No dia 1º de fevereiro foi o aniversário de três longos anos do golpe militar em Mianmar. As cidades que antes eram lotadas, cheias de pessoas e atividades, agora estão desertas. Só restaram pedintes, viciados em drogas e mulheres com os filhos em barracas improvisadas de comércio. Ao entardecer, as pessoas correm para conseguir chegar as suas casas antes do toque de recolher.
A escassez de comida dobrou o preço de produtos básicos. Muitos ficam em filas durante um dia inteiro para conseguir apenas 100 ml de óleo para cozinhar. A população vive sob estado constante de medo. A todo instante é possível ouvir tiros ou bombas à distância. Dormir nesse cenário não é fácil, especialmente para os que tremem de frio, ao dormir a céu aberto, expulsos de suas casas pela violência.
Daisy Htun*, uma parceira local da Portas Abertas conta que “a situação do país não está melhorando, porque a guerra continua nas regiões onde os cristãos vivem, como nos estados de Chin, Kayah e Kachin. Os cristãos se tornaram deslocados internos e se espalharam por todo o país, o que torna muito difícil contatá-los. Mas nossos parceiros locais corajosos continuam a procurar cada um deles para ajudá-los”.
Quando a junta militar tomou Mianmar em 1° de fevereiro de 2021, o mundo todo ficou estarrecido. Por anos, o país viveu em democracia. A situação da igreja, apesar de precária, tinha mais liberdade. Mas, nos últimos três anos, a junta militar enrijeceu o comando e legitimou a si mesma como governante do país e, nesse contexto, os cristãos têm sido alvos de violência e ataques indiscriminados.
Tiros e bombas nas ruas
De acordo com a Organização dos Direitos Humanos de Chin (CHRO, da sigla em inglês), desde 2021, aproximadamente 100 igrejas foram atacadas pelo exército birmanês, também conhecido como Tatmadaw. Por isso, é muito difícil para os cristãos permanecerem e desenvolverem a igreja em Mianmar.
Min Tun*, um parceiro da Portas Abertas que organiza treinamentos para ajudar os cristãos a resistirem biblicamente à perseguição conta que é muito difícil viajar para as áreas de conflito onde ele oferece treinamentos para os cristãos deslocados internos. “Quando fizemos o treinamento, encontramos muitas balas e bombas nas estradas. Parecia que os tiros estavam voando sobre nossas cabeças, muito perto de nós. Assim, também é difícil para os cristãos. Quando eles nos viram, choraram, porque significava muito ter alguém com eles ali naquele momento.”
Min Naing*, uma parceira local, disse que “temos apoiado os amigos de nossos pastores com orações e encorajamento. Ajudamos a levar comida e ajuda emergencial para os cristãos deslocados internos. Muitos deslocados internos ficam emocionalmente perturbados quando veem suas casas destruídas, as igrejas reduzidas a cinzas e ao experimentar diariamente situações de quase morte”.
“Alguns cristãos questionam a própria fé e perguntam a Deus porque ele trouxe tamanho sofrimento sobre eles. Pastores que têm cuidado desses cristãos estão traumatizados e impactados a ponto de quase desistir”, ela conta.
Ajuda para reencontrar forças
Min Naing e Min Tun carregam em seus corações o peso da necessidade de fortalecer os pastores e os cristãos locais, por isso, começaram a organizar treinamentos de aconselhamento pós-trauma com os líderes cristãos deslocados internos. Muitos pastores e líderes de igrejas participaram.
Pastor Aung*, um dos participantes do treinamento, disse: “Saya Min Tun (professor Min Tun), obrigado por vir aqui e nos ouvir. Nós, pastores, temos muita dificuldade de nos reunirmos dessa forma, muitas vezes até para buscar a Deus [momentos devocionais], é difícil ter tempo suficiente. O encontro nos ajudou e as lições são de grande ajuda para os nossos membros que estão traumatizados também. Nós quase desistimos, obrigados por nos ajudar a reencontrar forças”.
Min Naing ajuda pastores locais e líderes traumatizados nos treinamentos organizados, para que esses cristãos possam levar os conhecimentos para suas igrejas e cuidar deles. Há até mesmo crianças traumatizadas que precisam de cura para suas feridas nas igrejas.
Por meio dos nossos parceiros locais, a Portas Abertas fortalece a Igreja Perseguida em Mianmar. Nós entregamos literatura cristã, oferecemos discipulado, treinamentos de liderança, ajuda emergencial, aconselhamento para casais, instrução cristã de jovens e crianças, além do ministério de presença, ou seja, as visitas aos vilarejos para orar e acolher os cristãos perseguidos.
Uma das cristãs que participou do treinamento precisou levar o filho, pois ela cuida sozinha da criança. Muitas mulheres cristãs deslocadas internas vivem a realidade de cuidarem sozinhas de suas famílias. Os discipulados têm ajudado cada uma delas a aprender sobre a Bíblia, a encontrar a esperança em Cristo, incluindo a possibilidade de que um dia elas possam voltar para suas casas e para uma rotina mais leve.
*Nomes alterados por segurança.
Fonte: Portas Abertas