Neste domingo, perto de 126 milhões de brasileiros estão aptos a sair de casa para escolher um caminho para o País. É o instante para se verificar que Brasil está sendo construído nos últimos tempos.

Será a quinta eleição direta para presidente a contar do final do regime militar (1964-1984), a nona desde o encerramento do Estado Novo (1937-1945).

A primeira constatação é a de que se trata de um país que cresce pouco. Enquanto a elevação média do Produto Interno Bruto chegou a 7,4% ao ano entre 1946 e 1980, de lá para cá foi como se os aceleradores da economia entrassem em pane. No período 1981-2005, o crescimento médio anual do PIB chegou apenas a 2,3%. Em combinação com a taxa de natalidade, tem-se um insuficiente 1% de crescimento no PIB per capita na moderna era democrática. Resultado de aventuras macroeconômicas como o Plano Cruzado (1986), experimentações como os planos Bresser (1987), Verão (1988) e, suprema irresponsabilidade, o Collor (1990) com seu confisco em contas correntes, o País perdeu posições na cena internacional. Em 1980, a economia brasileira produzia 3,9% da riqueza mundial. No ano passado, apenas 2,7%.

Eleitor escolhe a continuidade

Paradoxalmente, o Brasil que se constrói a partir das urnas vai atacando, com relativo sucesso, a miséria interna. A faixa de cidadãos absolutamente pobres – aqueles que sobrevivem com renda mensal inferior a R$ 121 – se estreita. Em 1993, os miseráveis eram vergonhosos 35% do total da população, mas não ultrapassavam a 29% em 1995. Mantendo-se estável até 2003, essa parcela caiu para 22,7% no ano passado. Neste ponto, encontra-se um traço de união entre as urnas de 1994, que elegeram Fernando Henrique Cardoso, e as de 2002, das quais Luiz Inácio Lula da Silva saiu vitorioso: delas emergiram governos que reduziram em torno de 5% o tamanho dos miseráveis diante do conjunto da população.

“O eleitor está demonstrando maturidade política, ao escolher nas últimas eleições governantes com programas similares, de continuidade”, assinala o chefe do Centro de Políticas Sociais da Fundação Getúlio Vargas no Rio de Janeiro, Marcelo Neri. Ele identifica como principais marcas do País na última década a estabilização econômica, a universalização do ensino fundamental, a redução da desigualdade social e a geração de empregos formais. “A primeira parte da tarefa foi cumprida por Fernando Henrique. Depois, os resultados podem ser creditados a Lula.” Perto de 50% da população economicamente ativa tem relações informais de empregabilidade. Por outro lado, nada menos que 4,4 milhões de empregos formais foram gerados entre 2003 e julho deste ano.

Em todas as eleições, nos palanques ou na televisão, há sempre quatro temas que os candidatos fazem questão de tratar: educação, saúde, transportes e segurança. Apesar dessa verdadeira fixação, os cenários em cada uma dessas áreas mostram que há muito por fazer. No ensino, a universalização do acesso das crianças à escola primária está sendo apregoado nos últimos anos. Mas, de acordo com os números de 2004 da Pesquisa Nacional de Amostragem Domiciliar (PNAD), o analfabetismo ainda é um mal que atinge diferentes parcelas da população. Entre crianças de até dez anos, por exemplo, os que não sabem ler ou escrever chegam a 18% da população que recebia algum tipo de ajuda governamental. No outro extremo, o do ensino superior, o que se tem nos últimos anos é uma combinação perversa. Deu-se uma proliferação de faculdades particulares, a ponto de o Ministério da Educação suspender a entrega de licenças de funcionamento. Muitas dessas escolas estão hoje com as portas abertas em caráter precário, sem autorização para diplomar os formandos. Também surgiu o fenômeno das faculdades com tempo reduzido de duração de cursos: o que se fazia em quatro anos agora pode-se fazer em dois. Atalhos à parte, o certo é que esse coquetel está produzindo um retrocesso na qualidade do ensino, deixando o País muito aquém de países emergentes como a Rússia e a Índia, com fortes apostas na preparação de sua mão-de-obra.

No setor de transportes, o retrato, sem retoques, é de caos. O País entrou no século XXI com apenas 164 mil quilômetros de estradas pavimentadas de um total de 1,7 milhão de rodovias. As que têm asfalto, no entanto, estão repletas de buracos, que demandam operações de emergência com bilhões de reais em custos. As denúncias de corrupção em obras do setor se multiplicam. As estradas em melhor estado, como a via Dutra, que faz a ligação São Paulo–Rio de Janeiro, tiveram suas operações privatizadas a partir do governo Fernando Henrique. Ganharam, por essa opção, alguns dos postos de pedágio mais caros do planeta. Os aeroportos passaram nos últimos anos por uma série de reformas, mas nos portos as obras de modernização foram insuficientes. O resultado é que o Custo Brasil, que apura os valores necessários para a produção e distribuição de bens, é um dos mais altos na comparação com os concorrentes emergentes.

Polarização na reta final

A saúde, um dos temas mais recorrentes a cada eleição, mereceu este ano nada menos que R$ 44,3 bilhões no orçamento federal. Não há nenhuma doença contagiosa fora de controle, a política de incentivo à produção de medicamentos genéricos foi adotada pela população e o Sistema Único de Saúde (SUS) resiste ao tempo como um dos mais eficientes do mundo. Ainda assim, há dificuldade para o atendimento ao público, precariedade de equipamentos e deficiência entre profissionais. A mortalidade infantil no Nordeste, em 2003, atingiu 35 óbitos entre crianças menores de um ano para mil nascidos vivos. É um número mais de duas vezes maior do que os registrados nas regiões Sul e Sudeste. Por saúde, a demanda da população cresce a cada ano, sem previsão de se estabilizar.

Em matéria de segurança, o Brasil tem sido feito refém do banditismo e do crime organizado. As fronteiras estão praticamente descobertas, os índices de violência aumentam nas grandes cidades e o quadro carcerário é de superlotação e desrespeito aos direitos humanos. O crime organizado se instalou em diferentes setores. Já faz duas décadas que quem tem dinheiro para pagar passou a adotar medidas de segurança pessoal que incluem carros blindados, adoção de monitoramento eletrônico nas residências e não raro a contratação de equipes de seguranças.

Sem que haja crescimento econômico consistente, não há previsão para que esse quadro mude e tenha outras cores nos próximos anos. Então, diante de tudo isso, pense bem antes de votar. O futuro do Brasil está em suas mãos.

Fonte: Revista ISTOÉ

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