O Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul deferiu pedido cautelar feito pela Ordem dos Advogados do Brasil, seção MS, em Ação Direta de Inconstitucionalidade contra decreto da Prefeitura de Ladário, que convocava a população do município para fazer 21 dias de oração e um dia de jejum de sua livre escolha, no período de 18 de maio a 07 de junho, numa corrente espiritual contra a pandemia do coronavírus.
O prefeito Iranil de Lima Soares editou decreto n.° 5.194/2020 no início deste mês em que conclamou a todos os cristãos fazerem orações diárias por 21 dias e um de jejum “para livramento de todo o mal e pela benção do Senhor Deus sobre a municipalidade e o país”.
Diante da repercussão, no dia 21 de maio, o prefeito alterou o decreto para não restringir apenas a cristãos, sendo publicado um novo decreto com o n° 5.202/2020. Passou então a conclamar toda a população laderense a fazer “orações voluntárias a Deus e/ou a manifestação da fé”. Manteve, porém, as orientações de oração no período de 18 de maio a 7 de junho, bem como uma corrente de oração no dia 7 de junho e jejum.
Coube ao desembargador Luiz Gonzaga Mendes Marques, do Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul, barrar a ideia milagrosa. O magistrado considerou que o decreto municipal contém aparente inconstitucionalidade, além da “ausência de efeito prático, específico e concreto do ato”.
“Em que pese a ausência de efeito prático, específico e concreto do ato impugnado, já que conclama, recomenda e sugere que os cidadãos de Ladário voluntariamente cumpram as disposições espirituais nele contidas, o fato de estabelecer período certo de duração evidencia um mínimo de efeito cogente à população daquela municipalidade, estabelecendo certas liturgias espirituais (orações, jejum e corrente/cerco de oração), em desrespeito ao pluralismo existente na sociedade local”, citou o desembargador em sua decisão.
“É necessária a cessação imediata do ato impugnado potencialmente capaz de causar confusão ou desconforto desnecessário à comunidade ladarense, em época já naturalmente de bastante dificuldade em razão do enfrentamento à pandemia do novo coronavírus, cabendo a cada um dos indivíduos, de maneira reservada, íntima e de acordo com sua livre e própria convicção professar ou não alguma fé ou sentimento religioso”, completou.
O magistrado atendeu a pedido da Comissão de Estudos Constitucionais da OAB do Mato Grosso do Sul. O presidente da comissão, Elias Cesar Kesrouani Junior, apontou na inicial que mesmo de forma voluntária a norma ofende o princípio da laicidade do Estado e a liberdade religiosa.
O advogado afirmou ainda que as regras constitucionais de freios e contrapesos impedem que o Executivo local pratique atos que promovam quaisquer formas de discriminação, devendo ser assegurada a inviolabilidade e liberdade de crença, cultos e liturgias.
O presidente da OAB de MS Mansour Karmouche afirmou que o decreto era inconstitucional e apontou que, nestes casos, é importante a intervenção da instituição para zelar pelo princípio da laicidade.
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Fonte: Consultor Jurídico e Diário Online