Segunda maior festa popular da Bahia, depois do Carnaval, a lavagem das escadarias da igreja de Nosso Senhor do Bonfim quebrou uma tradição nesta quinta-feira: pela primeira vez, em mais de 250 anos, um padre abençoou o cortejo formado em sua maioria por adeptos do candomblé. Cerca de 800 mil pessoas participaram da festa, de acordo com policiais militares.

Como tradicionalmente acontece, os políticos aproveitaram a festa para testar sua popularidade. Houve confusão durante a caminhada do prefeito João Henrique Carneiro (PMDB), e um adolescente de 17 anos, que protestava contra o aumento da tarifa de ônibus (a passagem convencional passou de R$ 2 para R$ 2,20) foi agredido por um suposto segurança do prefeito. No tumulto, houve tiros, mas a PM não identificou os autores dos disparos.

Secretário de comunicação da prefeitura, o jornalista André Curvelo confirmou que o agressor do adolescente integra a equipe de segurança da administração municipal. De acordo com o secretário, os estudantes que protestaram contra o reajuste nas tarifas de ônibus também agrediram os seguranças da prefeitura.

Caminhada

Depois de um culto ecumênico na igreja de Nossa Senhora da Conceição da Praia, os baianos e turistas iniciaram uma caminhada de oito quilômetros até a igreja do Bonfim. Durante o trajeto, sob um calor de 31º, cânticos ligados ao candomblé foram entoados pela multidão. Na chegada ao templo, mais uma novidade: a porta principal estava aberta, por determinação da Arquidiocese de Salvador.

Desde 1890, durante a lavagem das escadarias, a igreja sempre esteve fechada para evitar a eventual destruição de imagens sacras. Além da porta aberta, outra novidade: de uma janela do piso superior, o padre Edson Menezes abençoou os fiéis. “Tenho uma grande admiração pelas manifestações populares, a festa do Senhor do Bonfim resume muito bem a religiosidade e a crença do nosso povo. Achei que ficava um vazio sem a bênção e pedi permissão para a Arquidiocese”, disse o padre.

A bênção do padre aconteceu quando cerca de 500 baianas, todas vestidas a caráter, lavaram as escadarias da igreja, cujas obras foram concluídas em 1772. Além do prefeito João Henrique, que não fez a caminhada até o final, o governador Jaques Wagner (PT), o ministro Geddel Vieira Lima (PMDB), o ex-governador Paulo Souto (DEM) e os deputados federais Antonio Carlos Magalhães Neto (DEM) e José Carlos Aleluia (DEM) também fizeram o percurso.

“Esta é a maior festa da Bahia, um exemplo da tolerância religiosa para todo o mundo, principalmente agora, quando acontece o conflito entre Israel e o grupo islâmico Hamas”, disse o governador. “É muito emocionante tudo isso. Esta é uma festa que deve levar uma mensagem de paz ao mundo inteiro. É o momento de fé do povo baiano, de fé e sincretismo, de respeito às diferenças, uma mensagem que deve ecoar no mundo interior”, declarou ACM Neto.

História

O culto ao Senhor do Bonfim começou na primeira metade do século 18, mais precisamente em 1745, quando o capitão-de-mar-e-guerra Theodósio Rodrigues de Faria prometeu construir um templo caso sobrevivesse a uma tempestade. Um ano depois, começaram as obras da capela, que teve a sua conclusão em 1772. Durante a festa, as repartições públicas e bancos instalados na cidade baixa não funcionam. “Todos os anos vejo esta lavagem pela televisão, mas vi que pessoalmente é muito mais emocionante”, disse a turista mineira Viviane Medeiros, 24.

Casada com um brasileiro, a alemã Anette Stork, 33, disse que ficou “encantada” com a procissão e com o entusiasmo das pessoas. “Na Europa, ninguém fala em outra coisa a não ser os reflexos da crise econômica mundial. Aqui, as pessoas também estão preocupadas, mas encontram tempo para cultivar a alegria e os seus momentos de fé”, acrescentou.

Em meio à festa, desempregados e vendedores ambulantes aproveitaram a multidão nas ruas para aumentar o faturamento. Uma lata de cerveja era vendida nesta quinta-feira por R$ 4, 100% a mais do que em alguns estabelecimentos. “A gente pode colocar qualquer preço que vende. O turista e o baiano que vai à festa está mais preocupado na diversão do que em quanto vai gastar”, disse o vendedor ambulante Ricardo dos Santos, 22.

Bonfim light

Enquanto milhares de pessoas caminhavam até as escadarias da igreja do Bonfim, no Bahia Marina, uma construção voltada para a baía de Todos os Santos, promoveu mais uma edição do “Bonfim Light”, uma festa paga e animada pelas bandas Asa de Águia e Jammil e pelo cantor Tomate. Quem deixou para comprar as camisas que garantiam o acesso ao evento de última hora teve de desembolsar, em média, R$ 300. Com antecedência, o preço era R$ 180 (inteira) e R$ 90 (meia).

Fonte: UOL

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