As dificuldades enfrentadas na prática pedagógica, destacando as relações professor-aluno, motivaram este comentário. A proposta é fazer uma reflexão de como a psicologia e a psicanálise podem ser aplicáveis no processo de ensino-aprendizagem por meio da relação transferencial.
Os recursos oferecidos pela psicanálise podem viabilizar o processo de ensino-aprendizagem, porém, é relevante que, ao assumir o contexto pedagógico no ofício de aprender e ensinar, o professor precisa ser mais que um mero transmissor de conhecimento.
Nas contribuições de Freud acerca do processo de educar, percebeu-se que pela trajetória da inibição, da intimidação excessiva nas suas primeiras relações, a criança pode recalcar o desejo de saber e manifestar de forma consciente ou inconsciente ao entrar em contato com a presença do professor. O fenômeno transferencial pode viabilizar a aprendizagem, quando ocorre de forma adequada, do contrário, se o professor não consegue traduzir o conteúdo transferencial e devolvê-lo ao aluno, um conflito muito maior pode se instalar subjetivamente comprometendo a vida acadêmica da criança e outras esferas da sua vida.
Podemos entender a transferência como o deslocamento do sentido atribuído a uma ou mais pessoas do passado para as pessoas do nosso presente. A transferência é inconsciente, e é essencial para o processo de cura. A relação transferencial acontece quando no outro tem o que lhe falta e pode ocorrer na relação pai/filho, analista/analisando, mestre/discípulo, professor/aluno, quando o desejo irá se apresentar atualizado, com uma repetição dos modelos infantis. Figuras parentais e os substitutos das figuras parentais serão transpostas e assim desejos e sentimentos que têm relação com os primeiros vínculos afetivos serão sentidos e vivenciados no momento presente.
Foi pontuado que a transferência, assim como na psicanálise (na relação paciente/ terapeuta) quando bem manejada pode viabilizar o ensino-aprendizagem por meio da relação de empatia e confiança que se estabelece com os seus atores (professor/aluno), todavia, é o professor que precisa estar apto para executar esse manejo.
Por vezes, Freud [1932] (1996) referiu-se à educação com críticas, por ser a produtora das neuroses.
Compreendeu-se que o procedimento de educar a criança é em outras palavras o caminho pelo qual a criança vai inibir seus desejos, e usufruir apenas daquilo que é permitido no que a psicanálise denominou de princípio da realidade que tem como função inibir o princípio do prazer que é o que move a criança antes de ser “educado”. Neste instante, a forma como esse processo é realizado prediz se o seu processo de aprendizagem vai estar comprometido (por meio da inibição) ou não. Desse modo, ao conhecer cada aluno, o professor terá maior probabilidade de conduzir as dificuldades e transformá-las em favor da relação professor/aluno.
Nota-se uma necessidade de reflexão acerca dos autores que compõem o cenário pedagógico, como experimentar outras vertentes, tendo em mente que nem sempre um detentor de conhecimento didático significa muita coisa, pois, se este que detém o saber não sabe como transferir à criança que está nesta cena como ser desejante, o objetivo não será alcançado. A proposta de um diálogo interdisciplinar entre psicanálise e educação é de grande importância, tendo em vista que o papel do psicólogo na escola é ser um agente de mudanças, promovendo a reflexão e a transformação, favorecendo a conscientização do corpo docente e discente.
Como disse Carl Jung: “Até você se tornar consciente, o inconsciente irá dirigir sua vida e você vai chamá-lo de destino.”
Helena Chiappetta