“Dezembrite”: A Melancolia das Festas de Final de Ano

O “Holiday Blues” está ligado a um período específico do ano, como o Natal e o Ano Novo, que está mais associado a fatores psicossociais e emocionais.

Homem idoso pensativo sentado perto de uma árvore de Natal iluminada em casa (Foto: Canva IA)
Homem idoso pensativo sentado perto de uma árvore de Natal iluminada em casa (Foto: Canva IA)

“Dezembrite” é um termo popular que captura a peculiar sensação de melancolia que muitas pessoas experimentam durante o mês de dezembro. Este período, apesar de ser associado a celebrações e alegria, paradoxalmente traz consigo um sentimento de tristeza para alguns. Esta melancolia, conhecida como “Holiday Blues”, é o foco principal deste artigo.

A Melancolia de Feriado ou Melancolia de Final de Ano (“Holiday Blues”) é uma condição psicológica que, embora apresente sintomas de depressão, difere significativamente em causa, duração e abordagem de tratamento.

O termo “Holiday Blues” refere-se a sentimentos de tristeza ou depressão que surgem em feriado e especialmente durante as festas de fim de ano. A palavra “blues” neste contexto é significativa, pois o blues é um gênero musical que se originou nas comunidades afro-americanas dos Estados Unidos. Esta forma de música expressa sentimentos de tristeza, desilusão e introspecção, muitas vezes surgindo de experiências de adversidade e luta, como a luta contra a escravidão e a segregação. O blues é, portanto, um canal emocional poderoso para expressar sofrimento e melancolia.

A comparação entre o “Holiday Blues” e outros gêneros musicais que exploram temas de tristeza é bastante apropriada. Em Portugal, o gênero musical conhecido como Fado é conhecido por suas melodias melancólicas e letras que frequentemente falam de saudade, destino e perda. No Brasil, o Chorinho e a mais recente “Sofrência” também são gêneros que expressam emoções de tristeza, saudade e dor amorosa. Esses estilos musicais, assim como o blues, são expressões culturais que permitem às pessoas explorar e expressar sentimentos de tristeza e melancolia, que são universais à experiência humana.

Portanto, o “Holiday Blues” (Melancolia de Feriado) captura, em sua nomenclatura, a essência do sentimento que ele representam. A tristeza inerente à melancolia do “Holiday Blues” é refletida não apenas em seu nome, mas também nas formas culturais e musicais que expressam emoções semelhantes em diferentes partes do mundo.

“Holiday Blues” (Melancolia de Feriado ou Melancolia de Fim de Ano)

Os sintomas do “Holiday Blues” incluem tristeza, ansiedade, estresse e sentimentos de solidão. As causas são variadas e podem incluir pressões sociais e financeiras, lembranças de entes queridos falecidos, expectativas não atendidas durante as festas, e o contraste entre a alegria idealizada das festas e a realidade pessoal.

O “Holiday Blues” é geralmente temporário e tende a resolver-se após a temporada de festas. O tratamento pode envolver estratégias de autocuidado, como exercícios físicos, tempo dedicado a hobbies, e conexão com amigos e familiares, e somado a uma terapia de curto prazo pode ser muito benéfica.

O “Holiday Blues” está ligado a um período específico do ano, como o Natal e o Ano Novo, que está mais associado a fatores psicossociais e emocionais. Os sintomas podem ser aliviados com medidas de autocuidado e suporte social.

O “Holiday Blues” pode ser analisado à luz da teoria psicanalítica de Freud sobre luto e melancolia. Esta abordagem oferece uma perspectiva valiosa para entender as complexidades emocionais e psicológicas subjacentes a estas condições.

Segundo Freud, a principal diferença entre luto e melancolia reside no objeto da perda e na reação do ego a essa perda. No luto, a perda é clara e reconhecida (como a morte de um ente querido), e o processo envolve a dor consciente e a gradual aceitação dessa perda, permitindo ao indivíduo eventualmente se recuperar. Em contraste, na melancolia, a perda é muitas vezes inconsciente ou simbólica (como a perda de um ideal, uma oportunidade ou um aspecto de si mesmo), e o ego volta sua raiva e crítica para dentro, levando a uma diminuição da autoestima e sentimentos de inutilidade, que são características centrais da depressão.

Na obra “Luto e Melancolia”, Freud distingue entre luto, um processo natural de adaptação à perda, e melancolia, uma condição patológica.

Na perspectiva de Freud, os sintomas como a tristeza profunda e a perda de interesse podem ser entendidos como uma expressão da raiva interna voltada para o próprio eu, decorrente da incapacidade de processar adequadamente a perda simbólica.

 O “Holiday Blues”, pode ser mais diretamente relacionado ao luto no sentido freudiano. As festas de fim de ano podem reacender lembranças de perdas reais (como entes queridos falecidos) ou de ideais e expectativas não realizadas, desencadeando um processo de luto. Este luto, no entanto, é frequentemente complicado pela pressão para se sentir feliz e festivo, o que pode intensificar a tristeza e a solidão.

A melancolia (que é considerado luto segundo Freud) no caso do “Holiday Blues” pode ser vista como uma manifestação da ambivalência em relação às próprias expectativas e desejos frustrados. Freud salienta que na melancolia, ao contrário do luto, o indivíduo não consegue claramente identificar a perda, o que pode ser especialmente verdadeiro no caso de sentimentos difusos e melancólicos associados às festividades.

A terapia psicanalítica poderia focar na resolução de conflitos relacionados ao luto e na exploração das expectativas e ideais em conflito com a realidade. O objetivo seria alcançar uma maior compreensão e aceitação dos sentimentos ambivalentes que emergem durante as festividades.

Para aqueles que são afetados pela “dezembrite”, a teoria freudiana sobre o luto e a melancolia oferece uma possibilidade valiosa para entender a melancolia de feriado no final de ano (“Holiday Blues”). Ao abordar as raízes emocionais e psicológicas destas condições, a psicanálise pode fornecer caminhos para uma compreensão mais profunda e um tratamento mais eficaz.

Referências

FREUD, S. (1917 [1915]) Luto e melancolia. Edição Standard Brasileira das Obras Completas de Sigmund Freud, vol. XIV. Rio de Janeiro: Imago, 1996.

ROUDINESCO, E.; PLON, M. Dicionário de psicanálise. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1998.

Tania Rivera, Luto e melancolia, de Sigmund Freud (https://www.scielo.br/j/nec/a/SKPG96FFGB6qtfGzgHkTpkP/?lang=pt).

Helena Chiappetta, Trabalhar o Luto e a Melancolia, de Sigmund Freud (https://folhagospel.com/colunistas/trabalhar-o-luto-e-a-melancolia/)

Helena Chiappetta, Luto e Melancolia, de Sigmund Freud (https://folhagospel.com/colunistas/luto-e-melancolia/)

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Helena Chiappetta
Maria HELENA Barbosa CHIAPPETTA é Psicanalista Clínica pela ABRAPSI. É Psicóloga Clínica (CRP - 02/22041), é também Neuropsicóloga. É Avaliadora Datista CORETEPE (CRTP-1041). Tem Especialização em Psicopedagogia Clínica e Institucional, e em Ciências da Religião; Licenciatura em Filosofia e em Pedagogia, além do Bacharelado em Teologia. É Bacharelanda em Psicanálise, Pós-graduanda no curso de Arteterapia, Pós-graduanda no curso de Psicanálise, Psicopatologia e Saúde Mental, Pós-graduanda em Terapia Familiar. Atualmente é Docente no SEID Nordeste e SEID Uberlândia. É Professora Convidada no Curso de Formação em Psicanálise da SNTPC. Tem experiência como docente de Hebraico Bíblico, Psicanálise e Teoria Analítica, Educação Religiosa, Artes, Teologia com ênfase em Ciências da Religião Aplicada e Liderança Institucional. Dedica-se ao estudo das neuroses atuais. É colunista deste Portal Folha Gospel. E-mail: [email protected] Instagram profissional: @h.chiappetta
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