“Acautelai-vos, que ninguém vos engane; porque MUITOS VIRÃO em meu nome, dizendo: Eu sou o Cristo (Eu sou o UNGIDO), e ENGANARÃO A MUITOS” (Mateus 24.4-5)
Há uma epidemia espiritual silenciosa contaminando o coração da igreja contemporânea. Não se trata de um vírus biológico, mas de uma mutação teológica que distorce a essência do Evangelho. Jesus alertou: falsos cristos (ungidos) surgiriam, não com chifres e rabos, mas com discursos sedutores, imitando a linguagem da piedade enquanto semeiam o veneno da divisão. Hoje, esses anticristos não se apresentam como monstros declarados, mas como “gourmets” (refinados, anti sistema, influenciadores, podendo ser até high-tech) ou “raiz” (agressivos, caluniadores, perseguidores, políticos com discurso antipolítica). Ambos, porém, compartilham o mesmo DNA: o desejo de ocupar sutilmente o lugar de Cristo, corrompendo Sua mensagem com ideologias que substituem o amor pelo ódio e a graça pelo legalismo.
O Anticristo gourmet: o “bonzinho” que envenena
A palavra anticristo (ἀντίχριστος) no grego não significa apenas alguém contra Cristo, mas alguém no lugar de Cristo. O Anticristo Gourmet é mestre nisso. Ele não grita “Heil Hitler!”; ele sussurra “Deus abençoe!” enquanto promove agendas que contradizem os valores básicos do Reino. Veste-se de conservador, cita versículos fora de contexto e usa a Bíblia como enfeite para validar discursos de exclusão, ódio disfarçado de “defesa da família” ou fake news compartilhadas como “oração de guerra”. Ele age como uma espécie de Hitler Gourmet, suavizado na embalagem (na capa), mas amargo no conteúdo. Seu lema é cancelar em nome de Deus. Persegue todos que pensam diferente, difama líderes sob o pretexto de combater heresias e transforma redes sociais em tribunais farisaicos. Esquece que o servo do Senhor não deve contender, mas ser brando para com todos (2 Timóteo 2.24). Jesus não cancelou a mulher samaritana; Ele a transformou em missionária (João 4). O Anticristo Gourmet, porém, prefere apedrejar.
O Anticristo raiz: O remake tirânico do passado, mas com a Bíblia na mão
Enquanto o Gourmet é sutil, o Anticristo raiz é descarado. O Anticristo raiz não suaviza contextos para revelar seu intento. Ele resgata a retórica das tiranias, glorifica lideranças fortes, defende soluções milagrosas, sempre aponta culpados para problemas sociais, como se o Evangelho fosse compatível com perseguição e ódio ao diferente / inimigos. Pode chegar até ao ponto de até defender judeus como povo eleito, mas ignora que o mesmo Deus que protege Israel ordena: Amareis o estrangeiro, pois fostes estrangeiros no Egito (Deuteronômio 10.19). Seu discurso é inflamado: vocês precisam de uma liderança forte!, ignorando que o único Rei forte que temos não veio para ser servido, mas para servir (Marcos 10.45). Seu discurso é uma colcha de retalhos: discursa a favor do cristianismo, e exalta nações supostamente cristãs, mas esquece que o Reino de Cristo não é deste mundo (João 18.36). Ele não usa suásticas; mas pode usar de um pseudo nacionalismo como propaganda. Não fala em campos de extermínio, mas normaliza discursos que desumanizam “inimigos” — sejam políticos, grupos étnicos ou sociais. Propaga teorias conspiratórias, divide a igreja entre puros e apóstatas e reduz o cristianismo a uma guerra cultural. Esquece que nossa luta não é contra carne e sangue (Efésios 6.12). É o fariseu que fecha o Reino dos Céus aos homens (Mateus 23.13), substituindo o amor ao próximo por lealdade a ideologias. Enquanto Jesus comia com publicanos, o Anticristo Raiz ergue muros e chama isso de “proteção divina”. Enquanto Jesus lavou os pés dos discípulos, o Anticristo Raiz lava as mãos como Pilatos, justificando atrocidades em nome de uma “missão divina”. Vive de contradições: ele condena o Holocausto, mas repete sua lógica ao procurar culpados que “causam nossa decadência” e trata qualquer grupo que não o agrade como “ameaça” — sejam refugiados, opositores ou minorias. Esquece que crimes contra a humanidade não se limitam a genocídios do passado que envolvam apenas um grupo étnico, mas incluem toda forma de ódio sistêmico, mesmo que revestido de um discurso em nome da proteção e da “segurança nacional”.
A conexão bíblica: quando o amor esfria e o ódio aquece
Jesus profetizou: O amor de muitos esfriará (Mateus 24.12). Curiosamente, Jesus diz que nos últimos dias não é a fé que irá diminuir — igrejas lotam, cultos transmitem ao vivo —, mas o amor ágape, aquele que tudo sofre, tudo crê, tudo espera, tudo suporta (1 Coríntios 13.7). Ambos os estilos de anticristos exploram essa carência: o Gourmet, com sua “santidade” performática; o Raiz, com seu “puritanismo” farisaico e seletivo.
João adverte: Quem não ama não conhece a Deus, pois Deus é amor (1 João 4.8). O Anticristo, seja qual for sua versão, nega isso. Ele substitui a cruz por bandeiras, a comunhão por tribos e a misericórdia por julgamentos sumários. É o fariseu moderno que atravessa oceanos para fazer um prosélito, mas o torna filho do inferno (Mateus 23.15).
O Reino de Cabeça para Baixo: antídoto contra os diversos tipos de anticristos
No Reino de Jesus, os valores são invertidos:
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Servir é maior que dominar;
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Amar os inimigos é mais revolucionário que destruí-los;
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A verdade é anunciada com graça, não com granadas verbais (Colossenses 4.6).
Enquanto o mundo clama por salvadores da pátria ou gurus espirituais, o Reino de Cabeça para Baixo nos chama a seguir Aquele que foi pendurado numa cruz — símbolo máximo de um reino que derruba impérios através do amor sacrificial. O Anticristo quer o trono; Cristo quis a cruz.
Vigiar ou seremos ludibriados
Paulo alertou: O próprio Satanás se transfigura em anjo de luz (2 Coríntios 11.14). O Anticristo (ou anticristos) não virá com chifre, mas com hashtags, discursos inflamados e promessas mirabolantes. Cabe a nós, súditos do Reino de Cabeça para Baixo, dentre várias atitudes:
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Rejeitar a idolatria a líderes humanos, por mais “conservadores” que pareçam, mesmo que se vistam de “defensores da fé”.
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Priorizar o fruto do Espírito (Gálatas 5.22-23) sobre o barulho das controvérsias;
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Lutar por justiça sem excluir a misericórdia (Miqueias 6.8);
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Lembrar que o maior ato revolucionário de Jesus foi lavar os pés de Judas, seu traidor.
Enquanto o mundo se divide entre Gourmets e Raízes, nós somos chamados a ser sal da terra e luz do mundo. O Reino de Cabeça para Baixo não avança com ódio disfarçado de zelo, mas com amor que lança fora o medo (1 João 4.18).
Atenciosamente, de cabeça para baixo (mas de olhos bem abertos),
Rev. Estêvão Chiappetta <><