O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (foto) planeja uma ofensiva para conquistar o voto evangélico, que inclui a participação em três eventos nos próximos 40 dias, a montagem de comitês direcionados a esse público em todos os Estados e a divulgação de uma carta em que o petista pede votos e orações. Idéia é atrair votos de público que teria ficado órfão com a saída da disputa presidencial de Garotinho.

O PT coloca a conquista dos evangélicos como uma das prioridades da campanha, ao lado do voto feminino e do crescimento na região Sul do país. Para os lulistas, os evangélicos estão órfãos na campanha presidencial, após a saída do ex-governador Anthony Garotinho (PMDB-RJ) do páreo.

De acordo com o último censo do IBGE, de 2000, a parcela da população brasileira que se declara evangélica é de 15,41%. Os petistas acham que hoje ela já está chegando a 20%.

O presidente deve ter um jantar de campanha com lideranças das diversas denominações evangélicas no Rio de Janeiro, em 12 de setembro.

A organização está por conta da ex-ministra Benedita da Silva. Tem ainda convite para abrir a Expocristã, em São Paulo, uma feira de livros, vídeos e outros produtos evangélicos e para a Marcha para Jesus, um grande evento previsto para Sorocaba (SP), no final de setembro.

“O presidente quer expressar o compromisso de ter um diálogo mais próximo com os evangélicos no segundo mandato”, diz Ramon Velasquez, membro do coletivo de evangélicos do PT.

A carta do presidente aos evangélicos deve ser divulgada na semana que vem. Com pouco menos de duas páginas, está recebendo os retoques finais. “Conto com suas orações”, diz Lula, antes de pedir o voto.

No texto, o presidente promete criar um “canal direto” com a comunidade evangélica. Uma idéia em discussão é a nomeação, em um segundo mandato, de um assessor especial dedicado a cuidar do relacionamento com instituições religiosas -não apenas evangélicos.

“Lula reconhece o papel importantíssimo que os evangélicos desempenham nas periferias, o trabalho social que desenvolvem. Vem daí o compromisso de ter uma parceria mais efetiva”, afirma Velasquez.

A idéia de fazer três eventos com evangélicos é uma tentativa de Lula de contemplar o maior número de lideranças possível.

O setor é fragmentado. Há uma divisão nítida entre as igrejas “históricas”, como a metodista, luterana e presbiteriana, e os chamados pentecostais, como Assembléia de Deus, Renascer e Universal -o real público-alvo eleitoral.

Outro cuidado da campanha será o de não causar ciumeira em outras religiões. Lula estuda também propostas para encontros com católicos, judeus e muçulmanos.

“O que está definido pela nossa campanha é que o presidente vai conversar com todos os setores da sociedade”, diz João Felício, coordenador de mobilização da campanha.

Grupo cresce mais no país do que católicos

Dados dos censos do IBGE mostram que, entre 1991 e 2000, o percentual de católicos na população brasileira recuou 11%, enquanto o de evangélicos aumentou 81%. Entre os evangélicos pentecostais, o crescimento foi ainda maior, de 92%.

Para César Jacob, do Departamento de Comunicação da PUC do Rio e pesquisador do tema, não foi a população que abandonou a Igreja Católica, mas a igreja que abandonou as periferias e foi substituída.

O pentecostalismo é uma corrente do protestantismo que surgiu nos EUA, em 1901, como resposta a uma diagnosticada falta de fervor nos cultos metodistas.

No Brasil, as principais igrejas do pentecostalismo tradicional são a Assembléia de Deus, a Congregação Cristã e o Evangelho Quadrangular. Já o neopentecostalismo tem como principal representante a Igreja Universal do Reino de Deus.

PRB: vice de petista é de partido da Igreja Universal

A aproximação de Lula aos eleitores evangélicos pode ser facilitada pelo fato de o vice José Alencar ter se filiado ao PRB, partido criado no ano passado por políticos ligados à Igreja Universal. Na semana passada, Lula foi a um comício de Marcelo Crivella (PRB), sobrinho do fundador da Universal e candidato ao governo do Rio.

Apoiado pela Universal, petista cresce entre pentecostais

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que já foi comparado ao demônio por pastores, avança na preferência dos eleitores evangélicos pentecostais.

O percentual que pretende votar em Lula neste ano aumentou 59%, na comparação entre pesquisa Datafolha das eleições de 2002 e de julho deste ano -última a cruzar intenção de voto e religião. Lula aproxima-se dos evangélicos desde 2002, quando ganhou o apoio da Igreja Universal do Reino de Deus, neopentecostal ligada a membros do PRB.

Depois do apoio da Universal, Lula aproximou-se ainda mais dos evangélicos com medidas como a mudança no Código Civil que garantiu personalidade jurídica própria às igrejas e entidades religiosas e a inserção de evangélicos em conselhos de políticas públicas.

Para o professor do Departamento de Comunicação da PUC-RJ, César Jacob, especialista em análises sobre voto e religião, o crescimento de Lula entre pentecostais é resultado da adoção, pelo petista, de estratégia inaugurada pelo ex-presidente Fernando Collor de Mello: usar também a máquina das igrejas pentecostais como um dos meios para obter votos nas periferias urbanas.

Para Jacob, prova de que os apoios dos pentecostais têm impacto são os mapas eleitorais de Anthony Garotinho (PMDB), que teve votações mais expressivas em 2002 em anéis pentecostais das periferias urbanas.
A bancada de deputados evangélicos é cada vez maior: já tem 61 integrantes, contra 98 que se declaram católicos.

Até o momento, algumas das principais igrejas pentecostais, como a Assembléia de Deus e o Evangelho Quadrangular, ainda não oficializaram apoios a candidatos, mas fazem discursos de aprovação ao presidente.

“Quando ele era candidato, o Brasil não o conhecia, a população tradicional era assustada. Mas não foi ruim” diz o presidente do conselho político da Convenção Geral das Assembléias de Deus, Ronaldo Fonseca. Em 2002, a Convenção Geral, maior braço da Assembléia, apoiou José Serra (PSDB).

No entanto, a reportagem apurou com integrantes da igreja que, apesar da proximidade de Fonseca com o presidente, a tendência é fechar com Geraldo Alckmin (PSDB).

Rui Barboza, secretário-geral de cidadania do Evangelho Quadrangular, com 1,3 milhão de fiéis, segundo o Censo, defendeu Lula das denúncias de corrupção -a igreja teve dois deputados envolvidos no escândalo dos sanguessugas.

“De uma forma ou de outra, com todas as denúncias, os partidos em geral foram envolvidos. No entanto, observa-se uma posição imparcial do presidente.”, diz Barboza.

Antes aliada, a Igreja Católica agora se afasta

Enquanto Lula avançou entre evangélicos, balançaram suas relações com a Igreja Católica, sua aliada histórica. Durante o mandato do petista, a CNBB atacou a política econômica, o assistencialismo do Fome Zero, o valor do salário mínimo. Em documento de orientações para as eleições deste ano, dá mais uma estocada.

“O resultado das eleições de 2002 despertou grandes expectativas de transformação social. Aos poucos, o projeto de poder se sobrepõe à busca de um projeto de nação socialmente mais justa.”, afirma o texto.

“A conveniência da reeleição ou não é uma questão aberta”, disse à Folha Dom Odilo Pedro Scherer, secretário geral da CNBB.

A voz da CNBB, no entanto, parece não ter surtido efeito. Segundo o Datafolha, não houve, entre 2002 e agora, mudança expressiva no apoio de católicos.

À série de críticas de bispos, somou-se também a desconfiança dentro das CEBs (Comunidades Eclesiais de Base), que participaram da construção do PT.

“No encontro das CEBs do ano passado, as bandeiras do PT sumiram”, diz Sérgio Coutinho, assessor do setor de CEBs pela CNBB. “Há grupos mais simpáticos a Heloísa Helena (PSOL) e outros mais com uma posição estratégica, para impedir a volta do PSDB”, resume.

Até mesmo integrantes do movimento de Renovação Carismática Católica, pouco afeito às manifestações sobre política, abriram fogo.

“A gente sempre diz que pelos frutos você vê a obra. E o que tivemos foi mensalão, sanguessuga. Foi uma decepção”, disse o padre Marcelo Rossi, que e se declara “amigo” de Geraldo Alckmin.

Fonte: Folha de São Paulo

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