A Nicarágua está se deparando com sua maior crise política desde a Revolução Sandinista, em 1979. Mais de 350 pessoas foram mortas nos últimos três meses em manifestações contra o governo de Daniel Ortega, que se nega a antecipar eleições presidenciais.
“Nós tememos que a guerra possa irromper a qualquer momento e isso traria muito sofrimento. Por favor, orem por nós”, pediu um pastor evangélico nicaraguense, que não teve a identidade revelada por questões de segurança, à CBN News.
O pastor lidera uma pequena igreja na cidade de Masaya, a 27 quilômetros de Manágua, capital da Nicarágua. Há três meses, Masaya se tornou o epicentro de um movimento nacional de resistência e se declarou, em 19 de junho, “território livre” do governo de Ortega.
As manifestações começaram com pequenos grupos de estudantes em Masaya, que protestavam contra os planos de reforma econômica de Ortega, mas rapidamente se espalharam para outras cidades sob a exigência de que o presidente deixasse o cargo e antecipasse as eleições.
Em pouco tempo, os confrontos entre manifestantes e forças militares aumentaram a onda de violência no país. O balanço mais recente da Associação Nicaraguense pelos Direitos Humanos (ANPDH) aponta 351 mortos, 261 desaparecidos e mais de 2.100 feridos.
Dentre as vítimas está a brasileira Raynéia Gabrielle Lima, de 30 anos, que foi morta a tiros na noite de segunda-feira (23) em Manágua, onde cursava medicina.
“Eu moro em um bairro onde a polícia e outras forças estão indo de porta em porta e prendendo jovens”, revelou o pastor. “Há tantas pessoas desaparecidas que tememos que possam estar mortas”.
Ele ainda descreveu um incidente que marcou seu bairro há vários dias, quando uma multidão de policiais saíram marchando pelas ruas. “Eu fiquei debaixo da cama com minha esposa e minha filha, que é deficiente. Foi aterrorizante”.
Ortega declarou em diversas ocasiões que não irá deixar o cargo antes da data originalmente programada, alegando que isso pode criar instabilidade e insegurança. “O povo vai decidir quem assumirá o governo em 2021”, disse ele nesta terça (24, em entrevista à emissora Fox News.
Influência da igreja
A maioria dos nicaraguenses fazem parte da Igreja Católica Romana, enquanto 15% da população é evangélica. Quando os protestos começaram, Ortega entrou em contato com a Igreja Católica para ajudar a resolver a crise política.
“Vários bispos tiveram um papel fundamental nos primeiros dias do conflito, atuando como mediadores entre o governo e as forças da oposição”, disse o pastor. “Os bispos desempenharam um papel vital na tentativa de trazer a calma para a situação”.
Os evangélicos, por outro lado, adotaram uma abordagem diferente diante da crise. “Muitas igrejas evangélicas estavam relutantes em assumir um papel político tão ativo e, em vez disso, oraram e jejuaram nos bastidores. As igrejas também distribuíram comida, água e aconselharam as famílias que foram afetadas pela violência”, ele relata.
No decorrer da crise política, a Igreja Católica se tornou alvo de partidários pró-governo, registrando diversos casos de vandalismo e ataques a padres.
Na semana passada, Ortega voltou sua ira contra a Igreja Católica, acusando os bispos de serem “golpistas”. “Muitas igrejas foram usadas como quartéis para armazenar munições e bombas”, disse o presidente diante de milhares de partidários.
Tomados pelo medo
O discurso de Ortega contra os bispos da Nicarágua causou medo entre os líderes católicos e a população.
“Todo mundo na minha cidade tem medo. Você não pode andar na rua com confiança. Há civis armados e policiais perambulando pelas ruas. Há câmeras por toda parte e as pessoas sabem que as autoridades estão nos observando”, contou o pastor.
O líder evangélico acredita que, neste momento, a igreja não pode tomar partido nesta crise política. “Em vez disso, temos que estar do lado da justiça e do povo”, disse o pastor. “Realmente não sabemos para onde estamos
Fonte: Guia-me