No mês sagrado do Ramadã, muitos marroquinos não praticantes do islamismo sofrem ao ter que lidar com as pressões sobre quem não segue as regras do período.

Alguns deles, como a psicóloga Btisam Lashguer, criticam “a intolerância social” contra quem não pratica o jejum e o “aumento da agressividade” nas relações sociais durante o Ramadã, mês no qual é proibido comer, beber, fumar e manter relações sexuais entre o nascer e o pôr-do-sol.

“Me sinto presa em uma crença coletiva que não é a minha”, disse Lashguer, de 35 anos, à Agência Efe.

Para a psicóloga, “crer ou não crer deveria permanecer na esfera particular”. Por isso, o Ramadã, que no Marrocos teve início na quinta-feira passada, é segundo ela “um período sintomático de agressão à liberdade de consciência”.

O jejum é o terceiro pilar do islamismo e sua violação durante o Ramadã é a mais punida socialmente – o código penal marroquino prevê pena de até seis meses de prisão.

O sociólogo Abdesamad Dialmi disse à Efe que “o indivíduo é obrigado a cumprir o Ramadã por religião e por lei”, o que explica, segundo ele, que “alguns marroquinos se afastem de seu país neste período”.

“A Constituição marroquina ressalta que o islamismo é a religião oficial, mas diz também que o Estado protege a liberdade religiosa, enquanto o código penal criminaliza a quebra do jejum em público”, aponta Dialmi, para quem “isso representa uma contradição”

Segundo o sociólogo, para alguns marroquinos, “o Ramadã é um mês de múltiplas privações, que conduzem à violência e à raiva de quem considera que a prática do jejum não é obrigatória”.

Em uma pesquisa publicada nesta semana no diário marroquino “Al Bayane”, 48% dos marroquinos entrevistados afirmava que o mais difícil de suportar durante o Ramadã era o cansaço, enquanto 23% apontaram a sede, 8%, a fome, e 6%, a falta de tabaco.

O produtor cultural Munir Keji, que durante o Ramadã prefere viajar a países europeus pelas dificuldades que encontra “para resistir à pressão social”, diz que neste período “a religiosidade das pessoas aumenta e, ao mesmo tempo, sua agressividade”.

“Assim como eu, muitos dos meus amigos vão para a Europa para gozar de sua liberdade sem pressões”, assegura Keji, que há três anos marca suas férias durante o Ramadã.

Já para Khalid Mefadal, muçulmano praticante, “não há nada melhor que passar o Ramadã com a família aqui no Marrocos. Há um ambiente especial”.

“No passado, por motivos de trabalho, estava na Europa durante o mês de jejum e era difícil. Não escutava a chamada para a reza nem encontrava nossa comida típica”, diz Mefadal, que é técnico de som.

Mefadal evita falar sobre os marroquinos não praticantes que viajam para o exterior por vontade própria e considera que “cada um assume sua responsabilidade e o único que castiga é Deus”.

No entanto, em algumas ocasiões, os próprios cidadãos fazem valer a prática das obrigações do Ramadã.

Há dois anos, um homem foi agredido na cidade de Fez por beber água na rua antes da hora da quebra do jejum.

Várias pessoas o arrastaram à delegacia mais próxima e a Polícia o trancou em um calabouço. O homem só foi liberado depois que familiares apresentaram um atestado médico o qual comprovava que era diabético e, por isso, estava isento de jejuar.

No ano passado, a Polícia desarticulou uma manifestação perto de Casablanca na qual o Movimento pela Defesa das Liberdades Individuais, do qual faz parte a psicóloga Lashguer, pretendia romper o jejum para protestar contra a criminalização dessa prática em público.

[b]Fonte: Missão Portas Abertas[/b]

Comentários