O número de abortos legais na rede pública cresceu 242,6% nos últimos oito anos. A informação foi obtida pelo GLOBO junto ao Ministério da Saúde. Em 2000, 930 mulheres e 16 crianças procuraram o serviço público para interromper legalmente a gravidez, enquanto que no ano passado foram registrados 3.241 procedimentos no país.
De acordo com a legislação brasileira, o aborto é legal nos casos de estupro e risco de vida para a mãe. Na maior parte dos casos atendidos, a gravidez resulta de estupro. É o que mostra reportagem de Tatiana Farah na edição deste domingo do GLOBO.
O caso da menina de Pernambuco que abortou de gêmeos depois de ser sistematicamente abusada pelo padrasto não é exceção. Ano passado, 49 crianças de até 14 anos fizeram aborto com amparo legal no país. Entre 2000 e 2007, foram 176 casos de abortamento legal de crianças. Em 2005, duas morreram em tentativas frustradas de aborto clandestino.
Meninas de até 12 anos representam 43% dos casos atendidos pelo Serviço de Violência Sexual do Hospital Pérola Byington, de São Paulo, referência no país. Segundo o coordenador do serviço, o ginecologista Jéferson Drezett, o agressor geralmente é parente ou conhecido, e leva bastante tempo para o caso vir à tona. Chefiando o setor há 15 anos, o médico traça o perfil de abusadores, muitas vezes os próprios pais e padrastos.
Segundo a a coordenadora de Saúde da Mulher do Ministério da Saúde, Lena Peres, no ano passado o serviço de atendimento telefônico a mulheres vítimas de violência, o 180, teve aumento de 31% na demanda sobre o aborto legal.
O aborto é, segundo o Ministério da Saúde, a segunda causa de mortalidade materna no país. Para cada um dos 236 mil casos de aborto clandestino que acabaram nos hospitais públicos no ano passado, estima-se que há quatro clandestinos não notificados. Quem tem dinheiro paga até R$ 5 mil. Quem não tem usa chás e agulha de crochê. O remédio mais popular custa R$ 200. A mortalidade materna por aborto cresceu 5,7% entre 2000 e 2006, quando foram registradas 92 mortes, alerta Drezett:
– No Brasil, morre uma mulher por aborto dia sim, dia não. É muito grave. Agora, estamos tendo de enfrentar a maternidade infantil, com a mortalidade de 15 crianças por ano no parto.
‘O Estado tem feito uma política de aborto’
Assessor da Comissão Vida e Família da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), o padre Luiz Antônio Bento diz que o governo tem feito uma política pró-aborto. Critica o ministro da Saúde, José Gomes Temporão, e o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, por ter distribuído camisinhas no carnaval.
– A Igreja Católica é contrária a qualquer forma de agressão à vida. A missão da medicina é salvar vidas, não matar. Hoje são os anencéfalos, amanhã poderá ser os que têm Síndrome de Down.
E concluiu:
– Muitas mulheres fazem o aborto em clínicas. O ministro Temporão já disse que sabe quantas clínicas existem. Deveria denunciar. O aborto no Brasil só não está legalizado oficialmente, mas o Estado tem feito uma política de aborto e de amparo às que querem abortar. Se tem um que é fã de que crianças sejam assassinadas no ventre da mãe é o ministro Temporão. Ele é o grande incentivador de uma cultura de morte. Legalizando o aborto, as pobres vão continuar fazendo clandestinamente. Não é verdade que legalizar vai beneficiar os pobres.
Para Temporão, é dever do governo buscar soluções adequadas para os óbitos e internações anuais resultantes de abortos ilegais praticados no país:
– O aborto é responsável por 15% da mortalidade materna no país. Não há dúvida de que se trata de um grave problema de saúde pública e o seu amplo debate é indispensável técnica, ética e politicamente .
O ministro afirmou que é democrático que o Sistema Único de Saúde (SUS) garanta o acesso da população à informação e aos métodos contraceptivos. Sobre as declarações do padre Luiz Antônio Bento, que o acusou de estimular a política de aborto no país, respondeu:
– Lamento o conteúdo do pronunciamento do representante da Igreja Católica e reitero o compromisso do governo em garantir a plena implementação da Política Nacional de Direitos Sexuais e Reprodutivos.
Fonte: O Globo Online