Natal conforme a nata de cada alma

Paulo disse que não era mais para se guardar festas religiosas como se elas carregassem virtude em si mesmas.

Assim, as datas são apenas datas, e as mais significativas são aquelas que se fizeram história, memória e ninho em nós.

Ora, o mesmo se pode dizer do Natal, o qual, na “Cristandade”, celebra o “nascimento de Jesus”, ou, numa linguagem mais “teológica”, a Encarnação.

No entanto, aqui há que se estabelecer algumas diferenciações fundamentais:

1. Que Jesus não nasceu no Natal, em dezembro, mas muito provavelmente em outubro.

2. Que o Natal é uma herança de natureza cultural, instituída já no quarto século. De fato, o Natal da Cristandade, que cai em dezembro, é mais uma criação de natureza constantiniana, e, antes disso, nunca foi objeto de qualquer que tenha sido a “festividade” da comunidade dos discípulos originais.

3. Que a Encarnação, que é o verdadeiro natal, não é uma data universal — embora Jesus possa ter nascido em outubro —, mas sim um acontecimento existencial que tem seu inicio em nós quando cremos que Deus estava em Cristo, e se renova em nós cada vez que vivemos no amor de Deus, confiantes na Graça da Encarnação e na Encarnação da Graça: Jesus, o Emanuel.

4. Que embora o Natal da Cristandade não seja nada além de uma celebração religiosa e sincrética, nem por isso ele faz mal a quem o celebra como quem come o pão e bebe o vinho do Amor de Deus em Sua Encarnação. Isso porque, como qualquer outra coisa, o que empresta sentido às coisas não são as coisas em si mesmas, mas o olhar de quem nelas projeta, simbolicamente, o seu próprio coração.

Assim, que cada um tenha o Natal que em si mesmo tiver sido gerado!

O meu é todo dia, pois, a cada dia vivo apenas porque creio que Deus estava em Cristo reconciliando consigo mesmo o mundo.

Do contrário, para mim não haveria natal, posto que um homem como eu já não encontra ilusões viáveis como paliativo e auto-engano para a existência.

Por isso digo: sem o meu natal de fé em Cristo, sobraria apenas o meu funeral de tristeza.

Há quem faça um natalzinho existencialmente do tipo “Casas Bahia”.

Há quem o torne algo tão “exato” que não o celebrar é como não comparecer ao “Aniversário de Jesus”.

Há quem não o celebre por julgá-lo uma festa pagã.

E há também quem o denuncie de modo estapafúrdio, como um certo “apóstolo” que, desejando “teologizar” — coisa, para ele, mais difícil do que boi voar —, disse que a Encarnação não é para ser celebrada, mas apenas a Ceia do Senhor. E concluiu que quem celebra a Encarnação celebra o Primeiro Dia em vez de celebrar o Sétimo. Assim, conclui ele, tal pessoa voltou atrás. E isso tudo sem lembrar que João diz que todo espírito que não confessa a Encarnação não procede de Deus, pois é espírito do anticristo, o qual já está no mundo, e, segundo João, “procede do meio de nós”.

Sem Encarnação, Aquele que morreu e ressuscitou não poderia dizer: “Vede! Um espírito não tem carnes nem ossos, como vedes que eu tenho!”

Sem começo, não há fim. Portanto, tratando-se de Deus, Alfa e Ômega são a mesma coisa, pois Aquele que é é, e nEle não se pode m separar eventos que salvam e eventos que não salvam. E isso por uma única razão: Quem salva é Ele, e não pedaços dEle!

Portanto, como todos os dias, celebre seu natal com a gratidão dos filhos da Graça que se encarnou como manifestação de uma reconciliação que já estava feita antes de acontecer na História, visto que o Cordeiro de Deus já havia sido imolado desde antes da fundação do mundo.

Portanto, não há nada tão final quanto o próprio começo de tudo!

NEle,

Caio

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