Que falta faz o amor!

Amar envolve dar algo intangível, a falta, da qual emerge o desejo que nunca pode ser plenamente concretizado.

Arte digital por Helena Chiappetta
Arte digital por Helena Chiappetta

A frase “Amar é dar o que não se tem a alguém que não quer”, de Jacques Lacan, expressa uma visão complexa sobre o amor e o desejo na psicanálise. Ela reflete a estrutura fundamental da falta e do desejo humano, conforme Lacan desenvolveu em sua teoria.

Dar o que não se tem

Na psicanálise lacaniana, o sujeito é sempre marcado por uma falta, algo que lhe falta para ser completo. Esse conceito está ligado à ideia de que o desejo humano é estruturado em torno de uma ausência, algo inalcançável ou impossível de possuir. Ao amar, a pessoa tenta oferecer essa falta, ou seja, a falta que ela tem, na esperança de ser reconhecida e aceita pelo outro. Amar, portanto, envolve dar algo intangível, a falta, da qual emerge o desejo que nunca pode ser plenamente concretizado.

A alguém que não quer

O objeto do amor, a outra pessoa, também é movido pela sua própria falta e desejo. Essa pessoa, no entanto, nunca poderá preencher completamente o desejo do outro, pois está envolvida na sua própria busca por realização de desejo e completude. Assim, o amor é dirigido a alguém que, por definição, nunca pode querer ou aceitar completamente esse “presente”, já que ele também está envolto em sua própria estrutura de falta.

Dessa maneira, Lacan expressa a impossibilidade de plena reciprocidade no amor. O amor é sempre uma tentativa de oferecer, ao outro, algo que é fundamentalmente impossível de possuir, e o outro, igualmente, não pode aceitar ou retribuir completamente. Essa visão revela a natureza paradoxal e conflituosa das relações humanas, onde o desejo e a falta ocupam um papel central.

É assim que se desfazem os laços de amor?

A resposta pode ser encontrada dentro da perspectiva de Lacan, como uma reflexão sobre a fragilidade das relações humanas, especialmente as amorosas. Se os laços de amor são formados a partir dessa troca ilusória — dar ao outro algo que não se tem e que o outro, em última análise, não pode ou não quer receber —, então a base dessas relações é, por sua natureza, fantasiosa e instável.

Os laços amorosos se desfazem, quando essa dinâmica de desejo e falta entra em conflito com as expectativas conscientes e inconscientes de cada pessoa. Quando o sujeito percebe que aquilo que ele oferece – a falta – não é aceito (porque o outro não pode ou não quer receber), ou quando se dá conta de que o outro, também, não pode preencher sua falta, este laço começa a se desmoronar.

Nesse sentido, sim, os laços podem se desfazer, a partir dessa impossibilidade de preenchimento mútuo das faltas. As relações se mantêm na tensão entre o desejo e a falta. Quando essa tensão se torna insuportável, ou irreconciliável, o laço amoroso pode romper.

Assim, nessa tensão entre desejo e falta, será que os laços se desfazem ou se enlaçam novamente em outras voltas e reviravoltas?

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Helena Chiappetta
Maria HELENA Barbosa CHIAPPETTA é Psicanalista Clínica pela ABRAPSI. É Psicóloga Clínica (CRP - 02/22041), é também Neuropsicóloga. É Avaliadora Datista CORETEPE (CRTP-1041). Tem Especialização em: Psicanálise, Psicopatologia e Saúde Mental; Terapia Familiar; Arteterapia; Psicopedagogia Clínica e Institucional, e em Ciências da Religião; Licenciatura em Filosofia e em Pedagogia, além do Bacharelado em Teologia. É Bacharelanda em Psicanálise. Atualmente é Docente no SEID Nordeste e SEID Uberlândia. É Professora Convidada no Curso de Formação em Psicanálise da SNTPC. Tem experiência como docente de Hebraico Bíblico, Psicanálise e Teoria Analítica, Educação Religiosa, Artes, Teologia com ênfase em Ciências da Religião Aplicada e Liderança Institucional. Dedica-se ao estudo das neuroses atuais. É colunista deste Portal Folha Gospel. E-mail: [email protected] Instagram profissional: @h.chiappetta
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