Em nota, a igreja católica afirma que a excomunhão foi declarada porque o padre Beto se negou a cumprir o que prometera em sua ordenação sacerdotal

Um dia depois de excomungar o padre Roberto Francisco Daniel, mais conhecido como padre Beto, a Igreja Católica tenta desvincular a relação da pena eclesiástica da defesa que ele fazia dos direitos dos homossexuais pela internet, em declarações, nas aulas e nos sermões das missas. Em nota distribuída pela assessoria do bispado de Bauru (SP), o juiz-instrutor da excomunhão diz que o ato se deu porque padre Beto não obedeceu aos superiores e insistiu em manter um comportamento em desacordo com as regras do sacerdócio. Embora o bispo de Bauru, d. frei Caetano Ferrari, tenha exigido que o padre retirasse da internet os vídeos em que critica a postura da Igreja em relação aos temas sexuais, a nota afirma que o sacerdote não foi excomungado por defender os interesses dos homossexuais porque “isso não é matéria para excomunhão na Igreja”.

O comunicado diz que a pena aconteceu “(…) de modo automático, em virtude da sua contumácia (obstinação) num comportamento que viola, gravemente, as obrigações do sacerdócio que ele livremente abraçou”. A nota completa: “A excomunhão foi declarada porque ele se negou, categoricamente, a cumprir o que prometera em sua ordenação sacerdotal: fidelidade ao Magistério da Igreja e obediência aos seus legítimos pastores”, diz no texto o juiz-instrutor, cuja identificação não foi divulgada pela Igreja, alegando motivos de segurança. O juiz é designado pelo Vaticano e foi nomeado para o caso pelo bispo Caetano.

Padre Beto reagiu à nota com indignação: “Então, um padre pode ser pedófilo que ele não será excomungado só porque obedece aos seus superiores?”, questionou. De acordo com o presbítero, a nota do instrutor é “uma artimanha para tirar o foco da questão, pois hoje, em pleno século 21, a sociedade não tolera mais isso, não tolera mais inquisições”, diz. Padre Beto também negou a versão dada pelo juiz-instrutor de que a excomunhão não tem relação com as declarações em defesa dos gays. “Se fosse realmente isso, o bispo não teria exigido que eu retirasse os vídeos da internet com minhas reflexões sobre o assunto e pedisse perdão.”

“Vejo essa carta como um pedido de socorro numa tentativa desesperada da Igreja de tirar foco sobre uma atitude intolerante que eles praticaram contra minha liberdade de reflexão e pensamento.” “Se não queria saber das minhas reflexões, por que a Igreja gastou dinheiro com minha formação, enviou-me para estudar e fazer doutorado na Alemanha, na mesma universidade em que estudou o papa Bento XVI e frei Leonardo Boff?”, afirma.

[b]’Nem com fogueira'[/b]

Segundo o bispado de Bauru, após a punição religiosa, o eclesiástico enfrentará agora um processo para demissão do estado clerical, quando, então, não poderá mais ser chamado de padre e ficará impedido do exercício do ministério sacerdotal. Durante o processo, padre Beto ainda poderá ser chamado para dar esclarecimentos a um juiz-notário nomeado para reunir provas. Por outro lado, se o clérigo demonstrar arrependimento, a Igreja poderá retirar a excomunhão, mas não a demissão. No entanto, não é esta a intenção de padre Beto. “Não me arrependeria dos meus atos nem que ainda existisse fogueira”, afirma.

[b]Igreja se assemelha a Feliciano, diz padre excomungado[/b]

O padre Roberto Francisco Daniel, o padre Beto, de Bauru (SP), disse que, pelo fato de ter sido excomungado, a Igreja Católica tem comportamento que pode ser comparado ao do pastor Marcos Feliciano (PSC-SP), presidente da Comissão dos Direitos Humanos da Câmara dos Deputados, conhecido por suas declarações preconceituosas contra os homossexuais e negros. Daniel foi excomungado pela Igreja depois de postar na internet entrevistas defendendo o relacionamento entre pessoas do mesmo sexo e bissexuais.

“Essa comparação pode ser feita. Acredito que a Igreja, com essa excomunhão, se equipara ao pastor Feliciano, alguém extremamente dogmático e fundamentalista, que está num cargo onde deveria fazer com que os direitos humanos fossem respeitados, mas ao contrário, ele exclui os direitos das pessoas”, comentou. Segundo padre Beto, tanto a Igreja Católica quanto Feliciano “deveriam exercer o diálogo e não a exclusão”. Para ele, a Igreja foi contra a própria essência do evangelho ao condená-lo por ter defendido os homossexuais.

“A essência do evangelho possui Jesus Cristo como modelo e o evangelho de Jesus Cristo foi exercido com liberdade de expressão e respeito; ele amou as pessoas sem preconceito algum e nunca condenava ou excluía alguém por ser diferente dos outros”, disse padre Beto. Segundo o religioso, pelo comportamento da Igreja em relação à sua excomunhão e às declarações de Feliciano, “as pessoas com tendências diferentes dos heterossexuais, como bissexuais e homossexuais, além de serem vistas com preconceito, são consideradas pecadoras”.

“Cristo não falou nada sobre sexualidade. As expressões sobre os temas sexuais na bíblia representam a mentalidade de uma época em que as pessoas não tinham condições de analisar a bissexualidade ou a homossexualidade. A ciência evoluiu e a Igreja não pode fechar os olhos para o conhecimento humano, não pode ignorar a realidade da existência de uma diversidade sexual”, diz. “A Igreja não pode achar que duas pessoas que se amam, que se respeitam e querem construir um mundo juntos, são pecadoras só porque são do mesmo sexo”, completou. Beto diz que vai conversar com um advogado especializado em direito canônico para se defender.

Em nota distribuída nesta terça-feira, 30, pela assessoria do bispado de Bauru (SP), o juiz-instrutor da excomunhão diz que o ato se deu porque padre Beto não obedeceu aos superiores e insistiu em manter um comportamento em desacordo com as regras do sacerdócio. Embora o bispo de Bauru, d. frei Caetano Ferrari, tenha exigido que o padre retirasse da internet os vídeos em que critica a postura da Igreja em relação aos temas sexuais, a nota afirma que o sacerdote não foi excomungado por defender os interesses dos homossexuais porque “isso não é matéria para excomunhão na Igreja”.

[b]Fonte: Estadão[/b]

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