Desde que o reverendo Aldo Quintão ingressou na Igreja, em 1998, o público das missas passou de no máximo dez pessoas para quase mil seguidores. Nos últimos três anos, a plateia das duas celebrações dominicais encabeçadas por ele cresceu mais de 80% – de 489 para 889 fiéis.

“Se houver algum divorciado aqui, ou alguém que tenha feito sexo por prazer, ou qualquer indivíduo que use métodos contraceptivos. Por favor, se retire. Assim é na Igreja Católica Apostólica Romana e na maioria das religiões, em que tudo isso é pecado. E aposto que, se essas regras fossem seguidas, todos teriam de deixar a igreja. Lá, eu, que sou casado e a favor do aborto em casos de estupro, também sairia. Aqui, porém, nesta Catedral Anglicana, não há esse tipo de discriminação. Todos são aceitos por Deus. Não importa se está em seu segundo casamento, se é homossexual ou qual crença segue.”

Com esse discurso liberal e polêmico, o reverendo Aldo Quintão vem atraindo fiéis à missa na Catedral Anglicana de São Paulo, na Rua Comendador Elias Zarzur, no Alto da Boa Vista. Gays assumidos, desquitados, intelectuais e desgarrados de outras religiões migraram para o culto, em busca do que chamam de “um pensamento contemporâneo e avesso à hipocrisia”. Desde que Quintão ingressou na Igreja, em 1998, o público das missas passou de no máximo dez pessoas para quase mil seguidores. Nos últimos três anos, a plateia das duas celebrações dominicais encabeçadas por ele cresceu mais de 80% – de 489 para 889 fiéis. Como consequência, a receita anual da catedral inflou. De 2007 para 2008, passou de R$ 913 mil para mais de R$ 1,3 milhão. Os dízimos, que somavam R$ 94 mil, superam R$ 335 mil. Isso sem levar em conta o caixa do Instituto Anglicano, organização sem fins lucrativos ligada à Igreja, que arrecadou R$ 1,4 milhão em 2008 para sustentar três creches em favelas (e está construindo uma quarta, em um terreno de 10 mil m² em Paraisópolis). Resultados da oratória antidoutrinária de Quintão que conquistou seguidores da elite paulistana.

A empresária Dora Reis é uma das que se encantam com a pregação. Antes de entrar para o anglicanismo, ela vivia no pecado como Católica Romana. “Por estar em meu segundo casamento, era tida como errada”, diz. “Uma separada promíscua era mais aceita que eu, que resolvi ter outro marido e sou fiel a ele. No anglicanismo, o mais importante não é seguir uma regra desatualizada. O certo e o errado são definidos pelas ações.” Nas celebrações dominicais, o reverendo faz questão de mostrar ser contra as doutrinas tradicionais. “Deixei um muçulmano ser padrinho em um batismo”, conta aos fiéis. “Deus não é único e aceita a todos?”

Pode parecer que a paróquia anglicana é o lugar onde tudo pode. Mas não é bem isso. Durante as missas, o reverendo deixa explícito o que repudia. Egoísmo, assédio moral, corrupção… São alguns dos pecados destacados. “Viram a notícia que saiu sobre o corte nas merendas escolares?”, questiona Quintão em um dos cultos. “Acho que os políticos querem economizar para o aumento que batalham para receber.” O reverendo costuma analisar fatos recentes para dar sua visão do que é e o que não é correto. Já foram abordados temas como: atos terroristas, aborto, pedofilia. “Ele oferece um produto diferenciado no mercado religioso”, analisa o sociólogo Edin Sued Abumanssur, professor de Sociologia da Religião da PUC-SP. “Com um sermão moderno, explora o nicho formado pela elite.”

Esse jeitão contemporâneo de promover a palavra de Deus ajuda a encher os bancos de madeira da catedral. “Ele trata da religiosidade de forma inteligente”, afirma o promotor e fiel Augusto Rossini. “Por isso que convence indivíduos intelectualizados.” Rossini ainda destaca a transparência da catedral. “Temos acesso às receitas e sabemos para onde vão as doações”, diz o promotor. As demonstrações financeiras são ainda conferidas por uma auditoria.

Fonte: Estadão

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