à igreja, mas como havia uma grande fila no local anunciado e muitos tiveram seus pedidos negados, conta Olga, a família preferiu entrar com uma ação judicial e só aguarda o término do inquérito para oficializar o processo. “A Renascer é uma empresa e vai responder como empresa”, afirma.

Após mais de 10 anos frequentando os cultos da Renascer, Olga se sente desgostosa com a igreja. Para ela, houve negligência e imprudência. “Eles não poderiam ter falhado nessa parte. Eles ganham dinheiro, damos sempre dízimos para suprir as necessidades da igreja. Deveriam cuidar da nossa segurança dentro da igreja porque nunca falhamos com eles”, reclamou.

Entre os fiéis, no entanto, nem todos questionam a igreja. A dona de casa Elisete Cunha, de 50 anos, uma das sobreviventes do desabamento, voltou a frequentar os cultos, promovidos agora em um local próximo da estação Bresser do Metrô. “Estamos chateados pela perda do templo, das pessoas, não com o pessoal da igreja. Para mim foi uma fatalidade”, diz.

Membro da Igreja há cinco anos, ela não cogita mover ação contra a Renascer e já aderiu à campanha para construção da nova sede. “O templo era minha casa. Se a sua casa caísse, você não reconstruiria?”, questiona. Elisete não quis revelar o valor de sua doação, mas está ansiosa para ver o novo templo. “O quanto antes (reconstruir), melhor.”

Fonte: Agência Estado

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