Para começo de conversa, acho esse assunto ridículo, até mesmo desnecessário. Só no Brasil é que se faz uma lei impedindo que alguém possa ser biografado sem autorização prévia.
Biografia autorizada é de longe a mais questionável, mais suspeita das biografias. Se a autobiografia já é questionável, a biografia autorizada tende a ser nada mais do que um panfleto, um relato maquiado, sem credibilidade.
Imaginem se Hitler só pudesse ser biografado com autorização dos familiares; Imaginem se Collor ou Maluf pudessem bloquear qualquer livro escrito sobre suas trajetórias políticas. Absurdo. O escritor tem que se sentir absolutamente livre para explorar e investigar a vida do biografado, sem qualquer tipo de amarra ou restrição.
Certamente que o ônus da fidelidade aos fatos está sobre o autor. Se escrever algo que seja inverdade ou se distorcer os fatos de forma injusta, que responda legal e até mesmo criminalmente por isso. Mas, censura prévia, ah, isso de jeito nenhum.
Não deixa de ser curioso e até irônico que Caetano Veloso, Chico Buarque e Gilberto Gil, que tanto foram perseguidos e censurados durante o regime militar, tenham se juntado para lutar contra a alteração dessa lei esdrúxula. Estes e outros nomes famosos formaram o grupo “Procure Saber” que está capitaneando a manutenção da lei atual. Como o mundo dá voltas… é assim tão surreal quanto ver Lula e Sarney posando de aliados…
Personalidades, celebridades, certamente têm direito à privacidade. Mas, eles não são os detentores da história. Vida pessoal e vida pública, carreira, são inseparáveis em alguns casos; é o efeito colateral da fama. Ninguém tem interesse em saber qual é a minha marca de desodorante preferida, mas para alguém como Roberto Carlos, a coisa muda de figura. Até mesmo aspectos irrelevantes como esse ganham uma dimensão infinitamente maior.
O Brasil precisa de uma reforma jurídica urgente. Nosso sistema de leis é uma piada; parece que foi elaborado justamente pelos contraventores, já pensando em deixar lacunas e subterfúgios para uso próprio no futuro. E essa lei é mais um desses absurdos.
Temos que erradicar no Brasil essa mentalidade absurda e paternalista de que alguém tem que aprovar o que podemos ou não podemos ler e ver. O público é que tem que fazer suas escolhas e julgar os produtos. Se uma biografia é mal feita, suspeita, que a critica e o público sejam os juízes; se traz informações errôneas ou mal intencionadas, processo nos autores. Mas, impedir que a história seja contada por diversos e por vezes discordantes pontos de vista, é herança dos tempos nefastos da ditadura. Tempos que não trazem saudade alguma.
Um abraço,
Leon Neto