“V”… de que mesmo?

Uma máscara branca com bigode, cavanhaque e um sorriso enigmático se tornou um dos símbolos das atuais e frequentes manifestações que ocorrem Brasil à fora. A tal mascara pode ser vista em quase todas as cidades e até mesmo em vídeos anônimos postados no Youtube. Nem todos sabem, porém, sua origem e significado.

A chamada “mascara de Guy Fawkes” é associada a um ativista católico do século XVII que em 1605 idealizou um plano para explodir o parlamento Britânico, a “Casa dos Lordes”, mais especificamente. Fawkes tentou restaurar a monarquia católica na Grã-Bretanha, com o que ficou conhecido como “Gunpowder Plot” (Conspiração Pólvora). O plano não deu certo, Fawkes foi capturado, torturado e condenado à morte; pouco antes de ser enforcado, se jogou do cadafalso e quebrou o pescoço.

Assim, todo 5 de novembro (dia em que Fawkes foi capturado), na chamada “Noite de Guy Fawkes” , crianças costumam sair à rua usando mascaras para fazer fogueiras e queimar imagens do dito cujo, algo como a nossa “malhação de Judas”.

No inicio dos anos 80, o escritor de estórias em quadrinhos Alan Moore publicou uma série de “graphic novels” ambientada na Inglaterra em um futuro próximo, onde após uma guerra nuclear, o país passa a ser comandado por um regime totalitário. Nesse contexto, surge o personagem chamado simplesmente de “V”, que usando sempre uma [img align=left width=200]http://4.bp.blogspot.com/-OcrBR5xXwA4/T4S0iMLjADI/AAAAAAAAFn0/L3pP43qPkkE/s400/416912160_233.jpg[/img]mascara de Guy Fawkes, luta de todas as formas contra o regime. A série de quadrinhos fez um relativo sucesso e ajudou a tornar Alan Moore um ícone do gênero, mas ficou restrita a um público limitado e segmentado.

Em 2005 O filme “V de Vingança” (“V for Vendetta”) foi levado às telas de cinema, pelas mãos dos irmãos Wachowski, tendo um elenco de primeira linha que contava com Natalie Portman (“Star Wars I, II, e III”, “O Cisne Negro”), Hugo Weaving ( “Matrix”, “O Senhor dos Anéis”) e John Hurt ( “Alien”, “1984”), entre outros. Foi aí que a mascara de Guy Fawkes ganhou projeção internacional e começou a ser utilizada em manifestações mundo à fora.

No filme, considerado pelos aficionados por quadrinhos, como uma das adaptações mais fieis ao original, “V” usa a mascara para esconder suas cicatrizes de tortura e experiências científicas perpetradas pelo regime totalitário. Depois de passar o filme inteiro lutando sozinho contra o sistema, “V” termina por mobilizar a população inteira. Em uma cena memorável no final do filme onde todos aparecem usando a mesma máscara,“V” afirma que “o povo jamais deveria ter medo do governo; o governo é que deveria ter medo do povo”.

Essa cena emblemática ajudou a mascara de Guy Fawkes a conquistar a simpatia de manifestantes em todos os rincões do planeta. Mas, a verdade é que poucos sabem maiores detalhes sobre sua origem. E menos ainda conhecem a historia de Guy Fawkes e o contexto de sua luta.

Não sei se nem Guy Fawkes, nem o “V” do filme deveriam ser referência para esses manifestos que estão ocorrendo no Brasil. Ambos se encaixariam mais na definição de terroristas. Não dá muito pra ter como modelo alguém que quer sair por aí explodindo tudo e matando gente à rodo. E não interessa se a causa é justa ou não. Além disso, por que usar mascara? Esse é o momento de mostrar a cara, de assumir nossa identidade, de tomar as rédeas do nosso destino, mostrar quem somos, o que queremos.

Nessas manifestações, os que não quiseram mostrar seus rostos, foram justamente os arruaceiros, baderneiros que depredaram o patrimônio público e pilharam lojas. Isso sem falar que “vingança” é um sentimento nada nobre, totalmente anti-cristão. Mudanças sociais têm que ser motivadas por consciência política, cidadania e reflexão.

O povo brasileiro tem uma grande chance de promover mudanças fundamentais em nossa sociedade, com todos esses protestos e com essa mobilização incrível que vem acontecendo nos últimos dias. Eu só espero que essas manifestações possam de fato trazer algo de concreto para nossa sociedade, tão carente de referências políticas e de gente honesta no poder. Mas, o povo precisa entender que participação política, cidadania é algo que se cultiva no dia-a-dia, e não apenas em eventos extraordinários.

Se depois de toda essa mobilização o povo brasileiro voltar à sua passividade e alienação de sempre, de nada terá adiantado tanto engajamento.

Um abraço,

Leon Neto

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