O retorno ao estado de graça da missa de Pio V, celebrada em latim, como pretende o Vaticano, representa, de um lado, a mão da Igreja estendida aos tradicionalistas, mas também uma complicação da vida religiosa, com a coexistência de dois rituais.

O Papa Bento XVI se prepara para assinar em breve um decreto destinado a facilitar a celebração da missa em latim, com a esperança de pôr fim ao cisma liderado por católicos fundamentalistas adeptos de Monsenhor Lefebvre.

Segundo uma fonte do Vaticano, o Papa está preparando um ‘moto-próprio’ – um documento de iniciativa pessoal e espontânea do próprio Papa – “sobre as relações com os tradicionalistas”, que pedem celebrar livremente a missa em latim, segundo o chamado ritual de São Pio V.

 
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Este ritual havia sido substituído em 1969, durante o concílio Vaticano II, pela chamada missa de Paulo VI.

Atualmente, a missa de Pio V é celebrada pelos tradicionalistas que, com Monsenhor Lefebvre, rejeitaram o concílio Vaticano II. Mas não é apenas uma questão de língua porque a missa de Paulo VI também pode ser celebrada em latim.

Trata-se, na verdade, de duas concepções litúrgicas distintas: a missa de Pio V destaca o sacrifício da Cruz; a de Paulo VI, a palavra (com maior presença do Antigo testamento e dos Evangelhos), a eucaristia e a comunhão, explica o site da diocese de Nanterre.

A missa de Paulo VI, para uma melhor participação dos fiéis, utiliza a língua “local”, o celebrante fica de frente para a assembléia, que dá o beijo da paz; os fiéis podem distribuir a comunhão… todas as coisas que os católicos fundamentalistas rejeitam, estimando que a liturgia desta forma perde seu caráter sagrado.

Para celebrar a missa de Pio V (que foi o 223o papa de 1566 a 1572), o sacerdote deve ter autorização de seu bispo, condição esta que seria suprimida pelo futuro decreto de Bento XVI.

“A missa em latim não é propriedade privada dos lefebvristas; é um tesouro de toda a Igreja”, declarou à revista italiana, 30 Giorni, monsenhor Ranjith Patabendige Don, secretário da Congregação para o Culto Divino.

Esta valorização da liturgia antiga é ardentemente exigida pelos tradicionalistas, mas ela não solucionará senão uma de suas diferenças com a Igreja. Eles rejeitam, com efeito, um dos pilares do Vaticano II, a abertura ao mundo moderno, com suas conseqüências sobre as relações com as outras igrejas cristãs e confissões, o ecumenismo, a modernização da missa.

Em setembro passado, o Vaticano fez um gesto em direção aos mais moderados dos tradicionalistas, autorizando a criação do Instituto do Bom Pastor.

Este, dirigido pelo frade Philippe Laguérie – ordenado por Monsenhor Lefebvre mas que depois se alinhou a Roma -, pretende abrir paróquias “em todos os locais, assim como na França”.

O arcebispo de Paris, Monsenhor Vingt-Trois não quis comentar esta questão das missas antes da publicação do decreto papal. Já o arcebispo de Toulouse, Monsenhor Le Gall, estima que “a convivência dos dois rituais será dificilmente administrado”.

“Liberalizar este ritual extraordinário (a missa de Pio V em relação à de Paulo VI que é o ritual “ordinário”), pode exacerbar as oposições e também desencorajar os que trabalham generosamente em favor da liturgia”, estima.

Mas, já em 1989, o então cardeal Ratzinger, escrevia que “a reforma litúrgica, propriamente dita, se afastou sempre do que queria o concílio Vaticano II. Temos uma liturgia transformada em show tentando tornar a religião interessante com a ajuda de modismo e máximas moralizadoras….”

Fonte: AFP

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