Como quando iniciei a pregar, aos 18 anos de idade, muita gente começou a se converter, em todos os lugares: na rua, nas praças, nas esquinas, nas escolas, nas universidades, nas favelas, nos buracos, nas barrancas, nas rodas sociais, e até entre as autoridades; e, sendo eu ainda um menino, muitos pessoas, então, por causa disso, me diziam que eu tinha o dom de evangelista.
Além disso, como me sentia muito livre no rádio e na televisão, também, mais do que nunca, me diziam: Você é evangelista de massas!
Assim, quem quer pregasse e pessoas se convertessem, na hora o tal pregador seria visto como um evangelista.
Na realidade o NT fala do dom do evangelista. Mas o exemplo mais notado pela explicitação do dom de evangelista é Felipe, o diácono, conforme dele se diz no livro de Atos dos Apóstolos.
Entretanto, pouco se fala do dom em outras pessoas.
Seria por que não houvesse mais evangelistas? Ora, é claro que não. O que havia era que quem era evangelista, apenas era…; e sabia que era pelo resultado simples na vida.
Uma pessoa com tal dom é apenas aquela pessoa desinibida e intrépida no anunciar a Palavra, e que, além disso, fala e ensina livremente aonde quer que esteja, tão somente as oportunidades se mostrem favoráveis ao exercício da pregação ou conversa, porém, sempre com bom-senso.
Mas tal dom não era algo que, em havendo, fosse objeto de algum tipo de ação marqueteira a fim de se reunir gente para que o Evangelista falasse.
Eu, entretanto, que fui identificado no inicio como um evangelista, apenas porque eu pregava e muitos criam, embora fizesse isso espontaneamente e em todos os lugares, logo, animado pelos irmãos e também pelo ministério do Billy Graham nos Estados Unidos, passei a pregar em Ginásios, Estádios, Teatros, Clubes, Centros de Convenção, e em todos os lugares nos quais grandes massas eram reunidas e eu era convidado para pregar como evangelista.
Era o meio da década de 70 e ainda havia muita pureza na fé evangélica, mesmo que já existissem os primeiros sinais de “loucura” aparecendo longe no horizonte.
Dez anos depois disso, já na década de 80, muitos queriam se tornar evangelistas. Começava a onda de evangelistas itinerantes e buscadores de oportunidades de subirem em um palco e pregarem para as “massas”.
A ênfase passou a ser nos números…
Foram sumindo os evangelistas e surgindo os evangelasticos. Esses eram os falsificadores de números… E mais: eram os que saiam dizendo: “Ontem o Senhor me usou para salvar 150 de uma paulada só… Aleluia!”
Ora, tanto não se sabia quem havia sido salvo [nunca se sabe], como também não havia no lugar nem 150 pessoas ouvindo, quanto mais sendo salvas… Era o inicio do ministério do evangelastico.
Então, muitos me procuravam para saber como eu fizera para chegar ali…
Era patético para mim, pois, eu mesmo não sabia o que era “estar ali”; e, menos ainda tivera qualquer preocupação quanto a chegar a qualquer lugar, posto que eu apenas pregasse por me ser impossível, em qualquer lugar, havendo chance, não pregar.
Lembro-me bem do candidato à evangelista que me procurou na década de 80, em São Paulo, para me dizer que estava com cartas de recomendação de grandes evangelistas americanos, e que um deles havia prometido bancar uma campanha de outdoors a fim de divulgar a chegada do novo evangelista.
Ele queria saber se com os outdoors ele poderia ser reconhecido como um evangelista…
Uma forte chuva começou a cair lá fora… Relâmpagos. Vento. Muita água e muitos trovões, de repente.
E o moço, de minha idade, me perguntava: Você acha que com cartas de recomendação e com muita divulgação eu me tornarei um evangelista conhecido?
“Você já viu um anuncio de chuva, de trovão, de relâmpago e de tempestade em outdoor?” — indaguei.
“Não precisa, não é? Todo mundo vê!” — disse ele.
“Então, meu irmão, vá chover e relampejar!…” — respondi.
Ela nunca relampejou e nem trovejou, mas tentou os outdoors, até que foi virar pesquisador…
Na realidade, o que vi logo era que o tal ministério do evangelista se tornara algo mais importante do que o dom do evangelista.
Foi o ministério de evangelista, nos moldes americanos, o que veio a corromper o dom de evangelista.
Ninguém mais pregava sem auditórios cheios…
Pregar na rua era mico… Era coisa de evangelista pobre… Era atividade de quem não dera certo reunindo muita gente…
Logo depois o ministério de evangelista passou a ser cobiçado por outras razões, especialmente políticas e financeiras.
Sim, pois, supostamente, havendo muita gente, há espaço para que se levante muito dinheiro e se tenha muito poder político, posto que gente seja voto.
Assim a desgraça se instalou…
Ontem eu fui até a padaria local, aqui perto de casa, como faço todos os dias, e também como sempre, várias pessoas vieram falar comigo; algumas apenas para falar, outras para saberem o meu endereço de pregações, e outras ainda querendo saber mais, ou fazendo comentários sobre o que eu havia pregado domingo passado na televisão local.
Saí dali e fui comprar frutas. Lá uma pessoa começou a conversar comigo sobre “netinhos”… Logo a conversa foi para paternidade… Então, quando vi, já estava pregando, porém sem falar em Jesus, apenas expondo o ensino do Evangelho. Umas senhoras ouviam de lado, caladas, porém totalmente atentas… Terminei, agradeci e fui saindo… Elas, porém, disseram: Obrigado pela palavra!
Voltei pensando em como aonde quer que se vá com a Palavra no coração, em todas as situações surgem oportunidade para pregar; embora, só saiba usar tais oportunidades quem não as veja como “oportunidades”, mas apenas como movimentos livres da vida.
O único modo de ser evangelista sem virar evangelastico ou ainda um ser que exista para seduzir pessoas para a “igreja” [“evangelista”], é sendo e fazendo como Jesus.
Jesus nunca chegou falando de Jesus nas praças. Nunca chegou gritando: “Creiam em mim! Eu sou o Filho de Deus! Eu sou o único Caminho para o Pai!”
Ele é Aquele que chegava de modo simples e discreto, que fugia de ser divulgado de modo frenético, que proibia que falassem o que Ele havia feito, e, acerca de Quem se diz que Ele não gritaria nas praças e nem faria propaganda de Si mesmo.
Jesus não evangelizava em nome de Jesus, mas em nome do Pai e de Seu amor por todos os homens.
Sim! Ele falava do amor do Pai, ensinava o que era Vida e Caminho em Deus, e, sobretudo, orava com os angustiados e doentes.
Você diz: “Jesus não chegava falando de Jesus porque Ele estava lá; e Ele era Jesus!”
Ora, pergunto: Mas em que qualquer coisa mudou?
Afinal, falar de Jesus só vale quando Ele esteja presente. E o modo de Ele estar presente é através de você. Portanto, faça como Ele. Sim! Pois quando você chega, Ele chega. E, assim, com Ele presente em você, não fale Dele, mas faça como Ele: ensine o Evangelho e, então, ajude a quem pedir, pois, quando é assim, muitos vêm, e nem sentem que estão vindo.
Jesus não falava de Jesus, falava do Evangelho; posto que o Evangelho seja Jesus.
Os crentes, entretanto, sentem como se estivessem pecando ao tratar tudo como Jesus tratava; pois, pensam: “Estou negando a fé não chamando logo as pessoas para “aceitarem Jesus””.
Todavia, quando voltarem a ser amigos dos amigos e abertos à vida, tendo alegria nos encontros humanos, sendo capazes de não olhar pessoas como candidatas à conversão, mas sim como gente amada de Deus — então, na hora começarão a ver como as pessoas que antes não respondiam à pregação do evangelastico, naturalmente responderão às conversas do amor sábio do evangelista.
Ser um evangelista é ser um portador de Boas Novas em amor e alegria, mas sem tentativa de seduzir pessoas para os bancos da “igreja”.
O verdadeiro evangelista apenas semeia a palavra em amor livre, natural e espontâneo.
Afinal, tem que ser como Jesus.
Ora, Ele disse: “Assim como o Pai me enviou, também eu vos envio… Permanecei no meu amor!”
É assim que é. E o que não for assim, creia: não é.
Nele, que é a Boa Nova; sim, a Melhor Notícia,
Caio