Num trecho de 4 km da Baixada Fluminense entre Jardim Gramacho (Duque de Caxias) e Parque São José (Belfort Roxo) há 30 igrejas. Só uma é católica. A Baixada Fluminense é o exemplo mais contundente do avanço evangélico na periferia das metrópoles.

Excetuada a capital, os evangélicos pentecostais e os não-pentecostais (adeptos das igrejas surgidas da Reforma no século 16) somam 37% dos moradores da região metropolitana, enquanto os católicos representam 41%. Os dois grupos estão no limite do empate técnico, pois a margem de erro é de dois pontos.

Entre 1999 e 2006, o Rio teve três governadores declaradamente evangélicos: Anthony Garotinho (PMDB), Benedita da Silva (PT) e a mulher de Garotinho, Rosinha (PMDB).

As 30 igrejas da estrada que liga Jardim Gramacho a Parque São José englobam evangélicas históricas, grandes pentecostais (Universal e Assembléia de Deus) e denominações que às vezes se resumem a uma sede.

Para vários estudiosos, esse quadro configura um “mercado de bens simbólicos”. Ronaldo de Almeida, do Cebrap (Centro Brasileiro de Análise e Planejamento), não gosta do termo “mercado”, mas admite que há uma concorrência das igrejas: “Quando preciso de uma fala libertadora, vou na Universal; de uma reflexão forte, na Batista; de louvor, na Renascer em Cristo. O que ocorre é uma espécie de calibragem de acordo com as opções que têm”.

Quando se pergunta a um evangélico por que escolheu uma igreja pentecostal em detrimento de outra, é comum ouvir a palavra “costumes” na resposta. A flexibilidade em relação a roupas e hábitos é um dos fatores de atração de fiéis.

“Gosto de usar brinco, pintar cabelo, usar calça jeans. A igreja [Universal] me aceita como eu sou”, diz Andresa Carla de Araújo, 19, que estuda história.

A ala tradicional da Assembléia de Deus mantém o rigor: mulheres com saias abaixo do joelho, homens de manga comprida e, de preferência, paletó.

“Agora, imagine se um homem de terno vê um joelho de uma mulher. Vai ficar excitado. O que é proibido é gostoso. Eu falo de sexo abertamente nos cultos”, contrasta o pastor Edinaldo, da dissidência Assembléia de Deus da Família.

Assim como todos os pastores pentecostais, ele defende o uso de métodos contraceptivos: “Esse povo tem espermatozóide todo dia. Se não usar camisinha, vai jogar em um útero. Se você for radical dentro dos seus dogmas, comete um crime contra a sociedade”.

Alguns padres de Nova Iguaçu relatam as angústias de pessoas que usam contraceptivos e admitem que certos dogmas afastam a população da igreja.

Coerente com sua “teologia da prosperidade”, a Universal promove programas de laqueadura de trompas e estimula o uso de preservativos. “Os pastores [da Universal] não ficam embromando, como os padres. Hoje uma menina tem relação sexual aos 12 anos. Ela poderá não ter uma vida prazerosa depois, mas, quando aceitar Jesus, pelo menos não vai ter uma Aids para carregar”, afirma a estudante Maria Rocha dos Santos, 19, ex-católica.

O costume do dízimo não encontra muita resistência entre os fiéis. Para eles, Deus é quem está recebendo. “Às vezes vejo um pouco de exagero. Mas, se queremos servir a um Deus grande, por que não fazer um templo grande?”, diz Andresa.

Mas há quem veja exagero em associar funk e pagode a Cristo. “Temos que levar o Evangelho para fazer a diferença, não trazer o funk e o pagode para dentro da igreja”, diz Reginaldo Lira, da Nova Vida.

Fonte: Folha de São Paulo

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