Um clima de mistério ronda a Igreja Tabernáculo Vitória (foto), cujas portas só se abrem para fiéis seguidores do seu pastor-presidente, Inereu Vieira Lopes.
Leia também: – Tabernáculo usa escravidão, dizem pastores; – Igreja é dissidência de ministério de Goiânia; – Pastor deixou família e foi morar na comunidade; – Promotores querem que pastor abra seu sigilo bancário.

Preparados para o Dia do Juízo Final, que estaria próximo, eles vivem quase que isolados, num prédio de cinco andares, erguido em mutirão no bairro Santa Teresa, na Região de Santo Antônio, na Capital. Lá, parentes tentam visitá-los, mas a maioria não consegue.

Ao todo, 250 pessoas moram no número 501 da Rua Ernesto Bassini, mas quase metade delas, constituída de homens, está em Ecoporanga, no Noroeste do Estado, construindo uma nova moradia, naquele que seria, na visão do grupo, o local de encontro com Jesus Cristo.

Todos esses fiéis ouviram os pedidos do pastor Inereu Lopes para que vendessem os seus bens em favor do amor divino e para que permanecessem juntos. Em frente ao prédio do Tabernáculo, havia ontem pelo menos dois carros à venda, um Opala e um Santana. Há dias em que o número é maior.

Curioso é que vizinhos disseram que o pastor Lopes é dono de uma caminhonete Ranger e que um dos seus filhos mantém um Polo vermelho na garagem do prédio.

Vigilância

Um enorme muro, com portões de ferro e câmeras de vídeo, é a barreira para quem não é bem-vindo ao Tabernáculo Vitória. Até parentes de moradores do “condomínio” são barrados. No local, há também homens que fazem vigilância noturna.

“O pai de uma adolescente veio buscá-la há um mês. Depois de chutar o portão, porque ninguém o atendia, ele acabou apanhando de homens que saíram lá de dentro. A polícia veio e levou-o sem a filha”, disse um vizinho.

Não há placa indicando existência de uma igreja, mas ela existe, protegida pelo muro, e com capacidade para quase mil fiéis. O prédio, com 150 quitinetes, é outra evidência da prosperidade do Tabernáculo Vitória.

Nos fundos, para expansão da obra divina, vizinhos dizem que a igreja adquiriu uma casa, que valeria R$ 25 mil, por R$ 45 mil. E adeptos não param de chegar. Ontem, às 15h20, parou na porta um caminhão com mais uma mudança, mas ninguém falou com a imprensa.

No segundo pavimento do prédio era possível ver homens, mulheres e crianças lanchando, praticando esportes, se abraçando. Vizinhos dizem que os fiéis passam a maior parte do tempo orando e que fazem refeições no local, onde há uma cozinha comunitária.

“Vamos atravessar o Jordão (…)

Será este o ano?”

Frases estampadas em camisetas de fiéis do Tabernáculo Vitória

Angústia de filho

O coma de um senhor de 67 anos é a grande preocupação do marceneiro Rogério Rampinelli, 36, que viu sua família ir embora para a comunidade Tabernáculo. Seu pai teve um derrame e, segundo notícias de parentes, encontra-se no prédio da igreja, em Vitória.

Ele tentou entrar no local e retirar seu pai para levar ao hospital. Não conseguiu. “Já não sei mais o que fazer”, desabafa Rogério. A história já dura um mês. A casa de dois andares em São Geraldo II, Cariacica, em que o marceneiro morava com os pais, a irmã e a esposa, foi vendida às pressas para que a mudança do pai para o Tabernáculo fosse feita. O imóvel – que valia R$ 80 mil – foi vendido por bem menos: R$ 45 mil.

“Tive que alugar uma casa. Mas o pior não é isso: outra irmã foi embora com o marido para os sítios de Ecoporanga. A família se entregou mesmo”, destaca Rogério.

O movimento dos membros em mudança para o Tabernáculo não acontece só na Grande Vitória. Segundo parentes indignados, famílias de João Neiva e Afonso Cláudio também migram para a Capital com o mesmo objetivo. “As quitinetes logo estarão lotadas”, diz, por telefone, uma mulher à reportagem.

A doméstica S., de 34 anos, já fez parte da religião. Agora, lamenta a reclusão de seu irmão, cunhada e filhos. “Eles trabalham lá dentro, não têm emprego fora. Vivem para o Tabernáculo”, frisa.

Sofrimento de pai

O taxista João Fantim não contém o choro ao falar do filho Daniel, 31 anos, que há seis meses vendeu todos os seus bens para morar com a mulher e três filhos na comunidade de fiéis da Igreja Tabernáculo Vitória, na Capital. Ontem, temendo até pela vida do filho e dos netos, ele pediu ajuda ao Ministério Público Estadual.

Daniel partiu para Ecoporanga, no Norte do Estado, para ajudar na construção de uma nova comunidade de fiéis da igreja. Na Capital, onde está o templo principal do Tabernáculo Vitória, ficaram sua mulher e filhos, num prédio onde só moram membros da igreja.

Segundo o taxista, membro da Igreja Assembléia de Deus, seu filho vendeu uma casa que valia R$ 150 mil por R$ 50 mil, a placa de um táxi com ponto no Shopping Vitória, por R$ 150 mil, e um carro Santana, por R$ 22 mil.

“Ele se desfez de tudo para seguir o Tabernáculo, que freqüentava desde os 17 anos de idade. Acho que sofreu uma lavagem cerebral”, disse João Fantim.

“Meu medo é que a gente só possa entrar lá para recolher os corpos”, comentou o homem, numa referência ao suicídio coletivo, por envenenamento, de 900 discípulos de Jim Jones, fundador do Templo do Povo, em 1978, na Guiana.

O Ministério Público limitou-se a dizer que não está omisso em relação à igreja.

Ex-seguidora tem dois filhos na seita

Ela já foi fiel das igrejas Católica e Batista, freqüentou o Tabernáculo Vitória e atualmente assiste aos cultos da Igreja Maranata. Mas o vínculo de Romilda Cipriano Fernandes com o Tabernáculo Vitória permanece por meio de dois de seus filhos, que moram na comunidade de fiéis seguidores do pastor Inereu Vieira Lopes, num prédio anexo ao templo, na Região de Santo Antônio, na Capital.

Dona Romilda Fernandes diz que se sente salva, mesmo após ter deixado de ser fiel do Tabernáculo Vitória. “Falei por telefone com o pastor que não viria mais. Não quis deixar meu marido, meus outros filhos, minha casa. Ele prega que todos deixem tudo pelo amor divino, mas não aceitei”, diz a mulher.

O filho mais novo de Romilda integrou-se à comunidade do Tabernáculo e passou a morar numa das quitinetes da igreja no ano passado. O outro, de 34 anos, chegou ao local no último domingo, com mulher e dois filhos pequenos. Ontem, a avó foi ao local levar milho de pipoca e biscoitos para as crianças, mas até as 16h30 o portão não havia sido aberto para que ela entrasse no prédio.

Conselho Tutelar apura se menor deixou escola por causa da igreja

O Conselho Tutelar de Ecoporanga vai investigar se uma adolescente de 16 anos que abandonou a escola há 90 dias foi proibida de estudar pela família que seria integrante da Igreja Tabernáculo Vitória.

A denúncia, feita pelo supervisor escolar Antônio Valdecir Vaz, dá conta de que a adolescente, matriculada no ensino médio da Escola Pio XII, abandonou os estudos há 90 dias. Ela e os pais residem em Pedra Bonita, próximo ao sítio de Córrego Paraíso, onde membros do Tabernáculo onde está sendo construído um condomínio para a comunidade.

“Um tio da garota me contou que ela e a família sempre visitam o local e que a mudança para lá seria uma questão de tempo”, comenta o supervisor escolar. O presidente do Conselho Tutelar de Ecoporanga, José Maria da Silva, disse que vai investigar o caso. “Se a denúncia for confirmada, vamos apelar ao Ministério Público”, avisa.

Ontem à tarde, no condomínio, homens continuam a construir a cerca e a abrir uma estrada. E imprensa continua não sendo bem-vinda. Das cerca de 100 pessoas isoladas, seis são de Ecoporanga; e o restante seria de Vitória.

Pastor só falou por meio de nota

Na última quarta-feira, o pastor Inereu Lopes, pastor-presidente do Tabernáculo Vitória, afirmou, por meio de nota, que o Ministério Público se coloca à disposição das pessoas que se sentirem lesadas pela entidade. O religioso diz que tem o direito constitucional de crer no que quiser e de se calar. “Se falharmos de acordo com a lei, em usurparmos do direito de alguém, que este alguém nos procurem, e se não quisermos atendê-lo que busquem na Justiça o respeito devido aos seus direitos”, frisou.

Fiéis vão a posto médico e à escola

As 250 pessoas que vivem no condomínio do Tabernáculo de Vitória freqüentam a unidade de saúde. O Programa Saúde da Família também tem livre acesso ao local, de acordo com a Secretaria de Saúde de Vitória. As crianças freqüentam a escola, e algumas mães até buscaram ajuda no Conselho Tutelar de Vitória para conseguir vagas na rede pública. O conselho disse não ter recebido denúncia envolvendo a comunidade e frisou que só pode agir se houver suspeita de violação de direitos.

Tabernáculo usa escravidão, dizem pastores

Escravidão. Esse é o termo usado pelo pastor da Igreja Luterana e presidente do Conselho Nacional de Igrejas Cristãs em Vitória (Conic), Norberto Berger, para classificar a forma como vivem os fiéis no Tabernáculo Vitória. “Isso não tem nada haver com igreja. É para enganar o povo e até para enganar a si mesmo. Viver enclausurado é uma contradição. Jesus nos deu a liberdade, morreu para que fôssemos livres”, contestou.

Já o pastor Edir Pires da Silva, da Primeira Igreja Batista de Laranjeiras, na Serra, afirmou que acompanha o fato pela imprensa, mas tem pouco conhecimento do que se passa dentro da seita. “Apesar de respeitarmos, não concordamos com práticas assim. A Bíblia diz que as pessoas não podem ser isoladas para esperar a vinda de Jesus. Devemos continuar nossos projetos e pensar no próximo, o que parece não acontecer nesse caso”, destaca.

Especialistas

Segundo a avaliação do professor de Filosofia e de Ciências da Religião, Vitor Rosa, o Tabernáculo Vitória pode ser visto muito mais como uma seita religiosa que utiliza a crença, a fé no transcendente, para construir suas bases econômicas, e sociais.

O professor alertou sobre a idéia equivocada de se pensar num espaço sagrado, para pessoas eleitas, à espera do juízo final. “O Evangelho fala em ações sociais condizentes com a ética, em amor ao próximo, nada a ver com venda de bens materiais”, diz. Vitor Rosa identifica no Tabernáculo Vitória um movimento baseado no fanatismo religioso, na crença da volta próxima e catastrófica de Jesus Cristo.

O caráter messiânico e escatológico (discurso de que o fim do mundo está próximo) ajudam a caracterizar a igreja, de acordo com o doutor em Ciências da Religião e professor da Ufes Edebrande Cavalieri. O fato de as pessoas não saberem o que se passa na comunidade também é um atrativo.

“Todas as religiões têm algum mistério, mas, neste caso, as pessoas de fora não têm livre acesso. É complicado, porque o Estado brasileiro confere a liberdade de culto. A liberdade religiosa é importante, mas precisa ter a contrapartida da responsabilidade”, diz.

“A religião virou um mercado vasto, complexo e sem controle. No continente americano, a tendência é que esse tipo de organização só cresça”
Edebrande Cavalieri – Doutor em Ciências da Religião e professor da Ufes

“Fica difícil imaginar se há má-fé, mas uma liderança religiosa fanática é sempre perigosa. Esse tipo de liderança gera pessoas capazes de tudo”
Vitor Rosa – Professor de Filosofia e de Ciências da Religião

Igreja é dissidência de ministério de Goiânia

A doutrina pregada no Tabernáculo Vitória diferenciou-se de suas bases há muitos anos, segundo pastores que atuam no ministério do qual já fez parte o pastor Inereu Vieira Lopes e que tem sede em Goiânia.

Inereu era ligado à Igreja Evangélica Cristã, também chamada de Tabernáculo da Fé, mas teria rompido com esse ministério em 1982. Essa igreja é liderada pelo pastor Joaquim Gonçalves, um dos propagadores da doutrina do norte-americano William Branham.

“Sinto por esses irmãos que estão com Inereu. Ele pregava como a doutrina manda, mas separou-se do pastor Joaquim”, contou o pastor Anésio Paula de Oliveira, do Tabernáculo da Fé, em João Neiva.

Anésio relatou que a doutrina não diz, em nenhuma das mensagens de Branham, que os fiéis deveriam viver juntos ou vender os bens para isso. “Desde 1988 é que ele começou a pregar diferente. Branham não exigia que ninguém vendesse nada. Em Atos, as pessoas faziam isso, mas Pedro não mandava ninguém fazer. Ele está obrigando. Graças a Deus estou fora disso.”

O próprio pastor Anésio diz já ter sido vítima desse “desvio” da doutrina, em 1973. “Na época, a pessoa me pressionou falando que eu tinha que vender tudo. Dei sorte, pois consegui reaver tudo”, relembrou.

Também ligado à igreja de Goiânia, o pastor da Igreja Evangélica Cristã em Vila Velha, Rubens Monteiro do Nascimento, não critica o líder da Tabernáculo Vitória. “Ele é boa pessoa, prega há mais de 40 anos. Visitei o tabernáculo umas duas vezes, mas não senti vontade de me aproximar”, afirmou, confirmando que, segundo as mensagens de Branham, os escolhidos serão arrebatados onde estiverem.

“A mensagem do profeta não diz para deixar a família. O pior é que eles não aceitam a gente falar. Cristo é a única esperança”
Anésio Paula Oliveira – Pastor do Tabernáculo da Fé em João Neiva

Pastor quer rebanho vivendo em sítio de Ecoporanga

O grande projeto do pastor Inereu Vieira Lopes, 56 anos, é levar seu “rebanho”, estimado hoje em no mínimo 400 pessoas, para uma comunidade da Igreja Tabernáculo Vitória que está sendo montada em Ecoporanga, na Região Noroeste do Espírito Santo.

O pastor disse ontem aos promotores do Ministério Público Estadual Zulmira Bowen e Jerson Ramos de Souza que quer vender o prédio do bairro de Santa Teresa, na Região de Santo Antônio, na Capital.

Em Ecoporanga já estão cerca de 100 pessoas, a maioria homens. A área, de dois hectares, seria considerada por Inereu Lopes, o local eleito para que os membros da sua igreja esperem a volta de Jesus Cristo.

O sítio, Córrego do Paraíso, abriga os fiéis em barracas de lona. Os homens trabalham no esquema de mutirão para a construção de moradias capazes de abrigar todos os irmãos do Tabernáculo.

Informações dão conta de que em Ecoporanga estariam sendo construídas, além das moradias, um grande restaurante para as refeições coletivas e um parque para as crianças.

Atualmente, a igreja mantém seu templo, com capacidade para cerca de mil pessoas, e um prédio com 53 quitinetes em Santa Teresa, Vitória. O local é totalmente fechado – monitorado por câmeras, 24 horas – e só permite o acesso dos fiéis. Atrás do prédio, a igreja já teria adquirido outra casa, que segundo a vizinhança custou R$ 45 mil. A mesma vizinhança afirma que o pastor já teria manifestado o interesse em adquirir outros imóveis na região.

Justiça autorizou inspeção

Não fosse a ordem judicial que autorizou a inspeção da Igreja Tabernáculo Vitória, ontem à noite, por membros do Ministério Público, do Juizado da Infância e da Juventude e do Conselho Tutelar de Vitória, ninguém, além dos fiéis da igreja, saberia que o pastor-presidente Inereu Vieira Lopes se encontrava no local. O homem se nega a receber a imprensa, comportamento adotado pelos demais membros. Ontem, ele era um dos poucos homens que se mantinham no interior do prédio, no bairro Santa Teresa, na Região de Santo Antônio. No local, predominam mulheres e crianças. Vizinhos dizem que, antes da divulgação pela imprensa de fatos relacionados com a igreja, era possível ver Inereu e seu filho Tiago circulando com seus carros. O pastor teria uma caminhonete Ranger, e seu filho, um Polo.

Entenda o caso

· A igreja. Foi fundada pelo pastor Inereu Vieira Lopes, e sua sede fica no bairro Santa Teresa, na Grande Santo Antônio, em Vitória. Em 1980, a igreja ficou instalada por dois anos na Ilha de Santa Maria, também na Capital. Depois, ficou em um prédio maior, na Vila Rubim. Em 1990, o pastor iniciou uma campanha entre os fiéis, e a atual sede do Tabernáculo foi construída

· O condomínio. Um prédio foi construído ao lado da igreja. Várias quitinetes abrigam 250 pessoas. Há um outro condomínio, o Sítio Córrego Paraíso, em Ecoporanga. Lá, os fiéis esperam assistir à volta de Cristo

· O pastor. Inereu Vieira Lopes tem 56 anos, é casado e pai de três filhos. Segundo o site da igreja, www.tabernaculovitoria.org, ele converteu-se com a ajuda de um casal de missionários batistas

· A missão. Inereu diz, no site, que seu objetivo é propagar o Evangelho de Jesus, dentro da visão profética de William M. Branham, ministro de igrejas neopentecostais norte-americanas, que define como “o profeta enviado de Deus para esta era final”

Crianças da igreja se isolam na escola

O silêncio, adotado pelos freqüentadores da Igreja Tabernáculo Vitória, atinge a todos os fiéis, independente da idade e do local. Até as crianças e os adolescentes da comunidade não costumam conversar com pessoas que não façam parte do grupo. Na escola, a postura é a mesma, dentro e fora da sala de aula.

“Eles não questionam nem os professores durante os exercícios. Mas são excelentes alunos”, afirma Teresa Andrade, diretora da Escola Municipal Mauro Braga.

As 20 crianças que estudam no local se isolam dos demais alunos. “Durante o recreio, só andam entre elas. Não participam das demais atividades”, explica a diretora. As meninas, como característica, costumam usar saias abaixo do joelho.

Todos são levados por suas mães até a escola. Elas também não falam com ninguém. Além das saias, as mães ainda usam camisetas com dizeres religiosos e com a imagem do pastor Inereu Vieira Lopes.

Segundo a Secretaria Municipal de Educação, há jovens dessa comunidade matriculados em mais três escolas: Alberto Almeida, Alvimar Silva e Amilton Monteiro da Silva. Todas em Santo Antônio. A secretária disse ainda que, no último mês de julho, cerca de 20 famílias, em apenas uma semana, procuraram por vagas em escolas da região.

A expectativa é que essa procura aumente ainda mais no ano que vem. “Temos uma lista de espera com pelo menos 20 jovens”, conta a diretora. Todos os alunos que entraram neste ano, segundo Teresa, não são da região. “Há pessoas até de Belo Horizonte e Betim (Minas Gerais)”, afirma

Jovens fiéis podem estar sem estudar

A diretora da Escola Municipal Mauro Braga, Teresa Andrade, acredita que alguns jovens que moram na comunidade da igreja estejam fora das escolas. “Neste ano, muitas famílias me procuraram pedindo vagas. Mas, em alguns casos, apenas um dos filhos conseguiu entrar. Deve haver gente de fora, sem estudar, esperando por vaga para o ano que vem.” A diretora acredita nisso porque todos os alunos da escola que pertencem à comunidade moram nos apartamentos. “Os outros devem estar sem estudar”, aponta.

Pastor também deixou família e foi morar na comunidade

Depois de 36 anos de casamento, que lhe deu três filhos, Sandra Lopes, 58 anos, se viu numa situação que nunca poderia imaginar: seu marido, o pastor-presidente da Igreja Tabernáculo Vitória, Inereu Vieira Lopes, arrumou as malas e saiu de casa. Foi viver em outro lugar: a comunidade que ele mesmo fundou. Ontem, Sandra falou com a reportagem da Gazeta em sua casa, na Capital. Gentil, ela abriu seu coração ao falar da realidade de seu casamento que hoje, a coloca na condição de separada. Não quis se aproximar do portão, ficou distante. E esclareceu que não falaria sobre a comunidade. Mas recebeu a equipe com simpatia e, ao final da conversa, despediu-se mandando um beijo. Confira entrevista:

A senhora e o pastor Inereu separaram-se?

Sim, mas eu quero deixar claro que não deixei meu marido. Eu gosto muito dele. É isso, eu gosto dele… Por mim estaríamos juntos. Estou triste.

Algumas pessoas comentam que o pastor Inereu não era tão radical, que sua mudança de comportamento veio acontecendo no último ano…

Sim. Acho que foi… Não há uma explicação certa. Ele saiu brigado de casa. Arrumou suas coisas e foi para a comunidade. Eu não quis e pedi para não ir. São 36 anos de casamento. Foi em dezembro do ano passado.

Vocês se comunicam?

Há muito tempo ele não aparece, mas com certeza não deixa faltar nada em casa. Também não telefona, só eu ligo. Não vou lá porque sinto que ele não me quer por perto. Mas tenho esperança de que ele vai voltar para casa.

Outros fiéis devem se juntar para o ‘dia do rapto’

Fiéis ligados à doutrina pregada no Tabernáculo Vitória estariam prontos, em João Neiva, no Norte do Estado, para se juntar aos que estão vivendo na sede da comunidade na Capital. Segundo familiares, as pessoas estão se desfazendo de seus bens desde abril, quando o pastor Inereu Vieira Lopes teria anunciado que “o dia do rapto” estaria chegando. A expressão seria uma alusão a um arrebatamento dos fiéis aos céus.

O operador de tratamento de água Carlos Humberto Gabriel, 41 anos, está tentando há meses rever os dois filhos, que estão vivendo na sede da igreja Tabernáculo Vitória desde maio. Ele conta o drama de não ter percebido que o que parecia uma simples crença se tornaria num grande sofrimento.

“Eles se reuniam para ver fitas com a pregação do pastor. Nunca fui contra. Isso acontece há uns 10 anos. Que eu me lembre, Inereu veio a João Neiva só uma vez. Falavam que era uma igreja, mas o lugar não tinha 30 m2. Depois que ele começou a falar no ‘dia do rapto’, as pessoas endoidaram”, conta.

Os primeiros a irem para Vitória foram os filhos do operador. Depois, veio a mulher. “Ele disse que Deus havia dito que não era hora de ela ir. Para mim, ele faz isso porque as pessoas ainda não conseguiram vender tudo”, opina.

A palavra “rapto”, citada pelos familiares de João Neiva, também estampa camisetas dos fiéis que vivem no condomínio fechado em Santo Antônio.

Quem não consegue vender tudo para ficar entre os que serão salvos amarga profunda frustração, como é o caso de uma moradora da cidade, sobrinha do pastor Anésio Paula de Oliveira. “Ela fez uma casa no terreno do irmão e só podia ir à reunião se vendesse o imóvel, mas não conseguiu. Depois disso, ficou fora de si, ficou até internada”, contou Gabriel.

Ontem à tarde, o Conselho Tutelar de João Neiva continuava tentando obter informações sobre a filha do operador, que tem 16 anos, e pode estar fora da escola. “Estou tentando saber o nome da escola em que ela está matriculada, mas ainda não consegui”, afirmou a coordenadora do conselho, Rosiane Nieiro Lemos Favarato.

Para requerer na Justiça o direito de ver os filhos, Gabriel precisa de um advogado, mas, segundo Rosiane, o conselho está sem defensor público no momento.

Ex-membro diz que túnel liga templo a escritório do pastor

Um ex-membro da igreja Tabernáculo Vitória, que prefere não ter o nome divulgado, ajudou na construção do templo e revela que embaixo do salão da igreja há um túnel com saída direta para o escritório do pastor. “Ele tem 50 metros de comprimento e 2,5 metros de largura. É pelo túnel que Inereu e seus assessores de confiança passam para ir até o escritório dele. Eles não querem ser vistos. Inereu vive igual a Osama Bin Laden”, detalhou o ex-seguidor do pastor, citando o terrorista. Segundo o ex-membro do ministério, a construção do túnel foi possível, porque a igreja foi feita em cima de uma pedra, que teve de ser escavada para continuidade à obra.

Iema ainda não liberou construção

Nova Venécia. Técnicos do Instituto Estadual do Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Iema) deverão vistoriar nos próximos dias o Sítio Córrego do Paraíso, em Ecoporanga, na Região Noroeste do Estado. No local, está sendo construído um condomínio para abrigar integrantes da Igreja Tabernáculo Vitória.

O sítio é uma área de dois hectares, localizada nas proximidades de uma reserva florestal. Ao que tudo indica, as obras na área são irregulares, já que o órgão estadual não expediu nenhum pedido de licenciamento em nome da Igreja Tabernáculo Vitória ou mesmo nos nomes do pastor Inereu Vieira Lopes ou do proprietário do sítio, Daniel Machado.

A informação é da assessoria de imprensa do Iema, que, assim que constatou o problema, fez a denúncia ao setor de fiscalização.

Nos registros do Iema, só está uma carta-consulta enviada pela Igreja Tabernáculo, pedindo informações sobre os procedimentos legais que deveriam ser tomados para a liberação do projeto. Os técnicos do órgão enviaram o material solicitado no dia 30 de agosto. Depois dessa data, os representantes da igreja não mais se manifestaram.

Se no âmbito estadual o projeto da Igreja Tabernáculo Vitória ainda não estaria aprovado, no âmbito municipal o alvará de licenciamento já foi expedido. Na tarde de ontem, o secretário de Meio Ambiente, Denivaldo Caldeira, confirmou que o proprietário do sítio, Daniel Machado, protocolou o pedido de licenciamento para a construção do condomínio no dia 5 de agosto. Na ocasião, Machado teria sido alertado sobre a necessidade da vistoria do Iema.

Obras a todo vapor no Norte do Estado

As obras no sítio do Tabernáculo Vitória, em Ecoporanga, continuam. Os cerca de 100 integrantes da igreja estão cercando a área e roçando a pastagem. Desde o inicio desta semana, um trator está abrindo uma estrada em uma das laterais do terreno. Já existe uma grande clareira no setor mais alto do sítio, onde deverão ser construídos o condomínio e a sede da igreja.

Obra embargada desde o ano passado

A obra da Igreja Tabernáculo Vitória em Santo Antônio foi embargada pela Prefeitura da Capital desde o ano passado. Nenhuma das moradias construídas no local possui habite-se.

Um primeiro pedido de regularização da obra foi feito, de acordo com o secretário de Desenvolvimento da Cidade, Kleber Frizzera, mas foi negado pela prefeitura por estar fora das normas do Plano Diretor Urbano (PDU).

“Depois, eles entraram com outro processo de regularização, agora pelo PRE (Programa de Regularização de Imóveis), mas ainda estamos analisando. Foi feita uma primeira vistoria, mas agora os engenheiros vão até o local para verificar se a obra está dentro das normas de segurança e salubridade”, afirmou Frizzera.

No local, existem, segundo a Sedec, além da igreja, 53 apartamentos, uma cozinha e um alojamento com capacidade para aproximadamente 30 pessoas. Logo após a visita dos engenheiros, a prefeitura vai definir se a obra será regularizada ou não.

Vistoria

Ontem, o chefe da fiscalização do Conselho Regional de Engenharia, Agronomia e Arquitetura (Crea-ES), Flávio Lobato La Rocca, acompanhado de três técnicos do setor, esteve na Igreja Tabernáculo Vitória e garantiu que não foi constatada irregularidade.

“Tudo o que foi registrado no Crea, desde que a obra foi fiscalizada em 1992, corresponde ao que foi executado”, afirmou La Rocca.

A fiscal Rosiane Aparecida disse que não foram verificados acréscimos de construção não-licenciados e que foram repassados pelos responsáveis pelo prédio, durante a fiscalização, documentos de Anotação de Responsabilidade Técnica (ART) de responsabilidade técnica, projeto arquitetônico, e de prevenção e combate a incêndio.

O Crea, porém, verificará outros documentos da igreja e da habitação coletiva construída em anexo.

Comerciante quer impedir a ida da filha para comunidade

Mais uma história de confusão em família no caso da Igreja Tabernáculo. A comerciante Marlene Sales, 44 anos, está em uma luta desesperada para impedir que a filha dela, Rayani Sales Guedes, 20, que está com 15 dias de resguardo, vá para a comunidade, localizada no bairro Santa Tereza, Vitória.

Os fiéis estão vendendo todos os seus bens para viverem confinados em um prédio de quitinetes. Eles desvinculam-se de suas famílias, na medida em que são proibidos de receber visitas.

O drama de Marlene começou na noite de quinta-feira, quando a sogra de Rayani foi buscá-la, com a bebê recém-nascida. O genro da comerciante, Edimilson Martins, 20, que está desempregado, teria que voltar para as obras do sítio em Ecoporanga, onde o Tabernáculo constrói um condomínio fechado.

“A mãe de Edimilson chegou aqui dizendo que meu genro tinha que voltar para o interior e que minha filha não poderia ficar aqui. Teria de ir morar na igreja. Não deixei de jeito nenhum. Armei o maior barraco. Não criei sozinha minha menina para vê-la refém de um pastor louco. E esses dois estão decididos a ir com a igreja”, diz Marlene.

A briga ficou maior quando a comerciante soube que sua neta não teria um lugar confortável para ficar na comunidade e que o casal pretendia vender os móveis e os eletrodomésticos que Marlene ainda não terminou de pagar. “Montei uma casa inteira para eles. Ninguém vai embora”, disse a comerciante.

“Eu quero ir para a comunidade. Mãe, você não pode impedir”
Rayani Sales Guedes – Membro da Tabernáculo Vitória. Ela teve uma filha há apenas 15 dias

Promotores querem que líder de igreja abra seu sigilo bancário

O Ministério Público quer que o pastor Inereu Vieira Lopes, líder da Igreja Tabernáculo Vitória, autorize a quebra do seu sigilo bancário. Foi o que propuseram os promotores Zulmira Bowen e Jerson Ramos de Souza, que com um mandado de averiguação concedido pelo juiz da Infância e da Juventude de Vitória, Paulo Luppi, entraram ontem na sede da Igreja Tabernáculo Vitória, no bairro Santa Teresa, na Região de Santo Antônio, na Capital.

Acompanhados de técnicos da Vara da Infância, do Conselho Tutelar, e de policiais, os promotores saíram do prédio, onde existe um templo e mais de 50 quitinetes que abrigam os fiéis, com pelo menos duas certezas: aquelas pessoas temem e reverenciam o pastor Inereu; e é necessário investigar a fundo o que acontece na instituição religiosa que ele comanda.

A motivação para essa investigação é o fato de membros do Tabernáculo terem sido orientados pelo pastor Inereu Lopes a doar todos os seus bens à igreja, indo morar juntos, numa espécie de condomínio fechado.

Segundo os promotores, Inereu Lopes pediu um tempo para pensar na proposta de abrir seu sigilo bancário, embora, de imediato, tenha dito que não haveria problema. “O pastor não relutou, mas disse que estava sendo pressionado, principalmente pela imprensa”, disse a promotora Zulmira Bowen.

Durante a conversa, para justificar a doação de bens o pastor citou a Bíblia, em Atos 2, onde se lê: “Todos os que criam estavam unidos e tinham tudo em comum”, e também “…vendiam suas propriedades e bens e os repartiam por todos, segundo a necessidade de cada um”.

Os promotores disseram que viram sinceridade nos membros da igreja com quem mantiveram contato, em relação ao fato de terem doado seus bens e decidido morar na igreja.

O pastor Inereu Lopes, porém, deve prestar depoimento formal ao Ministério Público, a quem deverá apresentar documentos da igreja, incluindo seus bens materiais.

Além do Ministério Público, o Juizado da Infância cobrou apresentação de documentos relativos à filiação e freqüência à escola das crianças – uma lista com mais de 100 nomes foi entregue ontem – na próxima segunda-feira.

Ontem, às 16h20, antes da chegada dos promotores e após uma fiscalização do Crea, mulheres, crianças e alguns homens, concentrados no pátio do Tabernáculo, dançaram e cantaram, fazendo questão de dizer à imprensa que eram livres.

“Louvado seja Deus. Nós somos livres. Somos o povo a quem Deus libertou. Verdadeiramente somos livres, pois fomos comprados por seu grande amor. Sim, Cristo nos libertou, Quem comanda este reino é Jesus”

Frases proferidas por fiéis da Igreja Tabernáculo Vitória, que ontem à tarde fizeram questão de se exibir para a imprensa

O número

150 – Esse é o número aproximado de crianças e adolescentes que moram no “condomínio” da Igreja Tabernáculo Vitória, segundo lista fornecida ontem ao Ministério Público.

Fonte: Gazeta Online

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