Pastor José Ernesto Conti, da Igreja Presbiteriana Água Viva; Teólogo Lourenço Stelio Rega, Ph.D. em Ciências da Religião; Pastor Lisânias Moura, da Igreja Batista do Morumbi, em São Paulo (Foto: reprodução/montagem)
Pastor José Ernesto Conti, da Igreja Presbiteriana Água Viva; Teólogo Lourenço Stelio Rega, Ph.D. em Ciências da Religião; Pastor Lisânias Moura, da Igreja Batista do Morumbi, em São Paulo (Foto: reprodução/montagem)

Após a decisão da Receita Federal, publicada no Diário Oficial desta quarta-feira (17), em suspender uma medida que garantia a isenção tributária sobre os salários dos líderes religiosos, as redes sociais foram tomadas de debates sobre o tema. Mas qual a opinião dos pastores em relação a esse assunto?

De acordo com o pastor José Ernesto Conti, da Igreja Presbiteriana Água Viva, há uma certa confusão em relação ao “Ato Declaratório Interpretativo” RFB nº 1, de 29 de julho de 2022, o qual se refere a ação do Tribunal de Contas da União (TCU). Ele explica que muitos líderes religiosos brasileiros, além de pastorear uma igreja, possuem outras atividades inerentes a sua formação como professor, conferencista, autor, consultor, entre outras funções.

Sendo assim, quando as instituições contratavam os pastores (em regime CLT – carteira assinada), havia a dúvida se o cálculo da contribuição previdenciária desses ministros deveria levar em consideração apenas o salário pago pela empresa ou teria que incluir a remuneração recebida pela igreja no mesmo cálculo.

Segundo pastor, o Ato Declaratório emitido em Jul/22 veio exatamente para esclarecer essa dúvida. Ele cita, por exemplo, No §1º deste ato, que informa que “os valores despendidos com os ministros e membros, … da instituição religiosa, … não caracteriza esses valores como remuneração sujeita à contribuição prevista no inciso III do caput do art. 22 da Lei nº 8.212, de 1991”.

E ainda o No §2º deste Ato, onde esclarece que “serão consideradas remuneração somente as parcelas pagas com características e em condições que, comprovadamente, estejam relacionadas à natureza e à quantidade do trabalho executado, hipótese em que o ministro ou membro, em relação a essas parcelas, será considerado segurado contribuinte individual, prestador de serviços à entidade ou à instituição de ensino vocacional”.

“Resumindo, o salário que um pastor (ou ministro) recebe de uma igreja não deve ser adicionado ao salário que esse pastor (ou ministro) recebe quando ele é um professor, por exemplo. Cada entidade, deve recolher os tributos previdenciários independente, mesmo sendo uma única pessoa. Esse entendimento é semelhante a um profissional que trabalha em duas ou mais empresas. Cada empresa deve recolher as contribuições previdenciárias independentemente, desde que não excedam o teto imposto pela previdência”, explica.

O pastor completa e comenta a atual decisão: “Com o cancelamento do Ato pelo governo Lula, volta a interpretação pessoal da Lei nº 8.212, ou seja, de acordo com o que cada Auditor Fiscal interpreta. Por isso, as instituições (escolas e seminários) poderão voltar a receber multas, muitas vezes, com valores altíssimos que inviabiliza financeiramente muitas dessas instituições, só porque o Auditor assim entende”, lamenta Ernesto Conti.

“Igreja deveria ficar longe de benefícios eleitoreiros”

Já o teólogo Lourenço Stelio Rega, Ph.D. em Ciências da Religião, tem uma visão diferente sobre essa questão. Segundo ele, as leis e os impostos são iguais para todos, mesmo que não se colha os frutos esperados por eles, e que a igreja deveria ter cuidado ao aceitar “benefícios” que vêm da parte política, exatamente para que ela não venha a se tornar refém do sistema.

“Dentro da legislação existe o princípio da isonomia que, em palavras simples, deve haver igualdade de direitos e responsabilidades. Por que ministros religiosos deveriam ser beneficiados em relação às demais classes de trabalhadores?

E ainda há o lado político da decisão que tem sido tomada nestes casos. O que se pretende com isso? Qual objetivo? Agradar religiosos para a obtenção de apoio político e votos? Seria uma negociata, uma espécie de troca de favores? Acredito que aqui é que entra o princípio da Reforma sobre a separação entre o Estado e a Igreja, de que não podemos abrir mão. Precisamos ter a liberdade de denunciar práticas abusivas dos governantes e não ficar presos a uma espécie de ‘Lei da Mordaça’, opina Rega.

Na sua opinião, mais importante do que pedir privilégios, a comunidade evangélica deveria lutar por um governo com uma gestão mais eficiente. “O que precisamos exigir não é isenção e privilégios para os religiosos, mas sim, um governo justo e competente. Precisamos ter liberdade para isso, em vez de esperar benesses e ficarmos aprisionados sem o direito de cumprirmos o nosso papel profético que, aliás, tem praticamente desaparecido em nosso meio evangélico e de nossa liderança evangélica no Brasil”, afirma.

“Governo dará um tiro no próprio pé”

Para o pastor Josué Ebenézer de Sousa Soares, da Comunidade Batista Atos 2 de Nova Friburgo (RJ), a isenção tributária em salários dos pastores é algo garantido em lei e que não se trata de isenção, mas sim de imunidade. “Portanto, é matéria indiscutível e se o governo entrar por esse caminho só estará afirmando – o que já está muito claro para a população brasileira – seu viés ditatorial”, ressalta.

Pastor Josué lembra ainda, que esse é um privilégio que não só os pastores, mas os padres e todos os ministros e sacerdotes, de todas as confissões religiosas, são beneficiados. Ou seja, ele acha estranho a matéria do TCU só tratar dos pastores. Por outro lado, ele está entre aqueles que preferem que a igreja mantenha distância do Estado.

“Se o Estado é laico, não podemos desfrutar dessas benesses provindas dele. Por outro lado, se o Estado reconhece a atividade religiosa como fundamental para a boa ordem social e por isso concede esse benefício, é outra questão. Mas, com esse governo comunista que está aí, não creio ser essa a questão. Além disso, caso haja fundamentação para a questão levantada, todos os demais segmentos deveriam ser atingidos, não só a classe dos religiosos como militares, políticos, judiciários e demais poderes desse país”, afirma.

O pastor não acredita que essa decisão vá para frente e que, se for, será um tiro no pé do próprio governo, que nos últimos meses tem tentado se aproximar dos evangélicos. “Confesso uma certa descrença de que tal medida possa ir adiante. Sobre o impacto de tal possível medida, não creio que terá maiores consequências para as igrejas. E, para os pastores, seria uma medida disciplinar, para que eles se tornem mais éticos e passem a contribuir para o país”, acredita.

“Estamos sujeitos às autoridades”

No caso do pastor Lisânias Moura, da Igreja Batista do Morumbi, em São Paulo, caso essa decisão continue, será uma perda para algumas igrejas, mas faz parte dos deveres e obrigações de cada cidadão. “É difícil, é uma perda, vai impactar muitos que já pagam. Uns pagam muito, outros poucos, mas agora todos pagarão, sem exceção. Podemos protestar de uma forma legal, mas estamos sujeitos à autoridades”, finaliza.

“Nunca houve essa tal isenção”

A Frente Parlamentar Evangélica afirmou, nesta quarta-feira (17), que nunca houve qualquer isenção fiscal concedida a ministros de nenhum culto.

“Nunca houve essa tal isenção para nenhum ministro de culto em nenhum governo”, disse a bancada, em nota.

No comunicado, assinado pelo presidente da frente parlamentar, deputado federal Silas Câmara (Republicanos-AM), é dito que o grupo fez uma análise juntamente com um especialista em contabilidade eclesiástica e chegou à conclusão de que a norma suspensa foi “apenas um ato interpretativo que tratava da questão previdenciária de ministros”, cuja lei segue em vigor.

“Uma breve consulta ao Regulamento do Imposto de Renda desfaz essa falácia que visa somente puxar os evangélicos para o debate para aguçar a oposição pública contrária”, diz a nota.

Ao final do comunicado, a bancada ressaltou que “revogar um ato interpretativo deixa os ministros de qualquer culto à mercê da interpretação particular e do humor dos auditores da fazenda” e que essa seria “a velha prática de promover o caos”.

Fonte: Comunhão e Pleno News

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